Política

Obras públicas: Prejuízo pode levar à recisão de contratos

Com preços nas alturas e falta de insumos, construtoras buscam aditivos

Sem acordo, pode começar a haver obras públicas abandonadas - Foto: Divulgação 
Sem acordo, pode começar a haver obras públicas abandonadas - Foto: Divulgação 

 

Reportagem: Cláudia Neis

Cascavel – Embora praticamente não tenham parado durante a pandemia do novo coronavírus, as construtoras sentem agora mais duramente os impactos, os quais devem também mexer com os cofres públicos. Por conta do aumento expressivo dos preços dos insumos de construção, que em alguns casos chega a 90%, as empresas responsáveis por obras públicas estão buscando aditivos de valor para contratos de obras e serviços de engenharia impactados por essa alta. A principal razão do reajuste é a falta de matéria-prima de diversos produtos causada pela interrupção de produção devido à pandemia.

O advogado Sandro Mattevi Dal Bosco, do Sinduscon Oeste (Sindicato da Indústria da Construção Civil do Paraná Oeste), conta que já encaminhou cerca de 20 pedidos de aditivos de construtoras associadas a órgãos públicos na região por conta desse problema.

“Esses aditivos visam a um reequilíbrio econômico-financeiro dos contratos, estão previstos em lei, tanto na Constituição como na Lei de Licitações (8.666/93). O reequilíbrio pode ser solicitado apenas em ocorrência de fato imprevisível, ou previsível com consequências incalculáveis, que, neste caso, é esse aumento extraordinário e imprevisível no preço de alguns insumos, especialmente aço, cimento, blocos cerâmicos, tubos, conexões e cabos elétricos”, explica.

Segundo ele, há pedidos aceitos, outros negados e, inclusive, empresas que estudam ingressar com pedidos judiciais.

Como funciona

O pedido de aditivo deve ser feito pelas construtoras ao organismo do poder público com demonstração de valores e justificativa. “Inicialmente, se faz um pedido administrativo, demonstrando os aumentos. Um exemplo: quando o contrato foi celebrado, o valor do aço era de R$ 10 e agora ele está custando R$ 20. A empresa não consegue arcar com esse valor a mais e por isso pede o reequilíbrio. Não é um aumento no valor do contrato, é só para evitar o prejuízo que elas estão tendo com esses aumentos. Então, caso esse pedido inicial seja negado pelo poder público, nós fazemos nova solicitação, pedindo reavaliação, e, caso haja nova negativa, a empresa pode ingressar com pedido judicial, mas esse seria o último recurso”, ressalta o advogado.

Temor

Sandro observa que há diversos fatores relacionados a possíveis negativas para os aditivos. “Alguns prefeitos têm receio de aprovar e pagar o aditivo e depois serem mal interpretados; outros que finalizam os mandatos não querem se comprometer assinando esses aditivos. Tem ainda a questão orçamentária, que os municípios, especialmente os menores, não têm dinheiro para pagar. Fato é que, caso não haja esse reequilibro, pode haver um ‘enriquecimento ilícito’ da administração pública, pois está pagando um valor de uma obra que vai custar bem mais caro”, pondera.

Prejuízos

A consequência da falta de acordo entre empresas e poder público pode ser a recisão dos contratos e a paralisação das obras em curso. “Existe o risco de as empresas, caso não consigam esse reequilíbrio, fiquem à beira da falência e rescindam os contratos. Essa recisão pode ser amigável, de comum acordo com o contratante, ou também unilateral, até mesmo de abandono da obra, neste caso, a empresa também é penalizada e tem que pagar multas, mas há risco de essas obras não serem finalizadas porque o custo alto torna os contratos impossíveis de serem cumpridos”, alerta Sandro.

As prefeituras da região foram oficiadas sobre a necessidade de discussão do reequilíbrio dos contratos ainda em novembro, pelo próprio Sinduscon, que não obteve resposta.

Cascavel avalia pedidos

Em Cascavel, a administração municipal informou que está atenta às variações do mercado e que as construtoras podem fazer o pedido, mas terão que comprovar que houve o aumento e que não era possível prever quando formulou a proposta na licitação (fato superveniente).

Acrescenta que tem recebido pedidos de construtoras que serão analisados “com muito critério” por parte dos técnicos, fiscais do contrato e procuradores do Município e que, se ficar comprovada a variação, é possível corrigir o preço, mantendo a margem de lucro que a construtora apresentou na licitação.

Compras coletivas garantem economia e estoque de materiais

 Uma ideia antiga e que foi viabilizada durante a pandemia pelo Sinduscon Oeste vem registrando adesão acima do esperado. O Sindicato organizou um sistema de compras coletivas nacionais e internacionais. “A ideia de organizar e viabilizar essa possibilidade de compra compartilhada ou conjunta de materiais entre as construtoras associadas ao Sinduscon já existia e, com a pandemia, altos preços e falta de materiais, ela foi posta em prática. A entidade e as construtoras unidas têm mais força comprando juntos, com volumes maiores. Além de conseguir valores melhores, também é possível conseguir uma reserva de mercado. Por exemplo, de determinado material, podemos reservar 20% de toda a produção de uma indústria para o Sinduscon, garantindo, assim, que haja estoque e que a empresa já programe a produção desse volume com destino certo”, explica o presidente do Sinduscon Oeste, Ricardo Lora.

Segundo ele, há possibilidade de compras internacionais, com maior segurança e garantia de entrega. “Para essa plataforma, nós contratamos uma empresa especializada, que é responsável por todo o processo. E isso impulsionou especialmente a importação. Nas compras internacionais, é preciso mais cautela e, se a empresa for comprar sozinha, muitas vezes o volume não torna viável a compra. Essa plataforma já existe também em outros Sinduscons, especialmente da Região Sul, então nós unificamos os pedidos e fechamos uma carga de aço que vem da Turquia, são 20 mil toneladas de aço. Para esse tipo de compra, você precisa fechar o volume do navio, o que só foi possível com a unificação. Além da garantia de entrega, conseguimos uma economia de 20% na compra, se comparado aos valores praticados no Brasil”, ressalta.

Ricardo explica que a plataforma e o catálogo de opções foram apresentados às 240 construtoras associadas em novembro e, no treinamento dos interessados, houve a lotação das 100 vagas disponíveis e grande procura de outras empresas, por isso novo treinamento para a utilização do serviço está sendo organizado. “Nós estamos observando uma movimentação grande de compra. As empresas vêm aprovando a ideia. No início de janeiro, teremos o primeiro relatório das compras. Será um balanço que a empresa responsável por todo o processo vai disponibilizar com detalhes de valores e materiais que já foram adquiridos por meio da compra compartilhada”, complementa o presidente do Sinduscon Oeste.