Cotidiano

Especialistas temem que Trump passe a produzir dados econômicos adulterados

NOVA YORK – Alguns estatísticos temem que o governo do presidente americano Donald Trump, crítico do que ele chama de ?notícias falsas? passe a produzir dados econômicos adulterados. Apesar de existirem diretrizes governamentais para evitar que isso aconteça, os profissionais que lidam com números temem que os comentários ocasionalmente arrogantes do presidente sobre a economia e as estatísticas econômicas, e seu aparente desdém pelos economistas de uma forma geral, possam gerar problemas no futuro.

Mark Thoma, professor da Universidade de Oregon, disse temer que a defesa de ?fatos alternativos? pelo governo Trump possa se espalhar para os dados econômicos, caso a economia americana venha ter problemas.

?A pior coisa que ele poderia fazer ? e eu encaro isso como um perigo real ? seria politizar as agências que produzem dados econômicos do governo e colocar nelas pessoas para inclinar os números a seu favor?, disse Thoma, em comentário de 24 de janeiro para o site CBS MoneyWatch. ?Se isso acontecer, os dados serão inúteis e estaremos essencialmente às cegas no que diz respeito ao verdadeiro estado da economia.?

Há regras que ?protegem as estatísticas de manipulação direta, mas que não eliminam todas as minhas preocupações em relação à sua independência?, escreveu Brent Moulton, que se aposentou em dezembro do ano passado, após 32 anos de trabalho no Escritório de Estatísticas de Trabalho e no Escritório de Análises Econômicas do Departamento do Comércio, em postagem em seu blog, em janeiro.

?Por exemplo, um secretário do Gabinete poderia até pedir que a agência de estatísticas cancele certas estatísticas ou altere as metodologias para que pareçam politicamente oportunas?, acrescentou no texto, intitulado ?Porque estou preocupado com a independência das agências de estatísticas dos EUA?.

Em um possível sinal de que isso já está ocorrendo, o ?Wall Street Journal? publicou no domingo que o governo Trump está estudando mudanças que fariam o déficit comercial dos EUA parecer muito maior do que o divulgado atualmente. Citando pessoas não identificadas envolvidas nas discussões, o jornal afirmou que os novos cálculos poderiam ser apresentados ao Congresso, mas que não estava claro se seriam incluídos nas informações oficiais do governo sobre a economia.

Um mês após o início de sua presidência, Trump ainda não nomeou ninguém para o Conselho de Assessores Econômicos, criado em 1946 para oferecer análises e conselhos econômicos objetivos aos presidentes. De fato, os membros do conselho reclamam que a Casa Branca parece estar dando pouca atenção aos relatórios regulares produzidos por eles sobre a economia, disse à ?Bloomberg? uma fonte anônima.

Trump acusou repetidas vezes os governos anteriores de não protegerem os interesses dos EUA sob o ponto de vista do comércio exterior. Números que mostram déficits maiores serviriam para reforçar esse argumento e apoiar a ideia do presidente de adotar uma medida retaliatória contra a China e outros parceiros comerciais dos EUA.

Os temores em relação à manipulação de dados surgem também da abordagem nada tradicional usada pelo governo Trump para a interpretação dos dados econômicos. O próprio presidente afirmou diversas vezes que o índice de desemprego ?real? está bastante acima da taxa oficial, usando números que incorporam todas as pessoas em idade ativa que não estão empregadas.

?Não acreditem nesses números falsos?, disse Trump a seus apoiadores a respeito do índice de desemprego, no início de 2016. ?O número é provavelmente de 28, 29 ou até 35%. Na verdade, eu cheguei até a escutar recentemente que é de 42%.?

Embora esses percentuais capturem uma faixa mais ampla da população que não trabalha do que o índice de desemprego mais conhecido dos EUA, de 4,8%, os números são enganosos porque incluem aqueles que escolhem ficar de fora do mercado de trabalho para estudar, ter filhos, cuidar de integrantes da família ou por aposentadoria. Em 2015, Trump disse que havia 93 milhões de pessoas sem trabalho nos EUA.