Cotidiano

Pecuarista de SP comandava desmatamento na Amazônia, diz PF

SÃO PAULO. Um pecuarista de São Paulo é o principal alvo de uma operação realizada nesta quinta-feira pela Polícia Federal, acusado de comandar a maior organização criminosa responsável por desmatamento e grilagem de terra na Amazônia brasileira entre 2012 e 2015. Antonio José Junqueira Vilela Filho é considerado foragido e é apontado como o chefe da organização criminosa que falsificava até mesmo o Cadastro Ambiental Rural para conseguir a legalizar terras invadidas. Segundo o delegado Yuri Rodrigo, que comandou a operação, o grupo movimentou R$ 1 bilhão entre 2012 e 2015 e o pecuarista criou sete empresas de fachada para lavar o dinheiro ilícito, além, de usar a família.

Batizada de Rios Voadores, a operação inclui 24 mandados de prisão preventiva, nove prisões coercitivas e 18 mandados de busca e apreensão em São Paulo, Santa Catarina, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, e nos municípios de Castelo dos Sonhos e Altamira, no Pará.

– Ele tem um avião e sobrevoava a floresta na Amazônia para identificar as áreas onde iria desmatar. Depois que escolhia chamava o Marabá, que arregimentava trabalhadores da região. Eles derrubavam a floresta com motoserra, para tirar a madeira nobre, e em seguida passavam o corrental, um a corrente com mais de três polegadas que arranca as árvores pela raiz. Depois colocavam fogo e queimavam tudo, para limpar a terra – conta o delegado.

Com a terra limpa, ele mandava semear capim para colocar gado ou, se o terreno era plano, partia direto para o plantio de soja e arroz. Cada uma das áreas era transformada numa fazenda, que começava a produzir e passava a ser tratada como posse, para futura regularização por meio de documentos falsos.

O pecuarista montou vários núcleos, cada um deles responsável por uma etapa do crime. O núcleo financeiro providenciava o dinheiro para financiar o desmatamento e intermediava o arrendamento de terras e chegava a financiar para terceiros a compra de terras griladas. O de laranjas assinava contratos, assumia a autoria do desmatamento ilegal flagrado e emprestava o nome para que fosse feito Cadastro Ambiental Rural.

Um terceiro era formado por “gatos”, responsáveis por contratar as pessoas que entravam na floresta para desmatar e havia pelo menos dois “gerentes de fazenda”, para cuidar das áreas invadidas.

Cinco fazendeiros que arrendaram terras ilegais da organização criminosa estão sendo investigados. Segundo a PF, eles sabiam que as terras eram ilegais.

De acordo com o delegado, um cunhado do pecuarista cedia o nome para negócios ilegais e duas irmãs dele participam da lavagem de dinheiro

O esquema foi descoberto quando índios da região procuraram o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama) para denunciar exploração madeireira dentro da área indígena. Ao prender 40 pessoas que desmatavam a região, elas apontaram Eremilton Lima da Silva, o Marabá, como o homem responsável pela contratação delas. Marabá foi citado pelos trabalhadores como funcionário de “AJ” ou “Jotinha”, como o fazendeiro era conhecido dentro da organização criminosa. A investigação durou dois anos. Com ordem judicial, foram feitas escutas telefônicas que registram as negociações do pecuarista e o funcionamento do esquema.

Para o delegado, o desmatamento era planejado e áreas eram desmatadas até mesmo sob encomenda de fazendeiros que queriam ter terras na região.

– Os fazendeiros ligavam e pediam uma área. Tinha clientes certos – diz Rodrigo.

Numa das gravações, o pecuarista fala com um dos integrantes da organização criminosa, identificado pela Polícia Federal como Clésio Carvalho, um dos laranjas.

AJ: Como tá as coisas?

Clésio: Rapaz, eu tive um problema lá, que “cê” nem imagina!

AJ: O que Clésio?

Clésio: O Ibama foi lá (inintelegível)

AJ: Agora?

Clésio: Não, faz uns 90 dias, prendeu meu gado, eu tive que provar que não era laranja seu… rapaz, 60 dias, tive que roubar meu gado, que ele falou que ia

mandar pro fome zero

AJ: Então eu tomei uma multa por causa disso de um milhão e cem. O que eu preciso? Eu preciso ….Você recebeu uma notificação deles (Ibama) para tirar o gado?

Clésio: Mas tirei ô, minha parte já fiz todinha.

AJ: Então… eu preciso, cê puder me mandar a notificação

Clésio: Como assim?

AJ: Eles te entregaram uma notificação pra cê tirar o gado?

Clésio: Entregaram…

AJ: Então, essa notificação que eu preciso dela, porque eles mandaram para mim uma multa de um milhão e cem! Por estar descumprindo o embargo. E outro, a área não é minha lá, tem CAR (Cadastro Ambiental Rural), tem CAR, tem laudo que é de vocês entendeu?

A operação da Polícia Federal foi feita em conjunto com o Ministério Público Federal, o Ibama e a Receita Federal. A PF explica que rios voadores são ?cursos de água atmosféricos?, formados por massas de ar carregadas de vapor. São essas massas de ar que chegam ao Sudeste e Sul do Brasil, provocando chuvas. O desmatamento afeta a formação dos ?rios voadores? e provocam seca no Sudeste.