Cotidiano

Na China, lei contra fofocas proíbe conteúdos que exaltem o estilo de vida Ocidental

INFOCHPDPICT000061992757PEQUIM ? O fim do casamento de Brad Pitt e Angelina Jolie pode ter dado o que falar mundo afora nos últimos dias, mas foi a separação do ator Wang Baoqiang a grande sensação recente nas redes sociais da China. O ex-migrante que se tornou celebridade no país foi à internet em agosto dizer que tinha sido traído para, no dia seguinte, anunciar o pedido de divórcio. A mulher, Ma Rong, reagiu depressa e avisou que processaria o ex por difamação. Seria apenas mais um caso efêmero acompanhado por fãs e curiosos, como tantos outros, até a hashtag #WangBaoQiangDivorce bater 7,9 bilhões visualizações no Sina Weibo ? o equivalente ao Facebook na China ? e chamar a atenção das autoridades. Este é o tipo de polêmica que o governo chinês pretende evitar daqui para frente.

Um comunicado da Administração Estatal da Imprensa, Edição, Rádio, Filme e Televisão proíbe reportagens que exaltem o ?estilo de vida Ocidental?, façam piada sobre valores tradicionais e a cultura chineses, passem adiante fofocas sobre casamentos desfeitos ou brigas de família de celebridades, ou ainda, cultuem a imagem de ídolos, bilionários e outras estrelas, sobretudo aqueles cujas histórias se misturem com falta de escrúpulos e egoísmo para subir na vida a qualquer custo.

A ideia é que as notícias sobre sociedade e entretenimento em geral sejam dominadas por ?energia positiva?. O teor da circular foi publicado pela mídia estatal dias depois da polêmica. ?Devem evitar colocar estrelas, bilionários ou celebridades na internet em pedestais. E não badalar disputas familiares”, disse a agência Xinhua ao citar a circular.

O debate sobre o divórcio de Wang se arrastou por semanas e, além de promover uma série de julgamentos à vida conjugal do ex-casal e posts em que os internautas tomam partido ou atacam um e outro, dando origem a um grande debate sobre o divórcio na China e os direitos legais de cada um após a separação. De acordo com o jornal estatal ?Global Times?, o número de divórcios tem crescido no país, chegando a 3,84 milhões de casais separados em 2015, ou quase 6% a mais do que no ano anterior.

Os chineses não são diferentes do restante do mundo. Gostam de notícias picantes e de ler fofocas sobre seus artistas preferidos, sobretudo na internet. E as muitas histórias de pessoas bem-sucedidas que começaram com nada ou bem pouco também fazem sucesso. De certa forma, são até estimuladas na sociedade. Mas já não é de hoje que as autoridades se preocupam em disseminar os valores e ideologia considerados importantes pelo Partido Comunista.

Tudo na China ganha imensas proporções muito depressa, sobretudo quando se trata da internet, onde há um exército recém-contado de 700 milhões de internautas conectados, marca batida este ano. E este é um dos motivos para que o governo esteja sempre monitorando a rede e criando novos mecanismos de controle. De olho nestes fenômenos de internet, as autoridades já haviam proibido há alguns meses vídeos promovidos por ?vlogers? com roupas sensuais ou gestos considerados obscenos, como meninas que se filmavam comendo bananas. Vários sites que promoviam a pornografia foram tirados do ar.

Para especialistas, a preocupação é que as novas restrições venham a criar excessos ou cercear a liberdade de expressão dos cidadãos chineses.

? Parece que o governo chinês tem se preocupado cada vez mais com os cidadãos, sobretudo com aqueles que viajam para o exterior e são expostos às culturas ocidentais, recebendo influências dos valores estrangeiros. Isso também mostra que o governo está cada vez mais inclinado a controlar os pontos de vista dos chineses sobre o Ocidente e reforçar o nacionalismo como um todo, mesmo no que diz respeito à indústria do entretenimento ? disse ao GLOBO Patrick Poon, especialista da Anistia Internacional, baseado em Hong Kong.

Neste momento, a China está revendo um projeto de lei que determina que os trabalhadores da indústria cinematográfica “mantenham uma excelente integridade moral” como forma de cobrar uma postura de exemplo para o resto da população. Isso acontece pouco depois que celebridades locais foram presas por envolvimento com drogas e prostituição, entre eles o cantor Li Daimo (que se tornou conhecido após vencer o ?The Voice China?), Zhang Mo e Jaycee Chan, filho do ator e estrela de kung fu Jackie Chan.

Este é um dos pontos da nova lei que deve regular o setor como um todo. Espera-se que a bilheteria dos cinemas na China ultrapasse a americana nos próximos três anos, o que fará do país o maior mercado do mundo. Há ainda as políticas para censura, distribuição dos filmes e até mesmo limites para importação de filmes estrangeiros. Especialistas acreditam que o governo chinês quer garantir pelo menos 55% da bilheteria no país para filmes chineses.