Cotidiano

Onésimo Gerardo Rodríguez Aguilar, antropólogo: 'Para alguns, assaltar é evoluir'

201607132007499941 (1).jpg “Moro em Heredia, na Costa Rica. Tenho 36 anos, sou
mestre em Antropologia pela Universidade da Costa Rica e doutor pela
Universidade Autônoma Metropolitana, em Iztapalapa (México). Estudei as
dinâmicas de poder entre torcedores do Deportivo Saprissa e a torcida organizada
Ultra Morada. Sou muito ruim jogando futebol.”

Conte algo que não sei.

A Ultra Morada, torcida organizada do Deportivo Saprissa, foi criada em 1995,
por dirigentes do clube, com apoio dos torcedores do time da Universidade
Católica do Chile, os Cruzados. Numa partida entre as duas equipes, o então
presidente do Saprissa, Enrique Artiñano, ficou fascinado com a forma como os
chilenos estimulavam os jogadores e convidou os líderes do grupo para formar um
similar na Costa Rica.

Futebol é…

Paixão. De um tempo para cá, interessei-me por abordá-lo
em termos analíticos. Comecei com mestrado, em 2003. É estimulante e é uma forma
de controlar a paixão e ser objetivo.

Soa tão antirromântico… Como se faz isso?

A forma de fazer isso é trabalhar com dados que
fundamentem a ideia que tenho ou quero desenvolver. Para mim, na faceta
passional, o Deportivo Saprissa seria o melhor clube. Mas, em termos analíticos,
é preciso ter dados que respaldem tal informação. Ou não escreveria uma tese,
mas um conto.

O que os dados dizem sobre a Ultra Morada?

Quando iniciei os estudos , era claro ver jovens
divididos entre o “bloco do Sul” e o “bloco do Norte”. Achava que era um
problema de classe, já que os grupos correspondiam à localização dos bairros em
que viviam. Os do Sul, mais pobres, criticavam os do Norte, chamando-os de
playos (homossexuais) e dizendo que não eram tão valentes. Os do Norte,
com melhor condição socioeconômica, muitas vezes classificavam os do Sul como
delinquentes. Vi isso em festas e em viagens aos estádios. Depois, percebi que a
classe social, no fundo, escondia uma disputa pelo poder. Os líderes antigos já
foram expulsos, o que me faz pensar que ainda há luta pelo poder que se reproduz
na torcida.

O meio faz o homem?

No caso dos bairros, há traços presentes nos jovens,
como a forma de se expressar ou gesticular. Há os que pensam que a violência não
é exatamente negativa. Dizem que é preciso evoluir, palavra que, no caso, é
usada como sinônimo de subsistir. Para alguns, inclusive, assaltar é evoluir.
Mas as pessoas têm poder de decisão e valores morais; capacidade de dizer sim,
não ou talvez.

A Ultra Morada é uma “barra brava”, designação de torcidas
caracterizadas pela violência.

No geral, a violência se associa unicamente à agressão
física. Sob essas circunstâncias, com certeza as torcidas são violentas. Mas há
vários tipos. Somos seres que produzimos violência diariamente em nossa relação
amorosa, no trabalho… Em relação às torcidas da Costa Rica, elas foram
acusadas pela mídia e por dirigentes de clubes de serem naturalmente violentas.
É preciso lutar contra essa afirmação simplista e vazia. Há condições
estruturais, culturais e econômicas que fazem com que a violência nos estádios
seja possível.

Já houve morte na Ultra?

Sim. Em 2002 ou 2003, após uma partida contra a Liga
Deportiva Alajuelense. Um rapaz recebeu uma pedrada. Há outras duas mortes que
tentam associar à torcida do Deportivo Saprissa, mas sem confirmação.

Messi, Neymar, Cristiano Ronaldo, Keylor Navas ou Bryan
Ruiz?

Considero Cristiano Ronaldo mais completo. Se tivesse nascido na Alemanha e
fosse um pragmático do futebol, ficaria com ele. Mas sou latino. Messi é magia,
poesia. Neymar está mais próximo do Messi do que do Cristiano Ronaldo.