Esportes

Decisão da federação internacional de tiro esportivo divide opiniões na seleção brasileira

Representante brasileiro no tiro esportivo dos Jogos Olímpicos do Rio, Julio Almeida vinha bem no evento-teste (que também era etapa de Copa do Mundo), em abril, quando começou a tocar no estande “Rock n’roll all nite”, do Kiss. Fã do gênero, ele se desconcentrou a ponto de errar dois tiros seguidos. Resolveu, então, parar e só voltou a atirar após o fim da música. Na entrega dos primeiros uniformes olímpicos da delegação brasileira, feita na última sexta-feira, na Urca, o atleta desabafou:

— Vamos ter música nas Olimpíadas. A Federação Internacional de Tiro (ISSF, na sigla em inglês) acha que isso atrai mais o público, fez apenas dois ou três testes neste ano. Mas quem quer ouvir música vai para um show, e não para uma competição de tiro. No meu ver, foi terrível a federação mudar as regras do jogo no ano olímpico. Já que é pra fazer a mudança que seja no início do ciclo olímpico — afirma Julio.

A americana Christy Nicolay, gerente-geral de apresentação do esporte na Rio-2016, explica que foi feita uma seleção musical com mais de seis mil faixas. Nos dias da competição, elas serão escolhidas pelo DJ brasileiro Melvin Ribeiro, que incluiu até pedidos dos atletas nesta lista. Apesar desta iniciativa por parte dos competidores, este lado de entretenimento do evento divide fortes opiniões entre a seleção brasileira, que terá nove atiradores no megaevento.

— Gostei de ter música no estande olímpico, pois nunca competimos no silêncio. A música não me desconcentra, pelo contrário. Tenho mais facilidade de me desconcentrar quando escuto alguém conversando em português na arquibancada — diz Cassio Rippel, da carabina deitada 50m.

Já Emerson Duarte, da pistola tiro rápido, segue na linha de Julio Almeida:

— Tem esportes de alta concentração como o tênis que não tem barulho, conversa, grito. Deveriam respeitar também no tiro, que é um esporte no qual a concentração é crucial. A música mexe com emoção. Como fazer para colocar uma música neutra? Acho muito difícil. Você pode prejudicar um atirador ou beneficiar outro.

A polêmica é tanta que divide opiniões até entre o único casal desta seleção olímpica, formado por Felipe Wu (número um do mundo na pistola de ar 10m) e Rosane Ewald Budag (carabina).

— O Felipe gosta de música. Ele já treinava em casa, em São Paulo, ouvindo música para abafar o som da cidade. Mas eu acho péssima essa ideia da federação. Sou fã de música clássica, tenho formação em flauta doce. Mas, por exemplo, ninguém tem acesso à playlist. Então, não sabemos que música que vai tocar. Se tocar algo que eu não goste, como o funk, vou achar muito ruim — afirma Rosane.

Esperança real de pódio olímpico, Wu acredita que a iniciativa fará bem ao esporte:

— Para os atletas imagino que (a música) não vai fazer diferença nenhuma. Estão tentando tornar o esporte mais popular. Tem que aceitar, não adianta lamentar.

A novidade já mudou a rotina dos atletas. O psicólogo da seleção brasileiro Silvio Aguiar, que é ex-atleta e já representou o país nos Jogos, disse que os treinos serão feitos com música para criar um cenário ideal. Além disso, os atiradores irão utilizar um tampão especial no ouvido além do tradicional protetor de audição. Para a ISSF, entretanto, esta polêmica com a música não existe.

— A ISSF acredita que a música durante a competição é positiva para a apresentação do esporte e não acha que isso pode afetar a concentração, desde que não tocada muito alto. Ao contrário, a música pode ajudar a criar um ambiente de áudio homogêneo, evitando o distúrbio que pode ser causado por um espectador gritando — disse Marco Dalla Dae, gerente de comunicação da ISSF.