Opinião

O efeito negativo da linguagem imprecisa

Eu realmente não valho nada para você!

O efeito negativo da linguagem imprecisa

Tratamos na postagem anterior sobre a discussão de casal na qual se faz uso da linguagem agressiva com o objetivo, consciente ou inconsciente, de vingança e punição. Mostramos também o quanto isso degrada a dignidade e corrói a relação de casal. Na postagem desta semana vamos avançar um pouco mais nesse tema.

Para começar, vamos falar da situação em que a linguagem não é, necessariamente, agressiva ou ofensiva e, mesmo assim, produz efeitos corrosivos à relação. Trata-se da linguagem vaga ou obscura por meio da qual a pessoa pretende expressar seus desejos e expectativas em relação ao cônjuge. A pessoa vítima dessa linguagem fica sempre na defensiva, porque não identifica com clareza o que a outra pessoa quer. Por exemplo, um dos cônjuges diz ao outro no contexto de uma conversa: “Não seria tão ruim se a gente saísse de novo uma noite dessas”. O outro cônjuge não fixou a informação porque não veio acompanhada com dados concretos: quando, onde, qual finalidade etc. Algum tempo depois, surge uma discussão entre o casal. Nesse momento, o parceiro que havia feito aquele “convite” aproveita para dizer: “Você também se recusou novamente a sair comigo à noite! Eu realmente não valho nada para você!”. O cônjuge responde que não se lembra, o que é verdade, porque o convite vago não foi registrado. Pronto! Está instaurada uma discussão que costuma desandar para agressão e ofensa com acusações injustificadas. E estamos de volta ao nível das discussões que examinamos na postagem anterior.

A pessoa que não diz com exatidão o que espera do parceiro tem uma grande vantagem: pode criticar constantemente os esforços do outro como não correspondendo ao que quer e pede.

Uma pessoa que jamais diz com clareza o que espera do parceiro é impossível de ser contentada. Por esse motivo, essa pessoa sempre se coloca como vítima: para ela, o parceiro “nunca” realiza o que espera.

O que esse modo de comunicação produz no cônjuge que “nunca” faz o que o outro deseja? Alimenta nele um permanente sentimento de culpa. Por quê? Porque ele não consegue identificar o que, concretamente, o parceiro deseja dele, uma vez que este emprega uma linguagem vaga, imprecisa. Falta à conversa um foco preciso. O ponto que deu início à discussão serve unicamente de mote para reavivar todas as dores e as feridas passadas.

Em consequência disso, o cônjuge que ouve isso praticamente entra em pânico cada vez que o parceiro começa uma conversa. Ele já sabe que não conseguirá captar o que o cônjuge quer dele e, por isso, a conversa inevitavelmente desandará em briga. O efeito físico e psicológico dessa forma de relação é a exaustão. Algumas vezes a pessoa perde o rumo e deseja morrer.

Falamos até aqui da linguagem verbalizada. Há, no entanto, uma dimensão não verbalizada da linguagem cujo impacto sobre o parceiro não é, nem por isso, menor.

Além da linguagem gestual, existe a “conversa mental” pela qual julgamos e criticamos o outro dentro da mente. Algumas vezes, acontece ainda de a pessoa dizer palavras agradáveis, mas internamente pensar o contrário. Em tudo isso, o parceiro sente o verdadeiro: aquilo que a pessoa realmente está sentindo, ainda que pronuncie algo completamente oposto a isso.

Na linguagem agressiva com intenção de ofender, está em jogo o sentimento de raiva em relação ao parceiro. Essa raiva muitas vezes tem origens sistêmicas. Na próxima postagem trataremos disso.


JOSÉ LUIZ AMES E ROSANA MARCELINO são terapeutas sistêmicos e conduzem a Amparar.

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