Cotidiano

Eike Batista: de bilionário a réu em ações por crimes financeiros

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RIO – Alvo de mandado de prisão preventiva na Operação Eficiência realizada nesta quinta-feira no Rio de Janeiro, o empresário Eike Batista é suspeito de pagar propina e participar de esquema de desvio de dinheiro público na gestão do ex-governador Sérgio Cabral. Policiais Federais foram à casa de Eike no Jardim Botânico, no Rio de Janeiro, mas o advogado do empresário informou que ele está viajando e vai se apresentar quando voltar. O empresário também é réu em duas ações penais, acusado de ter cometido crimes de manipulação de mercado e uso de informação privilegiada (insider trading).

Menos de dez anos antes, era difícil prever que o empresário tido como um prodígio nos negócios ? que construiu companhias em áreas como energia, indústria naval, mineração, turismo e gastronomia ? fosse ver seu império ruir. Em junho de 2008, foi destaque na reportagem ?Gás na Bolsa e R$ 24 bi no bolso?, que noticiava a estreia da OGX, petroleira de Eike, na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), em junho de 2008. Na maior oferta pública inicial (IPO, na sigla em inglês) realizada no país até então, a empresa captou R$ 6,7 bilhões. Era a coroação de uma trajetória de pesados investimentos capitaneados pelo empresário. Em novembro de 2007, a OGX foi responsável por 74% do total arrecadado pelo governo na 9ª Rodada de leilões da Agência Nacional do Petróleo (ANP), arrematando 21 blocos.

SUCESSO COMEÇOU NA PÁGINA DE ESPORTES

Em O GLOBO, a história de Eike ganhou luzes nas páginas de Esportes. Ele colecionou vitórias em competições náuticas de Offshore, ainda no início dos anos 1990. Mais adiante, era descrito em suas empreitadas como filho de Eliezer Batista, ex-presidente da Vale e ex-ministro de Minas e Energia. E, com maior destaque, ?marido de Luma? (de Oliveira, a ex-modelo), como ele mesmo gostava de se apresentar. Supersticioso, conferia ao uso do ?X? no nome de suas empresas a capacidade de multiplicar riqueza. Em reportagem de dezembro de 2011, dizia ?Deus pôs o item ?saber fazer dinheiro? no meu pote?. Ele chegou a figurar como maior fortuna do Brasil e sétima maior no mundo, segundo ranking da revista ?Forbes?.

Operação Eficiência

O império ?X? foi desenhado para ser integrado. Quando buscava investidores para os projetos de suas empresas, estes eram vendidos como um pacote completo. Se a estratégia fosse bem-sucedida, o empresário certamente galgaria mais alguns degraus na lista da revista americana. Nos tempos de bonança, ele costumava dizer: ?Meu objetivo é passar Bill Gates?, que ocupava o topo do ranking dos mais ricos do mundo. Por outro lado, qualquer problema em uma das empresas do grupo arrastaria as demais, num efeito dominó que poderia comprometer todos os negócios.

Foi o que acabou acontecendo. Hoje, das cinco principais empresas do grupo, duas tiveram seu controle vendido a estrangeiras ? a ex-LLX (logística) e a ex-MPX (energia) ? e três estão em recuperação judicial: a ex-OGX (atual OGPar, de petróleo e gás), MMX Sudeste (braço da companhia de mineração de Eike) e OSX (setor naval). Negócios em outras áreas, como o Hotel Glória e a Marina da Glória, também mudaram de mãos. O hotel, vendido ao fundo suíço Acron em fevereiro de 2014, voltou a contar com o empresário entre os sócios em novembro último. As obras, contudo, que deveriam ser retomadas a tempo de terminar parte do hotel para os Jogos 2016, continuam paradas. Outros projetos que o empresário bancava no Rio, como apoio a UPPs e à despoluição da Lagoa Rodrigo de Freitas, foram encerrados.

Mesmo quando a desvalorização das ações de suas empresas já era acentuada, Eike não dava o braço a torcer. Em entrevista ao GLOBO publicada em agosto de 2011, falou a célebre frase ?Meus ativos são à prova de idiotas?. Perguntado na mesma ocasião se temia ser rebaixado na lista da ?Forbes?, respondeu: ?Não, porque todo mundo vai baixar junto, né? Quando a maré baixa, mademoiselle, os barcos bonitos, os iates de alto luxo e as canoas baixam?.

