Cotidiano

Para investidor, não adianta fugir de fundos afetados por debêntures da Oi

RIO – Assumir e travar as perdas, sacando o dinheiro, ou torcer — e esperar — pela recuperação, deixando a aplicação como está? A questão cruza a cabeça dos 420 mil aplicadores em fundos de investimento que sofrem perdas com o pedido de recuperação judicial da Oi, feito em 20 de junho. Para consultores ouvidos pelo GLOBO, não é preciso e nem adianta correr do investimento agora, mas o susto deve servir para buscar compreensão maior do mundo dos investimentos.

— Não há o que fazer, além de chorar o leite derramado — diz o professor de finanças Silvio Paixão, da Fipecafi. — Quando você tem dinheiro em um fundo de investimento, deve prestar a atenção no objetivo dele, quer dizer, no que ele investe e ao que se propõe, se está mais ou menos exposto a setores arriscados.

Daqui para a frente, afirma Paixão, verifique nos investimentos que já tem se a aplicação está focada em setores e cenários nos quais você aposta. Só vale a pena sair se você discorda dos pressupostos informados.

O consultor financeiro André Massaro também não vê com entusiamo uma saída dos fundos afetados pela desvalorização dos papéis da Oi.

— Dificilmente o investidor consegue sair em boas condições neste momento, seja resgatando o dinheiro ou pressionando o gestor para se livrar das debêntures, pois a pressão de venda só agrava a desvalorização — alerta. — Mas, se o fundo é bem diversificado, se tem títulos de várias empresas, um eventual calote provoca no máximo uma perda temporária ou prejuízo à rentabilidade, mas não quebra o produto.

SAQUE EM CASOS ESPECÍFICOS

Especialista em investimento do banco Ouroinvest, Mauro Calil também avalia que gestores prudentes não mantêm as carteiras dos fundos concentradas nos papéis de uma empresa privada.

— No máximo, 5% em uma, 3% em outra e por aí vai. A maior parte do dinheiro fica em títulos públicos. Houve um aumento na quantidade de títulos privados nos fundos quando os juros no Brasil ficaram baixos, pois os gestores buscaram rentabilidade maior. Ainda assim, na grande maioria das vezes, eles mantêm cerca de 70% do patrimônio em títulos públicos — afirma Calil. — Exceto quando estatuto do fundo prevê outra coisa.

Ele recomenda o saque apenas no caso de investidores que contam com o dinheiro para a aposentadoria ou se a aplicação representa a maior parte do patrimônio investido. E relembra que “o olho do dono engorda o boi”, ou seja, é bom aproveitar para reavaliar os investimentos.

Diretora do Instituto Brasileiro de Certificação de Profissionais Financeiro (IBCPF), Marcia Dessen lamenta que investidores sofram por desconhecimento.

— Os cotistas desses fundos de renda fixa aprenderam do jeito mais difícil o que é o risco de crédito: a possibilidade do emissor de um título deixar de resgatar ou pagar juros do título. Esse investidor viu o valor da cota cair, apurando rentabilidade ruim ou até negativa.

Acontece que muitos fundos — fundos de renda fixa, fundos multimercado (que investem em diversos tipos de ativos) e fundos de previdência — têm, em sua composição, debêntures (títulos de dívida privada) emitidos pela tele em dezembro de 2011 e em março de 2013. Debêntures são promessas de pagamento feitas por empresas e, no campo das aplicações, são classificadas como renda fixa. Pagam mais que os títulos públicos, emitidos pelo Tesouro Nacional, mas não têm garantia de pagamento no vencimento que estes últimos têm. Podem até ter alguma garantia física, mas essas são, em geral, de difícil execução. Tampouco contam com a cobertura do Fundo Garantidor de Crédito (FGC), que assegura o pagamento de dívidas de instituições financeiras. Outra característica das debêntures é a falta de liquidez, ou seja, elas não são fáceis de serem vendidas antes do vencimento, no chamado mercado secundário.

Tudo isso assegura remuneração melhor que nos títulos públicos, que compõem o grosso dos fundos de renda fixa, o que leva os gestores a colocar algumas doses na composição dos produtos. O lado negativo é que, quando a empresa emissora da debênture sofre um abalo, o valor do papel cai. Mesmo que, no final, ele venha a pagar o prometido, no presente, seu valor de venda, recua. Como os fundos de investimento são obrigados a publicar o saldo que teriam se todo os aplicadores decidissem sacar hoje (marcação a mercado), muitos “perderam” com a desvalorização das debêntures da Oi, que se seguiu ao pedido de recuperação. Por isso, instituições financeiras como Banco do Brasil (BB), Caixa Econômica Federal, entre outros, foram forçadas a provisionar todos os valores relativos aos investimentos feitos em papéis da Oi.

PROVISÃO ATRAPALHA RENTABILIDADE

O alerta começou semana passada, quando clientes do BB e da Caixa começaram a receber carta do banco alertando para uma “provisão para créditos de liquidação duvidosa”. Com o provisionamento, feito em 21 de junho, esses papéis foram marcados a zero. Com isso, os fundos dos bancos tiveram rentabilidade negativa no dia.

Somente duas gestoras têm posição em Debêntures da Oi, o BB DTVM, com R$ 400,7 milhões, e Caixa, com R$ 106,1 milhões, conforme a Economática. No caso do BB, foram 133 fundos afetados, e a rentabilidade negativa diária ficou em 0,02%, na média. Na Caixa, foram afetados em 11 fundos de renda fixa e multimercados. Na instituição, com 11 fundos expostos à Oi, a queda foi maior, de 0,3%, destacou uma fonte. Um fundo de renda fixa, por exemplo, tem rentabilidade diária média atual positiva de 0,03% a 0,04%.

De acordo com a Economática, 163 fundos na indústria têm posição em algum dos ativos da Oi, acumulando R$ 521,6 milhões. A debênture com vencimento em 28 de março de 2019 é o instrumento com maior alocação com R$ 276,7 milhões, seguido pela debênture com vencimento em 28 de dezembro de 2018 com 230,1 milhões.

ARMADILHA PRÓPRIA

A Oi vem perdendo participação de mercado nos segmentos de maior margem e retenção de clientes, lembra Adeodato Netto, chefe de mercado de capitais da Eleven Financial. Depois da aprovação da portabilidade do número da linha, a evasão e troca de consumidores aumentou muito e a empresa não teve nem tecnologia, nem eficiência para se manter entre os grandes, embora continue sendo a maior operadora de telefonia fixa no Brasil.

— A companhia criou sua própria armadilha — avalia Netto. — A relação dificílima entre os sócios, a concentração de sua dívida em moeda estrangeira e o descolamento da realidade, quando decidiu viver o futuro (pós fusão) sem cuidar do presente trouxeram-na ao estágio atual. Pior margem líquida do setor, viu seu resultado de 2013 fechar em 5,3%, 2014 em -15,6% e no acumulado dos últimos 12 meses, que deve ser basicamente o fechamento de 2015, incríveis 21% negativos.

RECUPERAÇÃO LONGA

O processo de recuperação judicial será longo e ainda depende de muitos “sim” para ter algum resultado. O primeiro deles tem que vir da justiça que precisa aceitar o pedido da Oi, acatando a incapacidade da empresa em pagar seus credores. O segundo “sim” precisa vir deles, os credores, que vão se encontrar em assembleia geral no final de julho. É muito provável que a direção da Oi mantenha a proposta de trocar títulos da dívida por ações da companhia, avalia Adeodato Netto.