Cotidiano

Governo argentino pede anulação de prisão domiciliar para repressor 

20160822-174837.jpg BUENOS AIRES ? O governo argentino solicitará à Justiça a anulação do benefício de prisão domiciliar ao emblemático repressor Miguel Etchecolatz. Hoje aos 87 anos, ele cumpre pena de prisão perpétua por crimes contra a Humanidade durante a ditadura do país (1976-1983). O anúncio de sexta-feira passada, que beneficiou o ex-chefe de polícia despertou polêmica na Argentina, onde os organismos defensores dos direitos humanos repudiaram a decisão.

? A Secretaria de Direitos Humanos vai realizar essa apresentação devido, principalmente, às diferenças nas perícias médicas ? disse uma fonte da Secretaria de Direitos Humanos.

Dois juízes da cidade de La Plata, no Sul da Argentina, autorizaram a prisão domiciliar de Etchecolatz, de 87 anos. Eles alegam que esta é uma questão humanitária por conta da sua idade avançada. O ex-policial, que iniciou uma greve de fome em 26 de julho, continua preso, porque sua volta para casa foi negada em outro processo.

Desde que os julgamentos pelos crimes da ditadura foram retomados em 2006 ? três anos depois da anulação das leis de Anistia ? os organismos humanitários lutam pela prisão comum e efetiva para processados e condenados

Na Argentina, os presos acima dos 70 anos têm o direito à prisão domiciliar por razões de saúde, mas essa concessão não é aplicada de modo automático e depende de cada tribunal.

? Não estamos falando de um velhinho bom e arrependido, mas está demonstrado nos julgamentos que é um assassino em série, que sequestrou e torturou milhares e roubou bebês ? disse Carlos Zaidman, uma das vítimas da ditadura, em referência ao ex-chefe de Inteligência da província de Buenos Aires.

Dos 1.056 detidos por crimes durante a ditadura (entre condenados e processados), 568 estão atrás das grades (54%), e 462 em prisão domiciliar (44%), segundo um relatório de julho da Procuradoria por Crimes de Lesa-Humanidade. O restante se encontra hospitalizado, ou instalado em outras dependências.

MUDANÇA DE ÉPOCA?

Desde a posse do atual presidente argentino, Mauricio Macri, houve uma aceleração na concessão de detenções domiciliares.

Macri mantém uma relação tensa com os organismos humanitários. Ele é criticado por subestimar o número de 30 mil desaparecidos na ditadura argentina e dizer em campanha que iria “terminar com o roubo dos direitos humanos”.

? Há uma política do governo de desandar o caminho já percorrido, um retrocesso muito forte em direitos humanos e sociais ? afirmou na segunda-feira o Prêmio Nobel da Paz, Adolfo Pérez Esquivel.

Os ex-presidentes Néstor e Cristina Kirchner, que promoveram os julgamentos por crimes da ditadura, também não foram unanimidade nas organizações humanitárias.

“Deve-se pensar que o governo anterior era menos ruim, que o atual é mais rápido, ou que ambos são péssimos?”, ironizou o coletivo HIJOS La Plata, crítico a ambas as gestões.

O secretário dos Direitos Humanos de Macri, Claudio Avruj, confirmou que não apelará mais das sentenças que concedem prisão domiciliar a criminosos da ditadura. O presidente da Suprema Corte de Justiça da Argentina, Ricardo Lorenzetti, prometeu que os julgamentos continuarão.