Cotidiano

Para mudar a Previdência

Tão logo instalado, o governo Temer alterou a estrutura do Executivo. Ministérios foram extintos; outros se fundiram ou tiveram atribuições alteradas. A seguridade social foi fortemente afetada por essas modificações.

O Ministério do Trabalho e Previdência Social do governo Dilma se tornou apenas o Ministério do Trabalho no governo Temer, e suas atribuições foram reduzidas às políticas públicas para o trabalho e o emprego. Já as políticas de Previdência Social, inclusive Previdência Complementar, foram incorporadas pelo atual Ministério da Fazenda. Esse tipo de fusão entre ministério econômico e ministério social não possui similar no mundo.

Não obstante, a Previdência Social deva respeitar o equilíbrio financeiro e atuarial (princípio previsto no artigo 201 da Constituição Federal), a sustentabilidade econômica não pode perder de vista a finalidade social do sistema previdenciário, que é assegurar proteção ao cidadão brasileiro nas hipóteses previstas na legislação de regência.

As principais mudanças, contudo, ainda não aconteceram, foram apenas anunciadas. Uma que certamente vai gerar polêmica é a imposição da idade mínima de 65 anos para a aposentadoria, de homens e mulheres, tanto para a iniciativa privada quanto para o setor público. Embora do ponto de vista atuarial a fixação de idade mínima seja plenamente defensável, a medida mostra-se apartada da realidade brasileira. A maioria dos brasileiros começa a trabalhar muito cedo, geralmente em situação informal ou de precariedade, e chega aos 50 com a empregabilidade profundamente afetada.

Não fosse isso o bastante, a elevação da idade mínima para mulheres busca solucionar um problema atuarial. A expectativa de vida delas é superior à dos homens, e elas se aposentam mais cedo do que eles. O benefício que recebem perdura, portanto, por mais tempo, e isso afeta o caixa previdenciário.

Essa mudança de cunho econômico não leva em conta a tradição brasileira de permitir que as mulheres trabalhadoras se aposentem cinco anos antes dos homens, devido à chamada dupla jornada que têm ao acumularem, histórica e tradicionalmente, a atividade profissional com a doméstica. Essa medida pode implicar um desgaste significativo para um governo que começa sua gestão criticado por não ter mulheres no seu primeiro escalão.

Outro ponto que merece destaque é referente à desvinculação dos benefícios previdenciários do valor do salário mínimo, com a elevação do patamar da Desvinculação de Receitas da União dos atuais 20% para 25% ou 30%.

A desvinculação pode, por um lado, representar clara desoneração das contas públicas e mecanismo anti-inflacionário. Poderá, por outro, levar à miséria aposentados e pensionistas que dependem dos benefícios e que poderão vê-los corroídos pela inflação.

Não é simples implementar uma reforma no sistema de seguridade social. Para que ela seja feita com responsabilidade, deverá adequar as propostas à realidade social brasileira e ser precedida de amplo diálogo social.

Jorge Boucinhas Cavalcanti Filho é professor de Direito Trabalhista e pesquisador da FGV e Marco Aurélio Serau Junior é diretor científico adjunto do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário