RIO ? Quando tinha 16 anos, Danilo Caymmi, munido de sua flauta e um fichário de química (ele estava em prova final na matéria), entrou num estúdio para fazer sua estreia em disco, ao lado de dois dos maiores compositores da música popular brasileira. O álbum era o hoje antológico ?Caymmi visita Tom ? E leva seus filhos Nana, Dori e Danilo? (1964). De 1983 a 1994, ano de morte de Tom Jobim, Danilo integrou a Banda Nova, grupo que acompanhava o autor de ?Águas de março? em turnês pelo mundo. No mês em que o maestro completaria 90 anos, o cantor e flautista lança ?Danilo Caymmi canta Tom Jobim?, no qual interpreta 11 músicas do amigo, compadre e mestre. Links – Danilo Caymmi – Tom Jobim
? Fui cobrado bastante para fazer um disco com canções dele. Afinal, foi ele quem me descobriu como cantor. Mas o repertório do Tom é tão importante para mim que eu precisava me sentir bem para gravá-lo. E finalmente senti que a hora era essa ? afirma Danilo, sentado numa poltrona de seu apartamento, em Copacabana.
O repertório do álbum, disponível em CD (Universal) e nas plataformas digitais, traz apenas um standard jobiniano: ?Água de beber?.
? Eu escolhi tudo com um critério bastante afetivo. Saí de tudo que é hit, fugi das obviedades. ?Por causa de você? (Tom Jobim/Dolores Duran), por exemplo, era uma música que eu adorava quando pequeno, que minha mãe cantava em casa. Já ?Querida?, que ele fez quando estava doente, fala de finitude. Eu mexi nela, tirei o foxtrote e foquei na letra. Mergulhei de cabeça nas canções ? diz.
PARTICIPAçÃO DE STACEY KENT
Esse mergulho resultou num disco enxuto e delicado, no qual o barítono utiliza apenas sua voz e sua flauta, acompanhado pelo violão do maestro Flávio Mendes, que assina a produção, e do violoncelo pontual de Hugo Pilger.
? O minimalismo me atraiu muito nesse projeto. Naturalmente ficou sem piano e sem ritmo. Acho que foi através do inconsciente, talvez pelo meu gosto por fotografia minimalista, que o disco saiu com essa estética ? reflete Danilo.
A única música do repertório não selecionada pelo músico foi ?Estrada do sol?, outra composição assinada por Jobim e Dolores Duran, escolhida pela americana Stacey Kent, que participa num surpreendente dueto em português.
? Mandei o tape com minha voz, e ela gravou de lá, com a respiração batendo com a minha. Foi um dengozinho ter a Stacey no meu disco. É uma cantora que toca todo domingo em meu Spotify.
Outras surpresas colhidas do cancioneiro de Jobim foram ?Bonita? e ?As praias desertas?.
? Essa é a segunda gravação de ?Bonita? com a letra em português, encontrada no acervo de Vinicius de Moraes. A primeira foi do Daniel Jobim (neto de Tom). Já ?As praias desertas? tem uma grande proximidade com as canções praieiras do papai, aquele olhar 360º do mar. É o Caymmi que há nesse disco ? comenta Danilo, cujo último álbum, ?Don don? (2015), ao lado de Bruno Di Lullo e Domenico Lancellotti, é composto apenas por músicas de Dorival.
A proximidade das famílias Jobim e Caymmi reflete na intimidade com que Danilo aborda obras como ?Luiza? e ?Derradeira primavera?.
? Frequentei a casa do Tom desde moleque. Eu, o Paulinho (filho de Jobim) e o agora imortal Geraldo Carneiro costumávamos passar a madrugada ouvindo Jimi Hendrix e Led Zeppelin, e entornando todo o uísque do Tom, é claro ? conta Danilo. ? Mas é uma relação antiga. Tom e papai eram amigos e confidentes.
Antes de colocar o disco na rua, o músico procurou apenas uma opinião: a de sua família.
? Quando fiz uma audição aqui em casa, a Nana (Caymmi, sua irmã) chorou. Só aí eu pensei: ?Acho que o CD está legal.?
