Cotidiano

'Cartas Leopoldinas' mescla música clássica e História na Flip

PARATY – Quando chegou ao Brasil, em 1817, a princesa austríaca Leopoldina trouxe consigo um ampla coleção de partituras que continha obras de grandes compositores, como Beethoven, Schubert e Mozart. Entre as pautas musicais, dois nomes menos conhecidos do público contemporâneo também se destacavam: o tcheco Kozeluch e o austríaco Neukomm. Esses dois artistas são o ponto de partida do “Cartas Leopoldinas”, espetáculo do Circuito Musica Brasilis que será apresentado nesta edição da Flip, na quinta-feira, às 20h30, na Igreja da Matriz.

Homenagem aos 200 anos do acordo nupcial entre Dom Pedro I e a Imperatriz Leopoldina, o concerto foi idealizado pela pesquisadora musical e cravista Rosana Lanzelotte. Ela toca pianoforte acompanhada por Ricardo Kanji (flauta) e seu sobrinho Alberto (violoncelo), com a atriz Carol Castro interpretando a jovem e nobre europeia, lendo as cartas que ela enviava para o seu marido.

? O noivado deles foi sacramentado em 1816, mesmo ano da chegada da Missão Francesa ao Brasil. Os dois acontecimentos, parte de uma estratégia para inserir o país no “mundo civilizado”, foram emblemáticos para nossa história cultural ? afirma Rosana. ? A Leopoldina, que tocava piano, trouxe seu rico acervo de partituras, hoje sob guarda da Biblioteca Nacional.

Aluna de Kozeluch em Viena, a imperatriz teve contato ainda mais próximo com Neukomm, que foi professor de música e francês dela e do príncipe português, no Rio de Janeiro. Em terras tupiniquins, o músico austríaco se encantou pelos sons que vinham das ruas.

? Ele foi o primeiro a misturar o clássico e o popular no Brasil, compondo a partir de peças de Joaquim Manoel, que tocava viola de arame. Como o Joaquim era analfabeto musical, o Neukomm anotou modinhas e lundus. Se não fosse por isso, não teríamos registros da música popular tocada naquela época.

O outro compositor do repertório é o próprio Dom Pedro, cujo “Hino da independência” fecha a apresentação.

? É uma feliz composição dele, melodicamente interessante, bastante inspirada. Era um músico preparado, mas nenhum Beethoven, é claro ? avalia Rosana. Ela adianta que as obras do show poderão ser consultadas publicamente. ? Vamos editar esse programa e publicar as pautas musicais no site do projeto.

Segundo Carol Castro, “Cartas Leopoldinas” é relevante por iluminar um lado pouco conhecido da biografia da princesa e dar visibilidade a figuras que não tiveram o devido reconhecimento.

? Fiquei encantada com a história dela. Ainda mais nesse momento no qual discutimos tanto o empoderamento das mulheres. Em uma das correspondências com o marido, ela o alerta sobre a situação política do país, que estava como um “vulcão”, e sentencia: “Com vosso apoio ou não, o país fará sua separação”. Só então reparei o quão importante ela foi para nossa História ? comenta.

Opinião compartilhada por Rosana, que acredita que a princesa trouxe o “classicismo vienense” para a corte portuguesa.

? Uma de suas maiores queixas dela era de que as mulheres não podiam ir ao teatro no Rio, que eram apenas liberadas para frequentar a igreja. Ela era uma mulher preparada e culta, que estudava música e mineralogia, por exemplo. É possível que sua curiosidade e seu conhecimento tenham inspirado Dom Pedro a compor mais. Queremos destacar essa faceta dela no espetáculo ? afirma.