Policial

Mais de cinco mulheres violentadas por dia em Cascavel

Uma pesquisa do Departamento de Pesquisas Judiciárias do Conselho Nacional de Justiça identificou que, até o fim de 2017, havia um processo judicial de violência doméstica para cada 100 mulheres brasileiras. No período, foram 1.273.398 processos referentes à violência doméstica em todo o País. Só no ano passado, no Brasil, foram 388.263 novos casos, 16% a mais com relação a 2016.

Em Cascavel, o cenário não é diferente e os dados chamam a atenção. Só neste ano, considerando os dois primeiros meses de 2018, foram 325 casos de violência contra a mulher, registrados na Delegacia da Mulher. O que significa mais de cinco mulheres por dia violentadas, seja verbal ou fisicamente.

Número esse que vem crescendo ao longo dos anos. Em 2016, foram 1.652 registros de boletins de ocorrência na Delegacia e, em 2017, 2.077. Todos os casos que viram processo e podem se tornar inquéritos no Ministério Público.

Na 15ª Promotoria Pública de Cascavel, de fevereiro de 2017 a janeiro de 2018, foram 12.736 processos movimentados. Segundo a promotoria, foram 832 denúncias oferecidas nesse mesmo período e 558 arquivamentos. Quantidade de inquéritos e de desistências que chama a atenção.

“Percebemos que o número é estrondoso. A gente não acredita que isso surgiu da Lei Maria da Penha. Isso sempre existiu. Mas, com a criação de delegacias especializadas e varas especializadas no assunto, as mulheres estão denunciando mais”, afirma a promotora Andréa Frias.

São, pela 15ª Promotoria, 900 medidas protetivas vigentes. Só de janeiro até agora, foram mais de 100.

Abandono

“Apesar de tudo o que oferece a Lei Maria da Penha, a mulher que denuncia violência doméstica é uma heroína. Os primeiros que viram as costas pra ela, infelizmente, são os familiares. Que dizem que ela vai colocar o pai dos filhos dela na cadeia. Existe essa cultura de a família se voltar contra a vítima. E nós vemos isso todos os dias, quando arrolamos uma testemunha”, comenta a promotora Andrea Frias.

O crime de violência doméstica é diferente de outros crimes. Isso porque o agressor costuma não ter antecedentes criminais, trabalha, ou seja, é uma pessoa “boa” para a sociedade. “São crimes ligados à bebida, por exemplo. Em que o homem bebe e desconta da mulher. É algo muito interno, e se a família não der suporte, acaba com a vítima. Precisamos ter a conscientização que é melhor o sujeito responder criminalmente por uma lesão do que por um homicídio”, reitera.

Prisão

A pena para violência doméstica pode variar de três meses a três anos de prisão. E, nos casos de feminicídio, que é uma qualificação do homicídio, a pena é de 12 a 30 anos. A pena é maior do que em casos de assassinato sem qualificadora, em que o acusado pode ficar de seis a vinte anos preso. “Estou com um inquérito que, se não fosse violência doméstica, essa pessoa jamais estaria presa. Um assaltante, por exemplo, para manter na cadeia, ele precisa ter maus antecedentes. A violência doméstica não. Ela permite que em casos de crime de ameaça, por exemplo, que tem a pena mais branda, o réu permaneça preso se ele já tinha uma protetiva contra ele e descumpriu”, explica a promotora pública Andréa Frias.

“Ninguém começa matando uma mulher. Primeiro, o homem começa menosprezando a companheira. Dizendo que ela está gorda, feia, que não faz as coisas direito. Depois, vai para uma agressão mais leve, e para uma mais grave, e termina no homicídio”, complementa.

Trabalho conjunto

A violência não precisa, necessariamente, ser denunciada pela mulher. As informações podem ser repassadas de forma anônima pelo telefone 180. Porém, se a suposta vítima negar a violência e não houver marcas, sem provas, não há o que fazer. Mas, em casos que a esposa prefere não denunciar e que o casal tem filhos, tudo funciona diferente. “Ela tem o livre arbítrio para ficar no ambiente e muitas vezes o Estado não consegue tirá-la dessa situação. Porém, se há um filho, é diferente. A criança pode ser retirada da família, não pode viver em um ambiente de violência, porque depois se torna multiplicadora disso”, explica a promotora pública Andréa Frias.

Desistência

O número de arquivamentos também é considerado alto, porque são situações em que a vítima, normalmente, desiste do processo, porque voltou ao relacionamento com o agressor. “Ela entende que se perdoou, precisa retirar o processo. Não julgamos a vítima que resolveu voltar com o marido. Mas, a retirada da denúncia não é o caminho certo. O agressor tem de responder por aquilo que fez, caso contrário vai saber que pode fazer de novo, e que depois o casal faz as pazes, ela retira processo, e assim vai. É preciso ter uma postura de dignidade”, reitera Frias.

Patrulha Maria da Penha

A Lei que garante a atuação da Patrulha Maria da Penha, setor da Guarda Municipal, foi assinada pelo Executivo em agosto do ano passado. E só agora começou a funcionar, não oficialmente, e a passos lentos. Segundo a Guarda Municipal, já ocorre o recebimento de medidas protetivas do fórum e alguns atendimentos foram realizados. Porém, ainda falta um lançamento oficial da patrulha, que depende do prefeito Leonaldo Paranhos, de acordo com o diretor da Guarda, coronel Avelino Novakoski. “Demorou porque era necessária assinatura de um termo de cooperação da Prefeitura e do Tribunal de Justiça, e houve um acúmulo de atividades por conta da rebelião da PEC [Penitenciária Estadual de Cascavel]”, explica o coronel.

Segundo o Executivo, esse termo de cooperação já foi assinado e as medidas protetivas são analisadas para que, em breve, as visitas comecem.

Uma viatura e dois guardas, um homem e uma mulher, vão atuar no setor. “A viatura vai fazer um roteiro de proteção, ir a casa das mulheres que têm a medida protetiva e perguntar se é cumprida. As mulheres que receberem o documento, já terão o número da guarda disponível para ligar caso ocorra de o agressor se aproximar dela”, complementa a promotora pública Andréa Frias.

Assistência Social

Um dos benefícios proporcionados pela Lei Maria da Penha é de que a mulher agredida, a partir do momento que pede a medida protetiva, pode ir para um abrigo. Mas a condição é temporária. A medida sai em 48 horas e, aí, é o agressor que precisa se afastar e é retirado da residência. Segundo a Secretaria de Assistência Social, em Cascavel há o abrigo Vanusa Covatti, que atende mulheres vítimas de violência. O fluxo é transitório: de três a cinco mulheres por períodos indeterminados, porque para cada caso há uma solução diferente.

 

DADOS 

REGISTROS DE VIOLÊNCIA

2016 1.652

2017 2.077

JAN E FEV 2018          325