Cotidiano

Decisão do Supremo que afeta Renan pode ser adiada

BRASÍLIA ? Marcado para quinta-feira, o julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) que definirá se réus podem ocupar a presidência da Câmara ou do Senado pode ter a conclusão adiada. Ao menos dois dos onze ministros da Corte não estarão em Brasília. As ausências não impedem que o tribunal tome a decisão, mas é possível que a presidente, ministra Cármen Lúcia, queira aguardar o voto dos colegas, diante da importância do assunto. De qualquer forma, a votação vai começar com o posicionamento do relator, ministro Marco Aurélio Mello. No tribunal, há ministros interessados em costurar uma alternativa para que o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), permaneça no cargo, mesmo sendo transformado em réu.

Embora a presidente do STF não esteja disposta a adiar o início do julgamento, há grande chance de um dos ministros presentes pedir vista, deixando a conclusão do caso para o futuro. Estarão ausentes na quinta-feira os ministros Luís Roberto Barroso e Gilmar Mendes.

Segundo a Constituição Federal, na ausência temporária do presidente da República, ele deve ser substituído pelo vice. Na sequência, a linha sucessória é composta pelos presidentes da Câmara, do Senado e do STF. A Constituição também estabelece que, se for alvo de ação penal, o próprio presidente da República não pode continuar o cargo. Por analogia, o mesmo entendimento deveria ser aplicado a seus substitutos. Na ação que será julgada pelo STF, o partido Rede Sustentabilidade pede o afastamento do cargo de quem estiver na linha sucessória e for transformado em réu.

Alguns ministros do STF querem uma solução intermediária ? que, na prática, aliviaria a situação de Renan. A alternativa seria deixá-lo no cargo, mas impedi-lo de ocupar a presidência da República em caso de ausência do presidente Michel Temer. Dessa forma, o sucessor seria o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e, na sequência, Cármen Lúcia. Existem ao menos dois adeptos da tese na corte.

Por outro lado, ao menos outros dois ministros consideram essa possibilidade absurda. Para eles, não se pode pular um cargo na linha sucessória, já que a sequência foi definida pela Constituição Federal. Para esses ministros, o correto seria retirar o réu do cargo que ocupa, para que outra pessoa possa figurar na lista de substitutos do presidente da República. Os ministros ouvidos pelo GLOBO consideram que, se uma pessoa não tem idoneidade para ocupar a principal cadeira do Palácio do Planalto, também não poderia chefiar uma das casas legislativas.

A ação da Rede foi apresentada ao STF em maio, logo depois que o tribunal transformou em réu o então presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), hoje cassado e preso na Lava-Jato. Se o STF impedir réus de integrar a linha sucessória, a regra pode vir a ser aplicada a Renan. Ele ainda não é réu em ação penal, embora responda a onze inquéritos no STF. O senador já foi denunciado em um dos inquéritos, que foi liberado para a pauta de julgamentos da corte. A data ainda não foi marcada. Se o plenário concordar com a denúncia, Renan será transformado em réu em uma ação penal.

Se for aprovada, para a nova regra ser aplicada a Renan, o julgamento da denúncia precisa acontecer antes de fevereiro de 2017, quando termina o mandato dele na presidência do Senado. Depois disso, ele já não estará mesmo incluído na linha sucessória. Ministros do STF acreditam que Cármen Lúcia não pautará a denúncia contra Renan antes disso. A presidente já definiu a pauta de julgamentos até o fim de novembro e ainda não agendou o julgamento da denúncia. Resta saber se ela incluirá o caso na pauta de dezembro.

O julgamento da ação da Rede foi agendado na semana retrasada, antes dos desentendimentos entre Cármen e Renan. Depois disso, o presidente do Senado chamou de ?juizeco? o magistrado de Brasília que determinou a prisão de quatro policiais legislativos acusados de tentativa de atrapalhar as investigações da Lava-Jato. Cármen saiu em defesa da categoria. Em discurso, ela disse que o Judiciário merece respeito.

Na ação, a Rede argumentou que o exercício da Presidência da República é incompatível com a condição de réu. Para o partido, o afastamento do presidente da Câmara ou do Senado dos seus cargos em caso de responder ação penal, ?não equivale à imposição de uma sanção, mas tão somente ao reconhecimento de impedimento temporário para o exercício de cargo particularmente elevado e diferenciado?.

No inquérito em que foi denunciado, Renan responde por falsidade ideológica, uso de documento falso e peculato. O inquérito está sob sigilo e apura se a empreiteira Mendes Junior pagou pensão alimentícia à jornalista Mônica Veloso, com quem o parlamentar tem uma filha. O escândalo data de 2007 e foi responsável, na época, pela renúncia de Renan da presidência do Senado.

Segundo a denúncia, Renan apresentou documentos falsos para comprovar que tinha condições de arcar com a despesa da filha. As quebras de sigilo bancário mostraram o contrário. A pensão era de R$ 16,5 mil. Mas os peritos da Polícia Federal destacaram que, em 2002, o denunciado e seus dependentes tiveram renda anual de R$ 27,9 mil, ou R$ 2,3 mil mensais. Em 2004, a renda anual teria sido de R$ 102,2 mil, ou R$ 8,5 mil mensais.