Cotidiano

Derrota em Berlim dificulta cenário para Angela Merkel

2016 939688399-201609181602354773_AP.jpg_20160918.jpgBERLIM ? A quarta derrota consecutiva da União Democrata Cristã (CDU) nas eleições regionais alemãs, com seu pior resultado já registrado na cidade-estado de Berlim, aumentou neste domingo ainda mais a pressão sobre a chanceler federal Angela Merkel, criticada por sua política de acolhimento a refugiados. O resultado deve não só tirar a CDU do governo local, mas ter reflexos nas eleições nacionais do próximo ano.

Se a CDU recuou, o partido de extrema-direita AfD (Alternativa para a Alemanha) avançou: com apenas três anos, a legenda, que já participa do Parlamento Europeu, conseguiu ontem entrar para a 10ª das 16 assembleias estaduais alemãs.

A um ano das eleições federais de setembro de 2017, a tradicional CDU, que acaba de completar 70 anos, passa por uma forte crise chamada pelo cientista político Karl-Rudolf Korte de ?Merkel-Malus? (mal de Merkel). A abertura dos portões para mais de um milhão de refugiados só no ano passado, deu à chanceler a admiração internacional, mas fez com que perdesse, gradualmente, a apoio do próprio partido. Mais de 50% membros da legenda são contra essa política.

? Os eleitores não se sentem mais representados pelos partidos do governo e por isso migram para a AfD, que é (uma espécie de) movimento dos indignados ? diz Korte.

De acordo com resultados parciais, o partido de Merkel obteve 17,6% dos votos em Berlim, o que não seria suficiente para continuar no governo com os sociais-democratas. É mais provável que o SPD, de centro-esquerda, que conquistou 21,5%, forme o novo governo com os Verdes e com A Esquerda, cada um com cerca de 15%.

A AfD, por sua vez, obteve 14,1%. Jörg Meuthen, vice-presidente da legenda, disse que o partido faz sucesso porque ?leva a sério as preocupações reais do povo?. A ?alternativa?, fundada em 2013, no auge da crise da Grécia e para combater o euro, vai tentar conseguir impor a sua assinatura nas políticas de dez estados, e, a partir do próximo ano, no plano federal, tendo como enfoque central a politica de segurança interna e um programa para repatriar os refugiados.

A CDU governa hoje apenas seis dos 16 estados alemães, sendo que somente em três ? Hesse, Sarre e Saxônia ? é o maior partido e, por isso, indica o governador. Nos outros três, é aliado minoritário.

Merkel é ameaçada também pelo chamado ?fogo amigo?. Horst Seehofer, governador da Baviera e presidente do partido irmão União Social Cristã (CSU), que existe apenas na Baviera, onde a CDU não está presente, voltou a atacar a chanceler esta semana, em entrevista à revista “Der Spiegel”. Segundo ele, a CSU não estaria mais disposta a apoiar a CDU caso Merkel continue se recusando a rever a politica para refugiados, que teria causado problemas de longo prazo para a Alemanha. Ele exige que o governo admita os erros e confirme estar disposto a corrigi-los.

Berlim, há cinco anos governada por uma ?grande coalizão? dos social-democratas (SPD) com a CDU, mostrou como o modelo está desgastado, dizem analistas. Juntos, os dois partidos perderam mais de dez pontos percentuais. Muitos descontentes votaram na AfD ou simplesmente não votaram, pois a participação não é obrigatória. Nem o cenário sombrio traçado pelo prefeito social democrata Michael Müller foi bastante para frear a AfD.

No Facebook, Müller comparou a ascensão do partido de extrema-direita com um ?ressurgimento dos nazistas?, com os quais não quer cooperar, mesmo no parlamento da cidade. ?Berlim, que já foi a capital de Hitler e da Alemanha nazista, vai continuar sendo uma cidade multicultural e tolerante?, afirmou o prefeito.

O SPD perdeu quase seis pontos, mas como o partido mais votado tem direito de liderar as negociações para uma nova coalizão. De acordo com um porta-voz da legenda, o modelo mais provável será uma aliança com os ex-comunistas da Esquerda e com os verdes, chamada de aliança ?rot-rot-grün? (coalizão vermelha-vermelha-verde).

? Esse modelo é uma opção para o governo alemão no próximo ano. Depois das mudanças no espectro partidário da direita, também a esquerda começa a se reorganizar e adota opções que antigamente recusava ? diz Korte.

A recusa do ex-chanceler social-democrata Gerhard Schröder em aceitar o apoio dos ex-comunistas tornou possível a ascensão de Merkel em 2005. Quase empatados, Schröder preferiu uma aliança com o adversário, a CDU de Merkel, e deixar o governo, em vez de aceitar a aliança projetada agora pelo prefeito de Berlim. Desde então, Merkel conseguiu ser sempre reeleita porque o SPD recusava uma aliança de esquerda.