Cotidiano

Entidade de lobistas defende sigilo de dados em caso de cadastro de profissionais

BRASÍLIA – A principal entidade de lobistas no país defende o sigilo de dados dos profissionais em caso de regulamentação do lobby e credenciamento dos agentes que buscarem defender seus interesses junto ao governo. Em documento enviado ao Ministério da Transparência, que criou um grupo de trabalho para propor a regulamentação do lobby, a Associação Brasileira de Relações Institucionais e Governamentais (Abrig) sugere que um eventual cadastro “não divulgue amplamente dados individuais dos profissionais e das empresas e entidades que representam”.

A pasta planejou dois dias de audiência, hoje e amanhã, para discutir a proposta de tirar lobistas das sombras e tornar a atividade legal. A reunião aberta nesta segunda deveria durar quatro horas e a de amanhã, mais quatro horas. A audiência nesta tarde durou apenas uma hora, com poucas pessoas presentes. A de amanhã foi cancelada por falta de propostas.

Representantes de apenas cinco entidades compareceram ao auditório do ministério: Centro de Estudos das Sociedades de Advogados (Cesa), Associação Brasileira de Agências de Comunicação (Abracom), Associação Brasileira das Vítimas de Aviação Geral e Experimental (Abravagex), Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social e Associação Nacional dos Fabricantes dos Veículos Automotores (Anfavea). As quatro primeiras formalizaram sugestões à pasta. Os representantes da Abrig não compareceram e enviaram os memoriais por e-mail ao grupo de trabalho criado.

O relatório elaborado pelo grupo do ministério, base das discussões sobre a regulamentação do lobby, sustenta que a prática é legítima, desde que exercida “dentro da estrita legalidade”, e prevê o credenciamento de lobistas, de forma que fique claro para qual empresa ou entidade o profissional atua. Em entrevista ao GLOBO publicada no último dia 30, o ministro Torquato Jardim defendeu a criação de uma central de audiências em cada ministério e estatal.

? O que ouço de conhecidos que estão neste ambiente ? afinal são 40 anos no mercado de advocacia em Brasília ? é que os mais conceituados querem (a regulamentação). Eles podem mostrar a cara, eles têm procuração, eles têm representação. A sombra, essa sempre vai haver. Marquesa de Pompadour sempre vai existir. Sempre haverá o rei encantado com alguma cortesã. Isso é da natureza humana ? disse o ministro na entrevista.

No documento encaminhado ao ministério, assinado pelo presidente da entidade, Guilherme Cunha Costa, a Abrig argumenta que a criação de um cadastro de lobistas deve omitir do público dados como números de telefone e de inscrições em cadastros fiscais, além de endereços físicos e eletrônicos. “Tais dados podem ser mantidos pelo ministério centralizador, mas não precisam ser divulgados abertamente para toda a sociedade brasileira, sob pena de expor os profissionais ou seus clientes a constrangimentos, ameaças, litígios, etc.”, diz o memorial.

A Abrig defende que um cadastro fique centralizado no Ministério da Transparência ou no Ministério da Justiça, “evitando eventuais preconceitos de autoridades e de servidores que ainda podem existir em pastas menos envolvidas na discussão do tema”. A criação de um cadastro tem aspectos positivos e negativos, conforme a Abrig. O positivo é facilitar a interlocução e o negativo é que pode ser visto como uma “burocracia” e uma “reserva de mercado”, conforme a associação. A entidade também quer o fim das expressões “lobista” e “lobby” e a substituição por “relações institucionais e governamentais”.

A ideia da Abrig sobre o cadastro não encontra ressonância, por exemplo, no memorial do Instituto Ethos. “Todos os registros de credenciamento e de solicitações de audiência devem estar disponíveis, incluindo a lista de credenciados, entidades e interesses a serem defendidos”, diz o documento enviado ao ministério pelo diretor-presidente do instituto, Jorge Abrahão. “O credenciamento é uma etapa fundamental no processo e é importante que seja bem descrito e não impeditivo, permanecendo disponível a qualquer cidadão.”

Segundo o ministro da Transparência, a regulamentação do lobby no Executivo poderá ser feita por meio de decreto presidencial. Na mesma semana em que a pasta deu publicidade ao relatório do grupo de trabalho criado pelo ministro, o senador Romero Jucá (PMDB-RR) apresentou proposta de Emenda à Constituição que regula a atividade lobista. Quase 30 senadores subscrevem a PEC. Torquato não se opõe à iniciativa.