Cotidiano

ONG flagra em vídeo abate de vacas gestantes na França

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RIO ? As imagens são chocantes. Elas mostram o abate de vacas gestantes num matadouro em Limoges, na região central da França, a cerca de 400 quilômetros de Paris, com a placenta sendo retirada junto com outras vísceras. Sem ligação com as mães, os bebês bezerros morrem por asfixia. Depois, numa mesa, um funcionário abre as bolsas com uma faca, derramando o líquido amniótico e os fetos em diferentes estágios, alguns deles já quase formados.

Os vídeos foram gravados por um funcionário em maio deste ano, numa ação da ONG L214 em parceria com o diário ?Le Monde?. De acordo com o jornal, a prática é legal, mas controversa a ponto de alguns países europeus trabalharem para limitá-la ou proibi-la.

? O bezerro é jogado numa caixa cheia de lixo. Às vezes se move, como se estivesse vivo ? disse Mauricio Garcia Pereira, espanhol de 47 anos que trabalha no matadouro e flagrou as cenas ?horríveis e criminosas? com uma câmera Go Pro. ? Nós fazemos isso todos os dias, pelo menos 50 vezes por semana. Como podemos matá-las? São vacas grávidas, com bezerros prestes a nascer.

Esta é a primeira vez que uma testemunha denuncia abertamente os horrores que acontecem nos abatedouros franceses. Pereira, que trabalha no estabelecimento há 7 anos, sabe que será demitido, mas se sentiu obrigado a denunciar a prática degradante.

abattoir-main-petit-foetus.jpeg? Eu sei que vou perder o meu emprego. Já espero isso mesmo ? disse o espanhol. ? Quero que o povo francês saiba o que acontece.

Não existe legislação proibindo a prática. Um regulamento da União Europeia de 2004 bane o transporte de ?fêmeas grávidas que passaram 90% do período de gestação?. O código sanitário da Organização Mundial de Saúde Animal prevê que ?fêmeas grávidas a partir de 10% do período de gestação não devem ser transportadas nem abatidas?. Contudo, trata-se de recomendações, não de regulamentos.

Sébastien Arsac, cofundador da ONG L214, afirma que estudos realizados na Alemanha, Itália, Bélgica e Luxemburgo estimam que o percentual de vacas prenhas abatidas varia entre 10% a 15%. Aplicando essas taxas à produção francesa, de 1,76 milhão de bovinos abatidos anualmente, o resultado é de 180 mil vacas grávidas mortas a cada ano.

Segundo Katharina Riehn, pesquisadora da Universidade de Hamburgo, existem questões econômicas por trás da prática.

? A vaca gestante pesa mais, por isso será vendida mais cara para o abatedouro, ao preço de carne ? disse a pesquisadora, especialista no assunto.

Os produtores se defendem, dizendo frequentemente que não sabiam da gestação, ou justificando o abate com a presença de inflamações nos animais ou problemas de fertilidade.

Mas alguns países europeus começam a se mobilizar contra a prática. Em setembro, o governo alemão apresentou uma proposta para a Comissão Europeia visando a proibição do abate de vacas durante o último trimestre da gestação. A Alemanha também compõe grupo com Dinamarca, Holanda e Suécia, que pediu parecer científico à Autoridade Europeia para a Segurança Alimentar sobre o assunto.

A principal questão ainda não possui resposta pacificada: o feto sofre quando a mãe é abatida? Até o momento, nenhum estudo científico conseguiu demonstrar claramente em qual estágio de desenvolvimento o feto se torna consciente.

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? No útero, o feto não sente dor, porque é mantido inconsciente por pelo menos oito mecanismos neuroinibidores ? disse David Mellor, da Universidade de Massey, na Nova Zelândia.

No entanto, se o bezerro estiver suficientemente desenvolvido e for retirado do útero, ele pode se tornar consciente e sofrer, rebate Donald Broom, da Universidade de Cambridge, no Reino Unido. Por isso, a Organização Mundial de Saúde Animal recomenda que o feto não seja retirado do útero por um período mínimo de cinco minutos após a incisão no pescoço da vaca durante o abate.