Cotidiano

Cerveró tenta complementar delação e envolve ex-governador de MT

2014052217967.jpg-GL01M1EE0.1.jpgBRASÍLIA – Numa das últimas decisões tomadas na Operação Lava-Jato antes de morrer, o ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal (STF), indeferiu um pedido de homologação do complemento da delação premiada do ex-diretor da Petrobras, Nestor Cerveró. Isso não quer dizer que as novas informações prestadas por ele estão descartadas. Teori mandou separar os novos depoimentos, que vão tramitar de forma isolada em um novo processo “até nova decisão”.

Os novos depoimentos estão sob sigilo, mas a decisão de Teori, que é pública, reproduz parte da argumentação do Ministério Público Federal (MPF), que pedia a homologação. Lá são citados três episódios: a ampliação das instalações da BR Distribuidora, empresa subsidiária da Petrobras na qual Cerveró também já foi direto; fornecimento de asfalto ao estado de Mato Grosso, envolvendo um ex-governador; e a aquisição de precatórios pela Petrobras e pela BR Distribuidora.

O pedido do MPF para homologar os novos depoimentos foi enviado ao STF em 13 de dezembro de 2016. A decisão de Teori foi tomada no dia seguinte. Em 20 de dezembro o STF já estava de recesso, quando eventuais decisões urgentes são tomadas pela presidente da corte, ministra Cármen Lúcia. Em 19 de janeiro, Teori morreu num acidente de avião. Até o momento, não foi escolhido um novo relator para a Lava-Jato.

A delação original de Cerveró foi homologada por Teori em 14 de dezembro de 2015. Segundo o Ministério Público Federal (MPF), Cerveró apresentou três novos anexos à delação em 23 de fevereiro de 2016. Em 27 de outubro ele foi novamente ouvido por procuradores da República e em 28 de novembro assinou o aditivo do acordo com o MPF.

O MPF pediu também que o STF decretasse o sigilo para resguardar as novas informações fornecidas por Cerveró. Teori concordou nesse ponto, separando o complemento da delação para tramitar de forma separada e em segredo de Justiça. Mas a decisão do ministro, que dá algumas informações sobre os aditivo do ex-diretor da Petrobras, continuou pública, permitindo saber ao menos os temas tratados.

Teori mandou os documentos de volta à PGR. Em 13 de janeiro de 2017, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, enviou nova petição ao STF, relatando que a delação original foi devolvida, mas sem ser acompanhada das folhas que tratam das novas informações prestadas por Cerveró. Assim, pede vista também desses documentos, de forma que possa avaliar a adoção das medidas cabíveis. Janot aproveita para ressaltar a conexão entre os novos depoimentos e a Operação Lava-Jato, embora não diga claramente ser contra separar o complemento da delação original.

Uma das cláusulas do acordo previa que Cerveró teria até 30 dias depois de firmado o acordo para apresentar novos fatos. Ele alega que não descumpriu o combinado uma vez que entre 20 de dezembro de 2015 e 31 de janeiro de 2016, o STF estava de recesso, período em que os prazos processuais são suspensos.

“Conquanto tenha havido apresentação tardia dos anexos, fora do prazo pactuado, a conclusão do Ministério Público Federal foi no sentido de que se trata de situação merecedora de flexibilização, mormente considerando-se que o acordo foi celebrado próximo ao recesso forense de fim de ano”, diz trecho do documento do MPF concordando com Cerveró.

Em junho, levantamento do GLOBO feito a partir da delação original de Cerveró apontou o pagamento de pelo menos R$ 562,7 milhões em propina envolvendo negócios da Petrobras e de uma de suas subsidiárias, a BR Distribuidora. A cifra deve ser maior, uma vez que os valores não estão atualizados e não há informação de quanto foi pago em propina em parte dos negócios com irregularidades.

Individualmente, o valor mais alto se refere à aquisição pela Petrobras, em 2002, da empresa petrolífera argentina Pérez Companc. Segundo Cerveró, o negócio rendeu US$ 100 milhões em propina para integrantes do governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Ele disse ainda que a compra de blocos de petróleo em Angola gerou propinas de R$ 40 milhões a R$ 50 milhões para a campanha presidencial do PT de 2006, quando Luiz Inácio Lula da Silva era candidato à reeleição.

Entre outros, também foram citados na delação original como beneficiários das propinas o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), o ex-presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), os senadores Jader Barbalho (PMDB-PA), Fernando Collor (PTC-AL) e Edison Lobão (PMDB-MA), e o ex-senador Delcídio Amaral. Na época, eles negaram as acusações.