Cotidiano

Propina alimentava vida de luxo de grupo de Cabral

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RIO ? A rotina de luxo da família do ex-governador Sérgio Cabral e de seus aliados no esquema de corrupção era bancada, em parte, com o dinheiro em espécie de propinas pagas por empreiteiras que queriam manter contratos com o governo do Rio. Foi com esse ?oxigênio? ? termo usado por envolvidos na suposta organização criminosa para designar propina ? que foram bancados itens que vão de helicópteros, lanchas e obras de arte a vestidos de festa.

Até encomenda de cachorro quente, no valor de R$ 1.070, para a festa do filho mais novo do ex-governador, teria sido paga com recursos oriundos de propina, de acordo com o Ministério Público Federal (MPF). Pagamentos em dinheiro vivo e depósitos bancaram ainda uma série de gastos da ex-primeira-dama Adriana Ancelmo, que foi levada coercitivamente para depor ontem. Seis vestidos feitos sob encomenda em janeiro de 2014 custaram R$ 57 mil. O maior gasto, de R$ 632 mil, fica por conta de três automóveis adquiridos em 2010 e 2016. As despesas incluem ainda a aquisição de equipamentos gastronômicos, móveis, mini buggys, eletrodomésticos e blindagem de automóvel. Os bens adquiridos por meio de notas fiscais vinculadas aos CPFs de Cabral, Adriana e Carlos Miranda, apontado como operador do ex-governador, somam aproximadamente R$ 3,3 milhões .

Foi Adriana Ancelmo quem recebeu um anel de R$ 800 mil pago, a pedido de Cabral, pelo empreiteiro Fernando Cavendish durante uma viagem a Mônaco, em julho de 2009. Nessa época, a Delta de Cavendish faturava alto com contratos junto ao governo do Rio. A joia foi devolvida após a construtora ser arrastada para o centro da CPI do Cachoeira, em 2012.

No apartamento de Cabral, a Polícia Federal apreendeu na quinta-feira três colares, sete anéis, 22 pares de brincos, uma pulseira, sete relógios e um pingente. Havia peças de ouro com esmeralda, rubi, brilhante e de joalherias caras, como H Stern. O juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal do Rio, intimou três joalherias a fornecer, em 24 horas, notas fiscais e certificados emitidos por todas as pessoas físicas e jurídicas sujeitas aos pedidos de bloqueio de bens. O MPF pontua que a aquisição de joias com dinheiro sujo é feita pela facilidade de transporte e ocultação.

O ex-governador e Adriana Ancelmo nutriam o gosto por viagens internacionais. Nelas, ficavam hospedados em hotéis de luxo, como em Mônaco. No Hotel de Paris, Cabral e a então primeira-dama, juntamente com Cavendish e a mulher, jantaram no estrelado restaurante Le Louis XV. Como a decisão da Justiça fez Cabral trocar as viagens internacionais por Bangu 8, a saborosa comida do chef premiado Alain Ducasse vai dar lugar ao arroz, ao feijão e à farinha servidos na quentinha aos detentos da unidade. Os vinhos da famosa adega do hotel ? considerada uma das melhores do mundo, com quase 600 mil garrafas ? serão substituídos pelo guaraná servido no lanche.

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A força-tarefa da Lava-Jato no Rio aponta que obras de arte também eram compradas com o dinheiro em espécie do esquema. Documento do MPF reproduz uma troca de e-mail de Cabral, cujo título é ?Tarsila?. Nele, o ex-governador é avisado de que sua obra de arte ficou pronta. Ele recebeu um desconto de 50% e o valor da compra ficou em R$ 14 mil.

LANCHA E HELICÓPTERO EM NOME DE OUTROS

As investigações apontam ainda que Cabral teria uma lancha de R$ 5 milhões e um helicóptero registrados em nome da MPG Participações, empresa de seu ex-assessor e amigo, Paulo Fernando Magalhães Pinto Gonçalves, preso temporariamente (cinco dias) na Operação Calicute ontem. A aeronave foi vendida em setembro passado para uma empresa situada em Delaware, EUA. O empresário, por meio dos advogados, diz refutar a acusação de que seria laranja do ex-governador e afirma que é ?descabida? a suposição de que a lancha, assim como o helicóptero já vendido pela família, pertenceria ao peemedebista.

De acordo com as investigações, quem também tem helicóptero e lancha em nome de outra pessoa é o ex-secretário de Obras Hudson Braga, outro que foi preso ontem.

Hudson fez uma reclamação em um e-mail de setembro de 2012, cujo assunto é ?caixinha?, porque não teria recebido o dinheiro da propina. O texto era endereçado a seu chefe de gabinete, José Orlando Rabelo, também preso na operação.

?Os prazos dos srs esgotou (sic) hoje e nenhum de vocês dois me trouxe nada!!!! Eh lamentável eu ter que ficar cobrando!!! Gostaria de inverter essa lógica!!!?, escreveu Hudson no e-mail.

No texto, Hudson dá a entender que teria feito cobranças anteriores. ?Foi a minha última cobrança?, escreveu. A quebra de sigilo telemático apontou que o ex-secretário e José Orlando trocaram 238 e-mails. Hudson foi coordenador da campanha de Luiz Fernando Pezão ao governo do Rio em 2014.

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