Cotidiano

Governo teme que delação de Machado atrapalhe votações da agenda econômica

Presidente interino, Temer não toca no assunto das gravações em reunião com ministros

BRASÍLIA – Interlocutores do presidente interino, Michel Temer, receiam que o desgaste do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e de outros caciques do PMDB comprometa a votação, no Congresso, de propostas da agenda econômica. Conversas entre o ex-presidente da Transpetro, Sérgio Machado, e membros do partido foram divulgadas esta semana e indicam articulações políticas para tentar barrar a Lava-Jato. Outra preocupação é que novas gravações que fazem parte do acordo de delação premiada de Machado envolvam outros integrantes do governo, como os ministros Henrique Eduardo Alves (Turismo) e Maurício Quintella (Transportes), citados na Lava-Jato.

O Palácio do Planalto está dividido sobre que rumo tomar se novas gravações comprometerem ministros. Há defensores de que Henrique Alves se licencie para preservar o governo. Mas Temer se reuniu com o ministro antes do feriado e não teria tocado no assunto.

O sentimento em relação a Renan também divide integrantes do Planalto. Temer e Renan se reaproximaram, mas ainda há desconfiança da atuação do presidente do Senado, que sempre foi visto como aliado da presidente afastada, Dilma Rousseff. Segundo ministros, Temer precisa ter uma boa relação com Renan porque ele controla a pauta do Congresso e do Senado, mas alguns veem numa certa vulnerabilidade do senador uma chance de conter seus movimentos, muitas vezes dúbios.

— Claro que essas gravações tumultuam, mas o governo conseguiu agir de forma cirúrgica no caso do Romero (Jucá). O problema está no Senado, não no governo — tentou minimizar um ministro ontem.

Na quarta-feira, Temer telefonou para Renan a fim de agradecer pela aprovação da nova meta fiscal de déficit de R$ 170,5 bilhões em 2016.

O governo tenta se manter afastado da crise e torce para não aparecer novamente nas gravações. A avaliação é que a saída de Romero Jucá do Ministério do Planejamento, depois da divulgação da gravação de uma conversa com Sérgio Machado, reduziu o desgaste do governo Temer.

REFLEXOS NA LAVA-JATO

Há preocupação com o impacto dos diálogos no Congresso, porque Temer ainda está reorganizando sua base na Câmara e no Senado. Até quarta, as gravações envolvendo Renan vinham sendo minimizadas, mas ontem foram divulgadas conversas em que o presidente do Senado chama o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, de “mau caráter”, e a avaliação é que isso pode complicar sua situação como investigado na Lava-Jato. Até então, ele se diferenciava do presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), no trato com o Ministério Público e o Supremo Tribunal Federal (STF). O deputado costuma bater de frente com as duas instituições.

No PMDB, o clima é de preocupação e de irritação com Machado. O ex-senador José Sarney disse a aliados que está “inconformado”. Ele afirmou que recebeu Machado para conversas achando que ele fazia uma visita a quem estava de recuperando de um longo período no hospital.

No PT, a avaliação de caciques que se encontraram com o ex-presidente Lula na terça-feira é que as gravações têm impacto moderado. A preocupação maior do PT é com as delações dos empreiteiros, que aí sim teriam “impacto explosivo”, pois envolveriam Lula e Dilma.

No PCdoB, a senadora Vanessa Grazziotin (AM) diz que as gravações de Renan “fecham a cadeia” iniciada por Jucá:

— Quem explicou o golpe foi o Jucá em suas gravações. Não vi as últimas gravações de Renan, mas todos eles falam que com Dilma não se pode ficar, se fecha a cadeia. Renan tem um bom relacionamento com todos no Senado, mas politicamente isso é ruim para ele.

Já o líder do PV no Senado, Álvaro Dias (PR), afirmou que tomar alguma medida seria uma redundância, já que o Ministério Público, a Polícia Federal e a Justiça fazem um “excelente” trabalho:

— Nesta altura, temos de valorizar o trabalho da Justiça, MP e PF. E não interferir nas medidas que são adotadas. Seria uma redundância.

Na mesma linha, o senador Antônio Carlos Valadares (PSB-PE) indica que o Senado pode não tomar providências contra seu presidente:

— Qualquer ação pode ser considerada extemporânea.