Policial

Falta de estrutura da PM deixa população no vácuo

Sem viaturas suficientes, polícia não consegue atender nem casos simples, como perturbação de sossego

Cascavel – A noite foi longa, mais uma vez, para quem mora perto da Praça da Bíblia, que liga as Avenidas Brasil, Assunção e Toledo, Centro de Cascavel. Tirando a bebedeira e a aglomeração no espaço público, o que não é proibido no Brasil, o problema é a perturbação do sossego, considerado crime, só que, em Cascavel, que passa batido aos olhos e ouvidos das forças de segurança.

Por volta das 2h, a reportagem do Jornal O Paraná/Hoje News divulgou em tempo real na sua fanpage a movimentação. O alto do 16º andar de um dos prédios vizinhos ao local, o som e a bagunça mostravam a gravidade da situação, que ocorre com bastante frequência.

Em Cascavel, inclusive, existe lei municipal que proíbe os chamados “bobódromos” em vias públicas, mas não há fiscalização.

Moradores acionaram duas vezes a Polícia Militar, que prometeu atender a ocorrência. Como isso não aconteceu, procuraram a Guarda Municipal de Cascavel. A própria atendente admitiu que de nada adiantaria pedir apoio da Polícia Militar, porque a corporação estava sem viaturas. Já a Guarda Municipal não teria “respaldo legal” para fazer a fiscalização.

“No fim das contas, uma viatura, que de cima não deu pra ver se era da Polícia ou da Guarda, veio atender a ocorrência, depois de muito tempo. Falou com algumas pessoas que estavam ingerindo bebida alcoólica e muitos saíram normalmente, dirigindo seus veículos”, conta o morador, que questiona: “Dirigir após beber não é crime?”

Pelas imagens divulgadas na fanpage dos jornais é possível ver uma aglomeração com cerca de mil pessoas e pelo menos uns 50 carros, inclusive motos desfilando e acelerando para aumentar o barulho.

E a Polícia?

Mas se conseguir atenção da Polícia Militar na madrugada de sexta para sábado é difícil, numa manhã de sábado então é impossível. A reportagem procurou várias e várias autoridades militares para que pudessem falar a respeito do ocorrido e por que esses casos não são coibidos. Não achou ninguém que pudesse dar explicações.

A reportagem ligou para o tenente Roberto Tavares, responsável pelo setor de Relações Públicas do 6º BPM (Batalhão de Polícia Militar). De férias, ele passou o contato da tenente substituta, que também não conseguiu informar o que ocorreu porque não estava de serviço. A reportagem entrou em contato, por telefone, com o coronel Rubens Garcez, comandante do Batalhão. O número de celular caía na caixa de mensagens, assim como o número do subcomandante, capitão Cícero Tenório. A reportagem tentou, inclusive, o telefone da assessoria do comando-geral da Polícia Militar do Paraná, que estava desligado.

Depois, ligou para o capitão Divonsir, responsável pelas viaturas do Batalhão. Em Foz do Iguaçu, ele não sabia informar o porquê da falta de atendimento, mas se comprometeu em buscar mais informações a respeito. O telefone fixo do 6º BPM ninguém atendia.

Emergência

Foi apenas ligando para o 190, número de emergência, que a reportagem conseguiu a seguinte resposta: “É sabido a falta de estrutura da Polícia Militar, e não só aqui. Devido a ocorrências que são prioritárias, muitas vezes não conseguimos atender casos de perturbação de sossego. Para esses, precisamos de pelo menos três pessoas diferentes ligando para ir até o local. Tenho certeza de que não houve negligência, porque já estou aqui há um ano. Se quem estava à noite não foi atender, é porque realmente não tinha como. Fazemos milagre com a estrutura que temos, muitas viaturas estão com pequenos problemas, mas não conseguimos encostar porque, se fizermos isso, como fica a população? Isso ocorre e não é só aqui”, disse o cabo que estava de serviço.

Segundo ele, foram atendidas 27 ocorrências pela Polícia Militar, mas o detalhamento delas só poderia ser feito na segunda-feira, quando o atendimento administrativo da PM “funciona”.

Representação

De acordo com a Polícia Militar, todo caso de perturbação de sossego que seja denunciado precisa de representação formal do denunciante. Porém, a “bagunça” generalizada ocorreu em praça pública e muitos estavam no local, bebendo e, depois, saiam dirigindo seus veículos.

De acordo com o comandante da Guarda Municipal de Cascavel, coronel Avelino Novakoski, o papel da Guarda, por exemplo, é apenas de orientar. “O que podemos fazer é ir até o local e orientar que as pessoas parem de fazer barulho, mas não temos como encaminhar alguém nesses casos”, lamenta.

Cadê o dinheiro que estava aqui?

O colunista Celso Nascimento, da Gazeta do Povo, também fala da falta de estrutura da Polícia Militar do Paraná. E traz dados interessantes. Segundo ele, desde 2016 a corporação tem avisado a Secretaria de Segurança Pública sobre problemas nos coletes balísticos, mas apenas mês passado uma licitação foi aberta para a renovação de equipamentos. Situação que põe em risco 6 mil policiais em todo o Estado.

O problema, além da má gestão, está na falta de compromisso na aplicação de recursos. Isso porque, até 2014 o governo destinava quase 72% das verbas à Polícia Militar. A partir do ano seguinte, essa porcentagem caiu para 49%. O orçamento da PM, que era de R$ 1,4 bilhão em 2015, foi reduzido para R$ 1,1 bilhão nos anos seguintes, revela Nascimento. Consequência: prejuízo na repressão ao crime e na proteção à sociedade; viaturas paradas por falta de manutenção ou de combustível, situação que muitas vezes a própria comunidade ajuda para que o serviço não fique tão prejudicado.