Agronegócio

Proibição causa corrida por compra e estocagem

Cascavel – O alerta a seguir vem de um agrônomo que trabalha em uma unidade que faz a revenda do glifosato, em uma estrutura credenciada à Adapar (Agência de Defesa Agropecuária do Paraná): às vésperas do plantio da safra de soja e com a polêmica suspensão do registro do glifosato no início do mês passado por uma juíza federal de Brasília, muitos produtores saíram em disparada para comprar o agrotóxico e mantê-lo estocado. “Nas nossas unidades observamos um crescimento pela procura de cerca de 30% se comparado a outros períodos que antecedem o cultivo”, revela o agrônomo.

Esse movimento vem sendo acompanhado de perto pela Adapar. Segundo o gerente de sanidade vegetal da agência, Marcilio Martins Araújo, nas últimas semanas, quando o assunto começou a ganhar o debate nacional, a Adapar registrou pelo Siagro (Sistema de Monitoramento do Comércio e Uso de Agrotóxicos no Estado do Paraná) um movimento maior que o comum de receituários para indicação do produto. “Certamente são produtores que querem comprar para se precaverem caso ele seja cassado. Ocorre que, se o produto for proibido, o produtor não pode nem aplicar nem tê-lo estocado”, considerou.

Para o gerente, a condição de insegurança provocou essa corrida dos agricultores atrás do herbicida, popularmente chamado de Roundup. “Estamos fazendo a fiscalização de rotina no campo e intensificada nos comerciantes habilitados. A maior procura para esse produto é sinal de que o assunto causa incômodo aos produtores às vésperas da safra. Já gerou movimento assim em outros momentos, quando outros produtores estavam ou corriam o risco de serem suspensos. Neste caso específico, a Adapar só vai tomar atitudes se o Mapa [Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento] determinar. Por enquanto, o comércio segue regular, as vendas vêm sendo realizadas normalmente”, reforçou.

Cresce a polêmica sobre o assunto porque na próxima semana ou no mais tardar na outra, os produtores começam a plantar a soja da safra de verão 2018/2019, mas na roça já é possível observar quem faz a primeira aplicação, a que ocorre antes mesmo do cultivo.

No oeste do Paraná, a expectativa é de que sejam mais de 1,1 milhão de hectares destinados à soja, com expectativa inicial de colheita na casa de 4 milhões de toneladas, com base na estimativa ainda não oficializada pelos Núcleos Regionais da Seab (Secretaria de Estado de Agricultura Abastecimento) de Toledo e de Cascavel com cobertura em 48 municípios.

Prejuízo bilionário e inviabilização das lavouras

No dia 10 de setembro se encerra o vazio sanitário da soja e fica liberado o cultivo com a planta já emergida. Antes disso, parte dos produtores que se dedicam às modalidades superprecoces deve iniciar a semeadura já na próxima semana, tendo em vista que esse processo de plantio o vazio sanitário não limita.

Na avaliação de especialistas, a possibilidade de não poder usar glifosato comprometeria lavouras inteiras e até toda a safra. Essa tendência deverá ser expandida para o milho, já que o agrotóxico também é usado para esse cultivo.

Para suspender o registro, a magistrada da Justiça Federal usou como argumento que o produto é cancerígeno. No setor agropecuário, a informação é rebatida e a defesa, feita inclusive pelo ministro da Agricultura, Baliro Maggi, é para que sejam feitas análises detalhadas e, se essa tendência for comprovada, de que ele seja retirado do mercado gradativamente e não de uma só vez.

O problema é que o glifosato foi difundido com a substituição quase que total da soja convencional para a transgênica e hoje não tem um substituto no mercado e uma fórmula alternativa ainda precisaria ser desenvolvida e aprovada, processo que pode levar décadas.

Na avaliação do especialista em mercado e engenheiro agrônomo Wlamir Brandalize, regiões como o Centro-Oeste brasileiro e o Paraná – os principais produtores de grãos – serão os mais atingidos. O oeste do Paraná terá sua economia completamente afetada, tendo em vista que a soja é a principal cultura no campo. Sozinho, o oeste colhe 20% da produção estadual e cerca de 3% do cultivo brasileiro, que pode chegar a 120 milhões de toneladas em 2018/2019 em 36,4 milhões de hectares. “Isso é inviável [cassar o registro do glifosato]. Quem está em Brasília precisa avaliar se quer que o povo passe fome ou se as pessoas se alimentem. O glifosato é o produto mais usado no mundo, não existe lógica em fazer isso. Essa é uma polêmica que nem deveria ter existido. Temos no Brasil a legislação mais dura no mundo para se colocar um produto no mercado e vou além, se olhar no país inteiro a contaminação com produto químico, raramente se verá uma com o glifosato. Ele é produto mais usado no mundo e o Brasil precisa dele, não podemos abrir mão disso”, reforçou. “Sem contar que não temos um substituto para esse produto hoje”.

Se o uso de herbicida for proibido, lavouras de soja e milho ficarão totalmente comprometidas, avaliam especialistas

Nas lavouras

No oeste do Paraná, a proibição do glifosato afetaria mais fortemente cerca de 93% das lavouras de soja transgênicas, considerando que cerca de 7% ainda desenvolvem o cultivo convencional da oleaginosa.

Na prática, se confirmada a estimativa de produção de 4 milhões de toneladas, representa que mais de 3,7 milhões delas estariam em risco. Na prática, significa um impacto na economia regional de quase R$ 6 bilhões, em uma safra. “O que teria aumento expressivo seria a venda de lima, de enxadas e de arados. Pois voltaríamos para a agricultura de muitas décadas atrás e não produziríamos mais em escala comercial”, reforçou o agrônomo Wlamir Brandalize.

Justificativas para a cassação

Conhecido comercialmente como Roundup, o glifosato é um herbicida usado contra ervas daninhas indesejadas em produções agrícolas. No último dia 7 de agosto, a juíza Luciana Raquel Tolentino de Moura, da 7ª Vara da Justiça Federal em Brasília, determinou a suspensão de registro de todos os produtos que utilizam tiram, abamectina e glifosato.

Em liminar, a magistrada disse que as substâncias não devem ser usadas ou comercializadas até que ocorra uma reavaliação toxicológica das substâncias pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). A juíza ressalta que o glifosato é apontado como possível cancerígeno pela OMS (Organização Mundial da Saúde) e pela Associação Brasileira de Saúde Coletiva.

Na semana passada a AGU (Advocacia-Geral da União) ingressou com recurso contra a liminar que suspendeu o uso do glifosato. O ministro da Agricultura, Blairo Maggi, disse que espera uma decisão favorável ao recurso.

O ministro destacou ainda que o produto tem se mostrado confiável: “Difícil aparecer um produto tão seguro quanto o glifosato. Ele é biodegradável, está há muitos anos no mercado. É bastante barato”.