Policial

Decreto tenta aumentar presos empregados

Hoje há 1,3 mil egressos cadastrados no Patronato de Cascavel e 80% deles não têm carteira assinada

Cascavel – Aos 39 anos, o auxiliar de produção foi preso por tráfico de drogas e ficou na cadeia por três anos. Usou tornozeleira eletrônica por mais um ano e, nesse período, desempregado, viveu da doação de cestas básicas. “Não conseguia nem ‘bico’. O crime teve repercussão na minha comunidade e dificultou uma oportunidade. Além da ficha criminal, outras coisas pesam, como marcas físicas que foram necessárias para eu ser aceito dentro da carceragem e que depois me excluíram da sociedade. Faço um trabalho de catador de frangos, informal, e que é instável financeiramente”, conta. O ex-presidiário revela que, apesar da intenção de ter uma vida digna, encontra dificuldades para isso.

Na região de Cascavel, são aproximadamente 1.300 egressos do sistema penal cadastrados no Patronato, setor do Depen (Departamento Penitenciário) que faz o acompanhamento desses e dos que ainda cumprem pena em regime aberto temporário. Pela dificuldade em conseguir emprego formal, 80% deles se viram como podem. “Cerca de 10% ainda busca emprego formal, mas sobrevive de atividade autônoma”, explica o diretor do Patronato, Ari Batista.

Os egressos cadastrados passam por avaliação constante com psicólogos, assistentes sociais e pedagogos. “Fizemos uma parceria com a Prefeitura de Cascavel, por exemplo, e com a Agência do Trabalhador. Algumas empresas que ganharam licitações recentes estão contratando egressos do sistema, que são acompanhados por nós. E já temos empresas parceiras. Como já fazemos um trabalho, o decreto vem reforçar ainda mais a realocação desses ex-detentos na sociedade”, afirma o diretor do Patronato, referindo-se ao decreto assinado essa semana pela presidente interina Cármen Lúcia que instituiu a Política Nacional de Trabalho no Sistema Prisional, medida voltada à ampliação de oferta de vagas de trabalho a pessoas presas e egressas do sistema prisional.

O Decreto 9.450, de 24 de julho de 2018, determina que, na contratação de serviços, inclusive os de engenharia, com valor anual acima de R$ 330 mil, a administração pública direta deve exigir da empresa contratada que ela tenha no seu quadro de pessoal pessoas presas ou egressas do sistema prisional.

De acordo com o Depen, em todas as unidades penais do Paraná há canteiros de trabalho. Atualmente, 30% dos presos do Paraná trabalham, o que equivale a 6 mil dos 20 mil detidos no sistema prisional do Paraná.

Segundo o departamento, já são 98 empresas conveniadas com o Estado que possuem canteiro de trabalho em unidades prisionais e que empregam esse tipo de mão de obra.

Trabalho por remissão, mas sem especialização

Tanto o trabalho quanto o estudo dentro da cadeia garantem remissão da pena. Dos detentos do Paraná, 44% estudam. No caso do trabalho, a cada três dias trabalhados um dia da pena é reduzido. No caso do estudo, a cada 12 horas de ensino é reduzido um dia de pena.

Apesar dessa oportunidade, para a Comissão de Direitos Humanos da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) em Cascavel, o grande problema é que as penitenciárias públicas mantêm como foco o trabalho manual e os detentos não têm capacitação para áreas como a de tecnologia, por exemplo. “É o que fora da cadeia faz diferença, mas não há esse acesso. A intenção do trabalho e do estudo que hoje existe é boa. Porém, isso é feito pelo benefício da remissão de pena. Espera-se que esses detentos façam trabalhos manuais. Mas eles não têm acesso à informação, ficam desatualizados e, depois que saem da cadeia, passam dificuldades para encontrar emprego, assim como a maioria das pessoas, pela própria falta de vagas”, avalia o presidente da Comissão em Cascavel, Marcelo Navarro.

Como ainda a maior parte da população carcerária tem baixa escolaridade, a falta de acesso à educação dificulta a sonhada ressocialização. “Em algumas penitenciárias é feito esse trabalho, mas são poucos os presos que podem trabalhar e estudar. Sem capacitação para uma profissão rentável, eles saem da cadeia mas acabam se convencendo de que traficar, por exemplo, dá mais dinheiro. E também há aqueles que realmente querem trabalhar, mas ninguém dá emprego”, lamenta.