Cotidiano

Dima Alardah, arquiteta e ex-atleta: 'O esporte não é aceitável para as mulheres na Síria'

“Tenho 29 anos e nasci em Amã, na Jordânia. Fui jogadora profissional de badminton por mais de dez anos. Tentei participar dos Jogos Olímpicos de Londres, em 2012, mas não consegui patrocínio para as competições preliminares. Agora, sou treinadora de um time de refugiados sírios em meu país.”

Conte algo que não sei.

Há cerca de 1,5 milhão de sírios na Jordânia, o que equivale a um em cada seis habitantes do país. Desses, 25% vivem em campos de refugiados. A população acha que não precisa interagir com eles, porque já estão isolados. Mas os outros ficam nas cidades, fazem parte da sociedade. Em geral, são bem-vindos, à exceção do Norte, mais perto da Síria e com uma infraestrutura precária, onde os moradores não querem dividi-la com estrangeiros. Mas os jordanianos estão acostumados a ajudar povos envolvidos com crises humanitárias. Recebemos palestinos, depois iraquianos. Somos maduros e devemos impedir uma onda de ódio.

Como você descobriu o badminton?

Quando tinha 17 anos, era atleta e adorava praticar esportes na escola. Meu professor perguntou se eu gostaria de tentar badminton. Recusei, porque, além de não ser um jogo popular, é considerado muito fácil, algo que só se joga quando se está entediado, e eu sou muito competitiva. Mas acabei me apaixonando pelo esporte e, dois anos depois, já estava na seleção nacional.

Você é arquiteta e, ainda assim, continuou jogando badminton profissionalmente?

Aos 24 anos, em 2010, já trabalhava há dois anos como arquiteta, mas resolvi largar o escritório e tentar uma vaga nos Jogos Olímpicos de Londres. Bati em muitas portas para tentar patrocinadores, mas ninguém me respondeu. Resolvi, então, viajar sozinha. Precisava participar do maior número possível de partidas para acumular pontos no ranking mundial. Passei por mais de 20 países, mas meu dinheiro acabou e fui obrigada a voltar para casa.

Procurou o governo?

Sim, e não consegui verba, mas não o culpo. A Jordânia é um país pobre e quase não há recursos para esportes. É natural que prefiram esportes coletivos, como futebol e basquete, que são mais populares. Ficou claro como as pessoas não conhecem o badminton. Então, senti-me na obrigação de mostrar como é o jogo.

E como você pode cumprir esta função no Conselho Norueguês para Refugiados (NRC)?

Entrei no NRC em janeiro de 2014, quando soube que precisavam de profissionais esportivos para trabalhar com jovens em campos de refugiados sírios na Jordânia. Fui para Zaatari, um dos maiores do mundo, com 80 mil pessoas. Meu trabalho era complementar ao de outras funções que a comunidade aprende e que podem ser úteis, como técnica em computador. Mas ficou claro como existe uma ligação entre educação e esporte.

Você se tornou mais conhecida pelo trabalho com as mulheres. O desafio é maior?

Os sírios são um povo conservador. Eles acreditam que a mulher deve ficar em casa, cuidando dos filhos. O esporte não é culturalmente aceitável para elas. Naquele campo, todos se conhecem, então foi ainda mais difícil convencê-las a participar de alguma atividade. Tivemos de construir locais fechados e seguros. Mas vejo como ficam felizes em participar. Tirá-las de casa já é uma vitória.

Você não pensou em competir nos Jogos do Rio?

Não, chegou a hora de parar. Ganhei tudo que podia.

E algum medalhista de ouro virá do campo de refugiados?

Acho que pode demorar (risos). A Jordânia acabou de ganhar a primeira medalha de ouro, e foi em taekwondo. Ainda não temos tradição olímpica.