Cotidiano

PF comprou cinco Vants, mas ninguém sabe onde eles estão

Projeto que parou por falta de recursos, já havia consumido R$ 150 milhões até o ano passado

São Miguel do Iguaçu – Em meio ao caos da segurança pública vivida pelo Rio de Janeiro, e muito dela fomentada pela vulnerabilidade das fronteiras, como o caso do Brasil com o Paraguai por onde entram armas, munições, drogas e contrabando que alimentam as facções criminosas, uma nova denúncia reforça o descaso com a segurança nacional.

Conforme já tratado pelo Jornal O Paraná, os dois Vants (Veículos Aéreos Não Tripulados) adquiridos em 2009 pelo Governo Dilma Rousseff para monitoramento das fronteiras e trabalho de inteligência, e que há dois anos não voam, são, na verdade, cinco aeronaves, ao custo de R$ 8 milhões cada uma, ou seja, R$ 40 milhões no total.

De acordo com entidades ligadas à segurança nacional, o projeto original previa a aquisição de 14 Vants, cinco teriam sido entregues, mas o mais intrigante é que não há informação de onde estão três Vants, dos quais não há sequer registro voos. Já os outros dois estariam num hangar em São Miguel do Iguaçu. Mas ninguém tem acesso a eles, “por uma questão de segurança”.

Importância

A informação de agentes que atuaram na implantação do projeto reforçam que o veículo aéreo sempre foi um mecanismo imprescindível para controle dos crimes transfronteiriços, principalmente ao se analisar o contexto das regiões oeste e sudoeste do Paraná, e que todas as vezes em que a aeronave levantou voo trouxe informações importantes e que deram resultado efetivo para a fiscalização em terra.

Alvo de denúncias frequentes na Procuradoria-Geral da União e no Tribunal de Contas da União, as aeronaves estão desmontadas no hangar do aeroporto de São Miguel do Iguaçu desde agosto de 2016. Em uma denúncia feita ano passado pelo Sindicato dos Policiais Federais no Distrito Federal à PGR (Procuradoria-Geral da República) e ao Tribunal de Contas da União vieram informações ainda mais preocupantes. O projeto audacioso previa investimentos de R$ 855 milhões, mas acabou justamente por falta de recursos.

A esperança de quem atua na segurança pública na fronteira é de que o Vant volte a operar. Para a Polícia Federal, não restam dúvidas de que é um mecanismo essencial e com “voos certeiros” no mapeamento de quadrilhas, tanto de contrabando, quanto de descaminho e os danosos tráficos de drogas, armas e munições. “O Vant aprimora a ação dos policiais em terra. Em vez de você parar 100 veículos e pegar um ou dois com produtos ilícitos, ele indica o veículo certo que se deve parar, o que está levando drogas, armas, munições, cigarro, e por onde esse veículo está transitando, Por quais estradas. O Vant nunca levantou voo sem trazer resultados efetivos. Não é um gasto, é um investimento em segurança”, reforça um dos policiais federais que trabalharam na operacionalização.

Gastos abusivos

A denúncia feita pelo sindicado – e reforçada pela Fenapf (Federação Nacional dos Policiais Federais) ano passado – indicava que o governo já havia desembolsado com a implantação do projeto pelo menos R$ 150 milhões. O documento reforça ainda que em cinco anos, de 2011 a 2016, último ano de operações, as aeronaves haviam voado cerca de mil horas, quando o indicado seriam menos 40 mil horas. Em 2016 elas teriam saído da terra por apenas 35 horas, ano em que foram gastos R$ 35 milhões em manutenção, média de R$ 1 milhão por hora voada.

Apesar de o governo não se manifestar oficialmente, o Jornal O Paraná apurou que a justificativa para o baixo número de horas/voo e a desativação do projeto era, dentre outros quesitos, a falta de recursos até para abastecer as aeronaves de tecnologia israelense. Havia falta de dinheiro, inclusive, para a manutenção dos aviões que tinham autonomia de voo de até 37 horas ininterruptas a uma distância de até 2 mil quilômetros.

De quatro bases, apenas uma saiu do papel

O projeto original de 2009 teve como investimento, na compra dos aviões, US$ 27,9 milhões, cerca de R$ 85 milhões em valores da época.

A ideia original previa a criação de quatro bases de operação: a de são Miguel do Iguaçu (no oeste do Paraná, a única que chegou a sai do papel, mas não por muito tempo), uma em Vilhena (RO), outra em Tefé (AM) e uma no Distrito Federal.

As duas bases móveis previstas para auxiliar na realização de grandes eventos também nunca existiram.

Além disso, os policiais capacitados para a operacionalização das aeronaves estão em outras funções, alguns deles em outras bases, atuando com outras formas de repressão ao crime organizado. Em São Miguel do Iguaçu estão agentes fora de operação, longe das ruas e do ar, recebendo salários apenas para cuidar da aeronave desmontada. A Polícia Federal não informou onde estariam as outras aeronaves.

Ainda ano passado, o Departamento da Polícia Federal teria se manifestado alegando que a intenção era utilizar os Vants não apenas como ferramenta de inteligência, mas como mecanismo operacional e de investigação que possibilitasse a atuação em o todo território nacional. Procurada novamente, a reportagem não obteve respostas.