Opinião

Coluna Direito da Família: IMUNIZAÇÃO IDEOLÓGICA

 

 

Em meio às divergências de pensamento ou de opiniões políticas, existe a constante impressão de se andar sob uma corda bamba, fazendo malabarismos. No mundo áspero e fugaz, questões singelas tomam proporções inimagináveis. É o que tem acontecido a respeito da vacina para imunização contra a Covid-19, que recentemente alcançou a faixa etária infantil.

Alguns pais, por opção ideológica, entendem por não realizar o esquema vacinal para os menores. Sem discussões políticas (ainda que seja impossível despir-se dessa vertente absolutamente humana, como mencionava Hannah Arendt) a respeito dessa conduta paternal, é importante entender que existe a obrigatoriedade vacinal, nos casos recomendados pelas autoridades sanitárias (é o caso das vacinas contra a Covid-19), consoante disposição do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Isso decorre não só da proteção da vida e da saúde do menor, mas também da necessidade da proteção da coletividade contra disseminação de epidemias que possam ser evitadas ou controladas por vacina. Aliás, os tribunais têm agido de forma coercitiva nesse sentido, na medida em que ressaltam que a não vacinação pode levar à imposição da penalidade de multa de 3 a 20 salários mínimos, além de outras sanções como a suspensão do poder familiar ou guarda.

Apesar disso, muitos pais insistem em sua convicção ideológica, bradando que têm direito à proteção de suas convicções, tendo o direito de escolha sobre os filhos e seu calendário vacinal. Não estão atentos, porém, ao fato de que a autoridade dos pais sobre os filhos menores não é um poder absoluto e inconteste, em realidade é formado por um leque de obrigações e responsabilidades.

Certamente que a legislação e os tribunais protegem a liberdade, inclusive sobre suas convicções, enquanto essência da formação democrática. Contudo, existem limites, inclusive à liberdade, para não haver a derrocada em estado de selvageria. Estando em sociedade democrática, há que se ter em mente que existe responsabilidade coletiva, de modo que a esfera de liberdade de alguém esbarra na esfera do outro, sendo necessário não só respeito, para convivência pacífica, mas ações que impeçam lesões aos direitos alheios.

Nesse sentido, além de se ter em mente que paternidade é responsabilidade, o exercício desta não pode ferir os direitos dos menores, especialmente frente à necessidade de ampla proteção. A opinião política dos pais não deve afetar o direito à vida e à saúde dos filhos menores, pois estando diante de direitos colidentes, é imprescindível ponderação.

Quando algum dos pais recusa-se a cumprir essa obrigação decorrente da paternidade, faz-se necessário que o outro cumpra, ainda que necessite de respaldo judicial, pois esta é a força do Estado, em prol da justiça.

O respaldo jurídico deve tender à proteção da vulnerabilidade. Afinal, o Direito, representado pela deusa Themis, carrega consigo a balança e a espada, para alcançar a justiça, mas defender a vulnerabilidade, ainda que para tanto necessite de coerção.

 

Dra. Giovanna Back Franco

Advogada e mestre em Ciências Jurídicas