Cotidiano

Ministro da Justiça critica empresas de tecnologia e ataca uso de 'nuvem'

BRASÍLIA – Em palestra recheada de críticas às empresas de tecnologia, o ministro da Justiça, Alexandre Moraes, chamou a atenção nesta quinta-feira para os perigos da internet e do uso comercial dos dados dos usuários de serviços oferecidos por essas empresas. Ele atacou, por exemplo, o uso da “nuvem”, que permite ao internauta guardar arquivos em um computador remoto, em geral de uma grande empresa, o que levaria à quebra de privacidade e de intimidade. Segundo o ministro, houve êxito em impedir a intromissão indevida do poder público da rede mundial de computadores, mas um “fracasso total” em garantir proteção à privacidade os internautas.

– Hoje o grande Big Brother do mundo não é o Estado, o poder púbico. Na verdade, é a rede. E a rede até quis facilitar a vida dela mesma, criando a nuvem, e dizendo que isso é bom para nós. Você deixou tudo guardado, e mais detalhado ainda, com fotos. Vira e mexe, tem um escândalo: a foto vazou, o hacker pegou na nuvem. Se o hacker, por mais brilhante que sejam, consegue pegar uma coisa, quer dizer que essa coisa está armazenada. Se está armazenada, quem armazena tem acesso a tudo. Pode utilizar ou não, mas tem acesso a tudo – afirmou o ministro, concluindo:

– Essa proteção em relação a nós usuários, nós não temos. Nós temos a proteção no seguinte: se o poder público quiser pegar essas informações precisa de ordem judicial. Agora se a rede quiser utilizar, armazenar, mesmo que não utilize pontualmente contra um pessoa, mas isso também pode ocorrer, mas utilize para fins comerciais, para saber o que é mais acessado, o que você gosta, isso também é quebra da privacidade, é quebra da intimidade.

As declarações foram dadas em palestra no “XIX Congresso Internacional de Direito Constitucional”, realizado no Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), em Brasília. O tema da palestra foi “cenários sobre governança, regulação e internet”. O ministro evitou citar o nome de empresas, mas em um momento disse que o Google é o melhor espião do mundo:

– O melhor espião do mundo é o espião Google. Tem muita mentira lá, mas tem muita informação. Com a informação, se você trabalhar, você consegue saber qual a ideologia política da pessoa, quais os autores que ela lê, os jornalistas, quais os gostos, o que acessa, do ponto de vista de compra também. E isso vai passando desapercebido, mas vais sendo armazenado.

O ministro negou defender uma intervenção estatal na rede, mas atacou a falta de transparência das empresas de interne

– Se houve êxito em impedir que o poder público censure, bisbilhote, consiga informações sigilosas, abuse, o que houve até agora foi um fracasso total em nos proteger de nós mesmo, no sentido de nos proteger do ambiente digital – disse Moraes.

– Nós somos muito mais bisbilhotados hoje pela rede do que nós achamos. O celular, se você quer saber onde a sua família está, tem rastreador. Isso vai para uma central, e a central também sabe onde você está, onde você parou, quanto tempo parou. Nem o Big Brother, do (livro) “1984”, nem lá iam pensar em algo tão brilhante para saber tudo. Não estou dizendo que é uma conspiração internacional. Mas foi evoluindo, e essa evolução, que não vai parar, obviamente, tem que ser mais transparente. E, a partir dessa transparência, uma regulamentação mais protetiva dos usuários e da sociedade – acrescentou o ministro.

Moraes não falou sobre os atritos com o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), em razão da Operação Métis. Na última sexta-feira, a Polícia Federal (PF), ligada ao Ministério da Justiça, prendeu quatro servidores da Polícia Legislativa do Senado e cumpriu mandados de busca e apreensão nas dependências do órgão, irritando Renan. A suspeita é que eles estivessem atrapalhando a Operação Lava-Jato. Nesta quinta-feira, o ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal (STF) mandou suspender a operação.