Cotidiano

Heather Kaye, designer de roupas: ?A indústria têxtil tem que ser totalmente circular?

201610131347188251.jpg?Tenho 43 anos, nasci em San Diego, Califórnia. Aos 21 anos, fui para Nova York cursar faculdade. Moro em Xangai. Meu pai é juiz aposentado, do tipo de pessoa que não atravessa a rua se for contra a lei. Minha mãe é professora aposentada, superorganizada. Parte de minha personalidade detalhista como designer acho que herdei dela.?

Conte algo que não sei.

Ninguém bebe água gelada na China. Se você chega num restaurante e pede água, servem água quente. Dá para queimar a mão no copo. Eles detestam gelo. Os chineses têm muita preocupação em não ficar gripados. Por isso, poucas pessoas tinham o hábito de nadar. É algo para pessoas ricas, mas as coisas começaram a mudar há poucos anos. E eles passaram a nadar mais.

Por que essa mudança?

Acho que é uma coisa que vem acontecendo principalmente na última década. Talvez, porque a China é, hoje, um país mais globalizado. Talvez, por causa dos bons resultados dos atletas em Jogos Olímpicos. Hoje, as mães colocam os filhos em aulas de natação e as escolas também passaram a ter piscinas para os alunos.

Sua empresa produz roupas de banho feitas de garrafas PET. Como surgiu essa ideia?

Deixei Nova York em 2006, para ir a Xangai pela empresa em que trabalhava nos EUA. Era para ficar na China por um ano. Mas meu marido e eu decidimos ficar por lá. Jã são 11 anos. Há seis, abri meu negócio. A ideia era produzir roupas de algodão orgânico bonitas e sóbrias, mas eu e minha sócia percebemos que as pessoas estavam comprando mesmo eram as nossas roupas estampadas. Foi aí que percebemos que todo mundo em Xangai usa bicicletas. E lá chove sempre, então, as pessoas usam grandes capas de chuva. Vimos que todas eram lisas. Então, começamos a fazer capas com as nossas estampas, 100% produzidas com garrafas PET. E ficamos tão surpresas com a qualidade do produto que passamos a fazer roupas de banho.

E por que as garrafas PET, em vez de outro material?

Todas as roupas de banho são de náilon ou poliéster. Mas, na estrutura molecular, não há diferença entre PET e poliéster. Saber disso nos deixou muito animadas para produzir um produto que seria exatamente igual ao comum, porém, feito com material reciclado.

Como é a reciclagem de PETs na China?

É ótima, porque as pessoas ganham algum dinheiro. Cerca de 90% das garrafas PET recicladas são coletadas por catadores informais. A estimativa é que 83% das PETs sejam recicladas no país. É bastante, principalmente se compararmos com os EUA, que reciclam apenas 31% delas.

Como a fabricação de roupas com materiais comuns impacta no meio ambiente?

A estimativa é que 18 bilhões de peças de roupas são compradas por ano no mundo. E o planeta tem sete bilhões de habitantes. E há que se considerar que uma parte do mundo não tem dinheiro para comprar roupas. Então, quem vem comprando tudo isso não possui espaço suficiente para guardar. Logo, um montante enorme de roupas é descartado todos os anos.

Esse excedente é doado?

Muitas pessoas que têm roupas sobrando não estão interessadas em doar. E mesmo que estivessem, não resolveria. A maioria das doações vai para lugares da África, Bangladesh e outros países pobres, mas mesmo estes já estão recusando. Não são roupas o que eles precisam mais.

Qual seria a solução?

A indústria têxtil tem que ser totalmente circular. A pessoa deveria poder devolver sua roupa à fábrica, para que todos os componentes dela fossem separados e reaproveitados em novos produtos. Ainda não temos tecnologia eficiente para fazer isso.