Cotidiano

Moro diz que lei de abuso de autoridade pode limitar ação de juízes e da Lava-Jato

BRASÍLIA – Depois de quatro horas de debate, o juiz Sérgio Moro disse nesta quinta-feira que a proposta da lei de abuso de autoridade pode “limitar” a atuação da magistratura, além de integrantes do Ministério Público e de policiais, ressaltando que é preciso haver uma “magistratura livre”. Ele disse que, se for adotada sua proposta de incluir regra que não considere crime divergências de interpretação da lei e de provas, 80% dos problemas estarão resolvidos.

? A lei pode ter o efeito prático de limitar a independência da magistratura, e isso seria terrível. E isso não diz respeito apenas à operação Lava-Jato, mas a todas as operações de investigação, à garantia de liberdade de todo o cidadão. Porque uma magistratura atemorizada não é uma magistratura livre para realizar o seu trabalho. Minha preocupação sempre foi que ele fosse utilizado, na prática, para cercear a independência da magistratura. É importante se ter juízes independentes, Ministério Público autônomo e é importante que o agente policial possa cumprir a lei, sem ter a preocupação que suas ações possam contrariar interesses especiais ou interesses de poderosos ? disse Moro.

Ele pediu que não se aprovem medidas – tanto a lei como o pacote anticorrupção – que fragilizem as instituições.

? Foi inserido de última hora (no pacote anticorrupção) uma emenda que trata de crime de responsabilidade e de abuso de autoridade que oferece o mesmo risco, de certa maneira, que esse projeto do Senado: podem colocar em xeque, que coloca em risco a independência da magistratura e a autonomia do Ministério Público ? disse ele.

Numa resposta ao ministro Gilmar Mendes, Moro disse que “entristece” ver a versão final do pacote anticorrupção, porque várias medidas nem tão polêmicas ficaram de forma. E disse que a emenda que penaliza juízes e promotores teria o mesmo efeito da Lei do Abuso, ou seja, de tolher a ação dos investigadores.

? Respeito muito o ministro Gilmar Mendes, é possível ter divergências sobre parte dessas medidas. Mas o que entristece é que várias polêmicas que não eram tão polêmicas e traziam institutos aprovados e recomendados pela ONU acabaram ficando de lado, como enriquecimento ilícito, normas que preveniriam a ocorrência de prescrição de processo, confisco alargado, daí compreendo a atitude dos procuradores do caso que chegaram à uma situação de extrema preocupação com o futuro da operação Lava-Jato ? disse Moro.

O juiz disse ainda acreditar que o Senado levará em conta sua sugestão para aperfeiçoar o projeto.

? A norma que sugeri – e seguindo o exemplo do nosso pai fundador Rui Barbosa – seria uma norma singela prevendo que não configura crime previsto nesta lei a divergência na interpretação da lei penal ou processual penal ou divergência na avaliação de fatos e provas. Se essa norma for aprovada, e espero que o Senado insira essa norma de salvaguarda, acredito que 80% das preocupações seriam resolvidas ? disse Moro.

Moro não quis responder sobre os ataques do senador Lindbergh Farias (PT-RJ). E, brincando, mostrou alívio em deixar Brasília:

? Graças a Deus, tem muito trabalho em Curitiba.

Já o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), disse que a votação do projeto da Lei do Abuso de Autoridade está mantido para o próximo dia seis, mas alertou que pode haver mudanças, se o plenário quiser. E lembrou a votação de ontem, quando foi derrotado ao tentar forçar a votação do pacote anticorrupção.

? Está mantida para o dia seis, salvo decisão em contrário. Como ontem, pode acontecer ? disse Renan.