Cotidiano

Luiz Melodia grava DVD em show no Teatro da UFF

Niterói — Luiz Melodia é filho do São Carlos, berço do samba incrustado no Estácio, bairro central do Rio. Na juventude, a ligação com o morro era tão essencial que em “Estácio, holly Estácio”, canção de seu disco de estreia, “Pérola Negra”, ele escreveu que se era para sofrer com os males do coração, que fosse nas ruas da região e aos embalos dos passistas da escola de samba da comunidade: “Se alguém quer matar-me de amor/Que me mate no Estácio…”. O cantor e compositor, há mais de 20 anos morador de São Conrado, diz-se cidadão de todo o Rio e — por que não? — também de Niterói.

— Não é porque eu nasci no Estácio. Mas tenho uma relação vital com a cidade, e Niterói e Rio são o mesmo lugar, não há distinção. Também tenho a sorte de ser muito bem acolhido aqui e acolá — diz Melodia, em entrevista em sua casa na Zona Sul carioca.

Niterói foi escolhida pelo cantor como o ponto ápice da turnê de seu álbum “Zerima”, lançado em 2014. Ele gravará o DVD do disco em show na quarta-feira, no Teatro da UFF.

— Percebi que o lugar já tinha toda a aparelhagem para fazer um trabalho bem bacana.

No repertório, estarão canções deste último disco, como “Cheia de graça”, que abre o show, além de músicas marcantes dos mais diversos momentos de sua carreira: “Vale quanto pesa”, de “Pérola Negra”; “Congênito”, de “Maravilhas contemporâneas”; e “Ébano”, lançada em 1975 para o Festival Abertura, da TV Globo.

— “Pérola Negra”, a canção, vou fazer com o arranjo original de 1973 — adianta.

Ao lado de suas composições, estarão na apresentação também versões de músicas de artistas consagrados. Melodia sempre grava canções de colegas que admira:

— Tem um rock’n’roll da Jovem Guarda que o Roberto Carlos cantava no começo da carreira, “Parei… Olhei”. E eu gosto muito do Frejat, é o estilo dele. Vou chamá-lo para participar. Ele nem sabe, vou ligar ainda.

Está no show também, assim como no “Zerima”, “Leros e leros e boleros”, de Sérgio Sampaio. O capixaba radicado no Rio era amigo de Melodia, que há anos inclui músicas dele em seus discos. “Claro” fez parte do álbum “Que loucura”; e “Cruel”, do “14 quilates”:

— Eu sempre vou gravar o Sérgio. Quando eu o conheci, ficamos muito amigos. Admirava o trabalho dele pra caramba. Já que as músicas são do meu amigo, vou aproveitar e gravá-las.

Sampaio estourou no início dos anos 1970, mas, depois, caiu no ostracismo. A canção-título de seu primeiro disco, “Eu quero é botar meu bloco na rua”, tornou-se, nos anos 2000, uma espécie de hino informal do carnaval de rua do Rio, em versão descarregada da melancolia presente na original.

— Não importa se a obra dele é conhecida ou não; eu não o gravo por isso. Eu me vejo muito como ele: um cara que começou a carreira e teve uma explosão. Mas depois, não vi mais tanto interesse da mídia. Logicamente, eu sei que, assim como ele, deixei minha marca na música — diz.

Melodia foi descoberto pelo poeta Waly Salomão, que passou a subir o São Carlos com Torquato Neto e outros amigos para ouvi-lo cantar. Dali, o cantor viu sua canção “Pérola Negra” entrar para o show de Gal Costa, “Gal fa-tal: a todo vapor”. O álbum ao vivo foi um marco por reunir artistas consagrados, como Caetano Veloso, Roberto Carlos e Luiz Gonzaga, a novos, como Lula Galvão, Moraes Moreira e Jards Macalé.

— O show foi de uma beleza incrível. Eu não esperava, não sabia que esquina iria dobrar, o que fazer com minhas composições. De repente, conheci aquela turma, o que me motivava mais ainda a escrever. Foi a época mais marcante da minha carreira, da minha vida.

Mais do que consagrado, Melodia leva uma vida tranquila, grava discos em períodos espaçados e, de vez em quando, colabora com jovens artistas. Ele já gravou com Céu, o niteroiense Black Alien e Karol Conká.

— Curiosamente, essa rapaziada gosta muito do meu trabalho. Tem uns artistas que são especiais para eles, né? Acho que sou um deles. Virei amigo do Black Alien e depois da Céu. Ele, eu chamei para cantar comigo no Serginho Groissman; e ela me chamou para participar de um disco. Depois, eu cantei no dele e ela no meu. Gosto deles, são ousados, autênticos, provocativos — elogia.