APÓS A RECUPERAÇAO JUDICIAL, SILÊNCIO

E a maré virou. Mais precisamente em junho de 2012, quando a OGX revisou a produção do campo Tubarão Azul, na Bacia de Campos, para um quarto do previsto. O campo era a grande aposta da companhia. As ações da petrolífera desceram ladeira abaixo e mergulharam as demais empresas numa profunda crise de confiança, que culminou com o pedido de recuperação judicial da OGX, em outubro de 2013, o maior da América Latina. O pedido das outras duas empresas ? OSX e MMX Sudeste ? foi questão de tempo.

Após a revisão das estimativas, Eike se calou. Mas continuou a escrever em seu perfil no Twitter. Algumas dessas mensagens, que pediam ?paciência? aos investidores para enfrentar a crise, foram postadas nos mesmos dias em que o empresário vendia ações da ex-OGX na Bolsa, como revelou o GLOBO em dezembro de 2013. Ao usar canais extraoficiais para falar sobre seus negócios, Eike violou a Lei das Sociedades Anônimas.

Eike Batista e o Império X

A reportagem deu munição a queixas de pequenos investidores, que se sentiram lesados com o comportamento do empresário, e embasou investigação da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Em março deste ano, o órgão que funciona como o xerife do mercado financeiro multou Eike em R$ 1,4 milhão por irregularidades em quatro processos relacionados às companhias OGX (atual OGPar), LLX (hoje Prumo), MPX (agora Eneva) e CCX. Em setembro de 2014, Eike foi alvo de três denúncias oferecidas pelo Ministério Público do Rio de Janeiro (MPF-RJ) e de São Paulo. Duas delas já resultaram em ação penal.

Logo após se tornar réu no processo, o ex-bilionário quebrou o silêncio que durava quase um ano e concedeu algumas entrevistas. Ao GLOBO, disse: ?Botei do bolso. Levaram todo o meu patrimônio?. E argumentou ter patrimônio negativo de US$ 1 bilhão. Afirmou ainda ter sido ?criado como um jovem de classe média?, quando perguntado sobre o arresto de seus bens determinado em maio de 2014.

O aperto no patrimônio se agravou. Em fevereiro de 2016, a Justiça determinou bloqueio de R$ 1,5 bilhão de Eike e familiares. A Polícia Federal realizou operações de busca e apreensão na casa do empresário, onde reteve bens como um piano, uma réplica de ovo Fabergé e seis veículos, incluindo o Lamborghini Aventador que decorava a sala de estar da casa do criador do grupo ?X?, no Jardim Botânico. Houve também apreensões na casa do empresário de Angra dos Reis e na casa de Luma de Oliveira. Os policiais bateram à porta da ex-modelo às 7h30m da manhã. O GLOBO acompanhou a operação. ?Quanta bobagem, né? Fica calma?, sussurrou Eike num longo abraço com Luma, de acordo com uma testemunha. O empresário chegou à casa da ex-mulher dez minutos após a entrada da Polícia Federal. Três carros foram apreendidos.

Eike Batista, um empresário sob os holofotes

Com o episódio do juiz ao volante do Porsche, o magistrado acabou afastado do caso, por decisão da Corregedoria Nacional de Justiça e também do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF) votando a favor do pedido de afastamento de Flávio Roberto de Souza, apresentado pela defesa do empresário no fim de 2014. Os advogados de Eike argumentavam que o juiz perdera a imparcialidade na condução do caso.

Na Operação Eficiência, as investigações apontam o pagamento de uma propina de US$ 16,5 milho?es ao ex-governador por Eike Batista e Fla?vio Godinho, do grupo EBX, usando a conta Golden Rock no TAG Bank, no Panama?. Esse valor foi solicitado por Se?rgio Cabral a Eike Batista no ano de 2010, para dar apare?ncia de legalidade a? operac?a?o foi realizado em 2011 um contrato de fachada entre a empresa Centennial Asset Mining Fuind Llc, holding de Batista, e a empresa Arcadia Associados, por uma falsa intermediac?a?o na compra e venda de uma mina de ouro. A Arcadia recebeu os valores ili?citos numa conta no Uruguai, em nome de terceiros mas a? disposic?a?o de Se?rgio Cabral, de acordo com o MPF.

Eike Batista, Godinho e Cabral tambe?m sa?o suspeitos de terem cometido atos de obstruc?a?o da investigac?a?o, porque numa busca e apreensa?o em enderec?o vinculado a Batista em 2015 foram apreendidos extratos que comprovavam a transfere?ncia dos valores ili?citos da conta Golden Rock para a empresa Arca?dia. Na oportunidade os tre?s investigados orientaram os donos da Arcadia a manterem perante as autoridades a versa?o de que o contrato de intermediac?a?o seria verdadeiro.