Cotidiano

Oscar 2017 deve coroar ojeriza de Hollywood a Donald Trump

RIO ? É impossível ter 100% de certeza sobre quem será o grande vencedor do Oscar. Mas é bem fácil prever quem será o maior perdedor na cerimônia do 89º prêmio da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas dos EUA, marcada para esta noite, em Los Angeles. A tendência, até, é de uma derrota humilhante, com boa parte das estrelas de Hollywood unidas contra Donald Trump. E, pelo retrospecto, é possível que o presidente americano não ouça calado.

Os ataques a Trump no Oscar devem começar já na abertura da festa, este ano apresentada por Jimmy Kimmel. Responsável pelo programa ?Jimmy Kimmel Live?, o comediante não vem economizando nas piadas sobre o presidente ? e o presidente vem abrindo dúzias de brechas para piadas. Na semana passada, após uma entrevista coletiva desastrosa em que Trump criticou a imprensa pela enésima vez e até mandou um repórter calar a boca, Kimmel dissse: ?O tom da entrevista foi como se seu pai encontrasse um maço de cigarros embaixo do colchão?.

No fundo, a frase de Kimmel foi até leve perto do que outras celebridades têm dito sobre Trump. Em novembro, depois de confirmada sua vitória na eleição americana, foi lançada uma campanha virtual, chamada #Calexit, sugerindo que o estado da Califórnia, cuja maior cidade é Los Angeles, deveria se tornar independente dos EUA.

? A insatisfação no mundo do cinema é muito grande. Nós vemos o sofrimento dos imigrantes que estão sendo perseguidos. É um filme de terror diário ? diz o diretor de fotografia brasileiro Affonso Beato, de filmes como ?A rainha? (2006) e ?Tudo sobre minha mãe? (1999), que vive em Santa Monica, Califórnia.

DISCURSO NO GLOBO DE OURO

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Já durante a campanha, Trump foi atacado por dúzias de profissionais de cinema. Robert de Niro afirmou que gostaria de dar um soco no magnata topetudo. Susan Sarandon se referiu a ele como o ?tio bêbado do casamento?. Cher o comparou a Hitler. George Clooney o chamou de ?fascista xenófobo?. Jennifer Lawrence afirmou que sua vitória representaria ?o fim do mundo?.

Mas Trump venceu, e o mundo não acabou ? ainda. Os embates entre Hollywood e o presidente, contudo, só aumentaram, e a temporada de prêmios foi um palco retumbante para as críticas. O momento mais emblemático, até aqui, ocorreu no Globo de Ouro, em 8 de janeiro, quando Meryl Streep foi homenageada. Ela não citou o nome do presidente uma única vez, mas todas as suas palavras foram direcionadas a ele. ?Desrespeito gera desrespeito, violência incita violência. Quando os poderosos usam suas posições para intimidar os outros, todos saem perdendo?, disse Meryl, que concorre hoje ao Oscar de melhor atriz, por ?Florence: quem é essa mulher??.

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Depois, em 11 de janeiro, uma semana antes da posse de Trump, atores indicados ao Oscar 2017, como Natalie Portman, Emma Stone, Dev Patel, Andrew Garfield e Michelle Williams, gravaram um vídeo cantando ?I will survive? (?Eu sobreviverei?, em português). Em 29 de janeiro, na cerimônia de premiação do Sindicato dos Atores (Screen Actors Guild, o SAG), Trump foi mais uma vez o alvo preferido. O mais contundente foi o ator americano Mahershala Ali, vencedor do SAG como coadjuvante por ?Moonlight? e favorito, hoje, ao Oscar. Ele se declarou muçulmano e criticou a decisão de Trump (já revogada pela Justiça) de proibir a entrada nos EUA de viajantes oriundos de sete países de maioria islâmica.

? Ele deve ser a pessoa mais feliz do mundo com essa atenção toda que recebe. Então, para mim, o melhor seria ignorarem o Trump no Oscar ? afirma Mauricio Zacharias, roteirista brasileiro que mora em Nova York, autor de filmes como ?O amor é estranho? (2014) e indicado este ano ao Independent Spirit Awards, por ?Melhores amigos?. ? Mas é claro que vão falar sobre ele. As pessoas estão esperando por este momento de catarse, será o primeiro Oscar da era Trump.

DIRETOR IRANIANO NÃO VAI

Hoje, é bastante aguardada, por exemplo, a entrega da estatueta de filme estrangeiro. Um dos favoritos é o iraniano ?O apartamento?, cujo diretor, Asghar Farhadi (Oscar em 2012, por ?A separação?) já avisou que não vai a Los Angeles, como protesto à tentativa de Trump de impedir a entrada de muçulmanos. Farhadi e os outros quatro diretores da categoria anunciaram ontem que, não importa o vencedor, o prêmio será dedicado a ativistas, jornalistas, artistas e todos os que ?trabalham para promover a unidade e a compreensão e defendem a liberdade de expressão e a dignidade humana ? valores cuja proteção é mais importante agora do que nunca?.

Outra baixa, esta involuntária, é a do diretor de fotografia do curta documentário ?The white helmets?, o sírio Khaled Khateeb, impedido ontem de entrar nos EUA por funcionários do Departamento de Segurança, que disseram ter encontrado ?informações derrogatórias? contra ele.

O Oscar tem um histórico de protestos. Em 1973, Marlon Brando não recebeu seu prêmio de melhor ator por ?O poderoso chefão?; mandou no lugar uma ativista vestida de índia. Em 2003, o documentarista Michael Moore, Oscar por ?Tiros em Columbine?, descascou o então presidente George W. Bush.

Mas um presidente que gosta de briga como Trump, Hollywood nunca viu. Ele responde quando se sente acuado, sobretudo pelo Twitter. No dia seguinte ao Globo de Ouro, escreveu que Meryl Streep é uma das ?mais supervalorizadas atrizes de Hollywood?. E se há uma certeza no Oscar é que ninguém está à altura de Meryl Streep e de seu recorde de 20 indicações. Contra ela, Trump não tem chance alguma.

Veja a cerimônia:

TNT, 23h: com comentários de Domingas Person e Rubens Ewald Filho;

E!, 19h30m: transmissão do tapete vermelho, com Giuliana Rancic e Ryan Seacrest;

TV Globo, amanhã, 15h20m: melhores momentos, com Christiane Pelajo, Artur Xexéo e Miguel Falabella.