Cotidiano

Ex-diretor-geral da Câmara contradiz Cunha no STF

BRASÍLIA – O ex-diretor-geral da Câmara dos Deputados Sérgio Sampaio afirmou que o servidor Luiz Antônio Souza da Eira foi exonerado do posto que ocupava em razão da polêmica quanto à autoria de requerimentos apresentados em 2011 pela ex-deputada Solange Almeida. Essa é uma das bases da ação penal no Supremo Tribunal Federal (STF) que tem o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ) como réu. Ele nega ser o real autor dos requerimentos, como acusa o Ministério Público Federal (MPF).

Em abril do ano passado, quando houve a exoneração, Cunha negou que houvesse relação de uma coisa com a outra e disse que o afastamento se deu por questões administrativas, porque os servidores de informática trabalham menos que os demais.

Sampaio prestou depoimento como uma das testemunhas apontadas pelos advogados de Cunha. O ex-presidente da Câmara responde por lavagem de dinheiro e corrupção passiva numa ação penal aberta em razão da Operação Lava-Jato. Ele é acusado de ter recebido propina de lobistas de pelo menos US$ 5 milhões, oriunda de contrato de aquisição de navios-sonda pela Petrobras junto ao estaleiro sul-coreano Samsung.

Para isso, teria tido auxílio da ex-deputada e atual prefeita de Rio Bonito (RJ), Solange Almeida (PMDB-RJ), que também é ré na ação. Ela apresentou requerimentos na Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara, que teriam o objetivo de pressionar o pagamento de propina. Segundo o Ministério Público Federal (MPF), arquivos eletrônicos da Câmara mostram o deputado como verdadeiro autor dos documentos. O caso se tornou público em abril do ano passado.

– O então presidente Eduardo Cunha achou que ele teria tido alguma participação nesse episódio, fazendo algum tipo de denúncia contra ele, e achou por bem retirá-lo – disse Sampaio, que prestou depoimento na última quinta-feira.

Desde que o caso foi revelado, Cunha e seus advogados vêm apresentando algumas possibilidades sobre como o nome dele pode ter aparecido num requerimento de Solange. Dizem por exemplo que outros deputados pediam ajuda a seu gabinete. Afirmam também que um arquivo pode ser compartilhado entre servidores de gabinetes diferentes para servir de modelo. Nesse caso, permanece como autor do novo documento o nome que aparecia no arquivo original.

Ao longo da semana, alguns deputados arrolados como testemunhas de defesa prestaram depoimentos sobre o caso. Alguns disseram que a senha usada por eles não era repassada a nenhum servidor nem mesmo de seus gabinetes, mas não deram certeza de que outros deputados não faziam isso.

– A senha pessoal é minha. Essa eu não passo. A Câmara tem um formulário. A gente autoriza o servidor xis a receber a senha para ter acesso àquelas atividades da Casa – disse Pedro Chaves (PMDB-GO) na última terça-feira, acrescentando que a senha é pessoal e intransferível.

– Eu nunca precisei encaminhar nada por um terceiro, por outro gabinete que não fosse o meu ou, quando presidi as comissões, o corpo técnico das comissões – disse o deputado Saraiva Felipe (PMDB-MG).

Outros disseram que compartilham a senha com um assessor de sua confiança.

– Ela (assessora) não acessa. Ela tem a senha, mas não é normal ela acessar. Cada um tem a sua senha. Ela tem para eu não esquecer, porque muda com frequência – disse Flaviano Melo (PMDB-AC).

Flaviano também diz que é possível compartilharem arquivos para servir de modelo para outros requerimentos, mas disse não saber se isso ocorre.

– É possível sim porque muitos dos assessores dos gabinetes se conhecem. É possível. A gente não tem conhecimento, mas é possível – disse ele.

O deputado Fernando Jordão (PMDB-RJ) foi na mesma linha.

– Como modelo, pode tudo. Qual o problema você fazer uma minuta e o cara se basear numa minuta? Pode acontecer – afirmou Jordão.

Hugo Motta (PMDB-PB), aliado de Cunha, foi o mais enfático ao corroborar a versão do ex-presidente da Câmara.

– É comum sim, até porque você tem às vezes a similaridade de requerimentos apresentados. Eu posso dar o testemunho. Fui presidente da Comissão de Fiscalização Financeira e Controle. Presidi também a CPI da Petrobras. Eu dou conta às vezes em que pautava requerimentos similares. Então o assunto dos requerimentos podem coincidir ou ser conversado entre os parlamentares – disse Motta, concluindo: – O que fideliza o documento na Câmara na minha avaliação é a assinatura do parlamentar. A autenticação.

Por outro lado, ele disse que nunca compartilhou modelos com Cunha nem quis dizer o nome de deputados que fazem isso. Segundo ele, não seria bom expô-los.

– A prática parlamentar dele, pelo menos comigo, eu nunca fiz esse intercâmbio de requerimentos. Então eu não posso afirmar que seja uma prática do deputado – disse Motta.

Saraiva Felipe (PMDB-MG), por sua vez, desconhece a prática de compartilhar arquivos e modelos de requerimentos entre os deputados.

– Nunca pensei nisso, porque nunca aconteceu no meu gabinete. Tenho 22 anos de mandato. Eu vou dizer que isso seria inusual – disse Saraiva Felipe.