Cotidiano

Na crise, pontos de programas de fidelidade viram moeda

INFOCHPDPICT000063503394RIO – Milhas, pontos, dotz, bônus. Seja qual for o nome, a pontuação acumulada em programas de fidelidade tornou-se uma moeda com amplas possibilidades de troca. Embora as passagens aéreas ainda liderem a lista de produtos trocados, já é possível ?comprar? de ingressos para shows e cinemas a material de limpeza, além de pagar contas e fazer caridade. Alguns cartões de crédito já até oferecem descontos na fatura em troca dos pontos. Milhas

Para as empresas, os programas são uma forma de reduzir a chance de o cliente bater na porta do concorrente em busca de vantagens. Para o consumidor, uma maneira de poupar o dinheiro real em plena recessão. Dados da Associação Brasileira das Empresas do Mercado de Fidelização (Abemf) mostram que a adesão aos programas cresceu: eram 78 milhões de cadastros em setembro de 2016 (últimos dados disponíveis), 15% acima do registrado em igual mês do ano anterior.

Os dados se referem aos cinco associados da Abemf (Dotz, Grupo LTM, Multiplus, Netpoints e Smiles) e não elimina duplicidade, já que uma mesma pessoa com cadastros em dois programas é contada duas vezes. Ainda assim são uma referência de como os brasileiros têm recorrido à moeda da fidelidade para suprir desejos e necessidades.

Segundo a Abemf, as passagens aéreas ainda são maioria entre os produtos resgatados, respondendo por 70% das trocas. Nos 30% restantes, a preferência tem sido a busca de bens e serviços que complementam o orçamento familiar. Na categoria de itens resgatados com valores acima de R$ 100, o pagamento de contas ocupa o topo do ranking. Na faixa de R$ 50 a R$ 100, combustível é o produto número um da lista. Já no grupo de até R$ 50, o vale-presente encabeça o rol dos itens trocados, seguido pela recarga de celular.

? Antes, as pessoas achavam que só quem comprava muito no cartão de crédito e quem voava de avião é que conseguia vantagens em programas de fidelidade. Hoje, com o número grande de parceiros dos programas e o amplo leque de produtos que podem ser resgatados, mesmo quem tem baixo consumo se beneficia ? diz Roberto Medeiros, presidente da Abemf. ? Com o ambiente econômico, serviços do dia a dia passaram a ser mais procurados.

No programa de fidelidade Dotz, por exemplo, é possível pagar contas de até R$ 300 de concessionários públicos, seja luz, gás, água ou telefone. Para uma conta de R$ 100, são necessários 9.091 dotz. Também dá para fazer recarga no celular e trocar dotz diretamente em supermercados ou drogarias. As trocas em pontos de venda cresceram 26% em 2016, o que, para o diretor de parcerias da Dotz, Leandro Torres, mostra que há uma tentativa de complementar a renda mensal.

? É gente que usa a pontuação acumulada para fazer compras do mês, um claro sinal da crise econômica ? afirma Leandro.

O militar David Barreto Barbosa, que tem renda familiar mensal de R$ 5 mil, foi um dos que usou seus pontos no programa de fidelidade para aliviar as contas do mês. Endividado com uma reforma que resolveu fazer em casa ano passado, ele aproveitou seus dotz para pagar contas de luz e telefone ao menos três vezes. Foi a primeira vez que fez um resgate de pontos do programa.

? Sou cadastrado há três anos do programa e vinha acumulando pontos, pensando em fazer uma viagem. Mas fiquei apertado ano passado e decidi usar os bônus que acumulava no cartão de crédito para pagar contas ? conta Barbosa.

CRÉDITO NA FATURA DO CARTÃO

Os pontos também podem ser convertidos em descontos na fatura do cartão de crédito, modalidade conhecida como cash back e que começa a ser oferecida por alguns bancos. Assim, os usuários podem ?apagar? da fatura gastos com Uber, compras na padaria ou diárias de hotéis.

O Santander é um dos bancos que oferecem o serviço. Quem tem o cartão Reward recebe automaticamente 2,5% dos gastos mensais de volta na fatura. Nos demais cartões, o crédito pode ser feito mediante solicitação. O novato Nubank promete lançar seu programa de recompensas em breve e também prevê a conversão de pontos em crédito na fatura. Inicialmente, estará disponível para os usuários do sistema Android, com a vantagem de ter o real como parâmetro de conversão.

Os cartões de crédito lideram em disparada o processo de acúmulo de pontos. Mas, como usam o dólar na conversão dos pontos, essa poupança varia muito em razão da cotação da moeda americana. Quanto mais alta ela for, menos pontos são acumulados. No fim de 2015, quando o dólar passou de R$ 4, o estoque de pontos nos programas de recompensas dos cartões de crédito somavam 257,4 bilhões, segundo dados do Banco Central. No fim de 2014, eram 304 bilhões.

? Tanto a variação do dólar quanto o menor volume de compras com cartão de crédito, devido à crise econômica, contribuíram para que o acúmulo fosse menor em 2015 ? explica Leonel Andrade, diretor da Associação Brasileira das Empresas de Cartão de Crédito (Abecs) e presidente do Smiles, programa de fidelidade da Gol.

Com o freio no dólar no segundo semestre de 2016, é possível que o acúmulo de pontos com uso dos cartões tenha invertido a trajetória de queda. Para quem conseguiu juntar uma quantidade razoável de pontos vale fuxicar os sites dos programas de fidelidade em busca de opções de entretenimento. O aguardado show de Elton John e James Taylor, que será em abril na Apoteose, já tem ingressos ?à venda? na Livelo, programa de fidelidade de Banco do Brasil e Bradesco. Um lugar na pista sai por 13.500 pontos, uma economia de R$ 360.

CAMAROTE NO CARNAVAL

Nem o carnaval de Salvador escapou aos programas de fidelidade. Quem ainda não decidiu o que fazer nos dias de folia encontra várias opções no Smiles. O abadá para o camarote da Skol Beats Senses sai por no mínimo 32.400 milhas. Já o do camarote Oceania sai por ao menos 20.250 milhas.

Os clientes também podem resgatar pontos para fazer caridade ou apoiar projetos ambientais. No Multiplus, vinculado à Latam, uma visita de palhaços da ONG Doutores da Alegria a duas crianças hospitalizadas sai por 1.710 pontos. Já o plantio de cinco mudas de árvores pela ONG SOS Mata Atlântica custa 3.620 pontos. Boas opções para quem tem milhas a expirar e não sabe o que fazer com elas.

Andrade, da Smiles, lembra que a troca de pontos ou milhas por passagens ainda são o mellhor custo-benefício. A média de preços dos bilhetes aéreos no Brasil é de cerca de R$ 300, algo que um cliente do Smiles consegue comprar por cerca de 10 mil milhas, em média. Produtos que custam R$ 300 nos parceiros varejistas do programa não saem por menos de 15 mil milhas.

? Isso acontece porque produtos ligados à cadeia do turismo, como passagens e diárias de hotéis, são perecíveis. Se sobrarem assentos no avião ou quartos no hotel, não vou resgatar essa receita nunca. Por isso, são mais ?baratos?. No varejo, se eu não conseguir vender uma cafeteira hoje, posso fazer isso amanhã ? afirma o executivo.