Cotidiano

Cardozo vai anexar declaração de Cunha como prova de defesa de Dilma

BRASÍLIA – O PT enxerga na renúncia do deputado Eduardo Câmara à Presidência da Câmara como uma forma de desgastar o governo Michel Temer e reforçar os argumentos contra o impeachment da presidente afastada Dilma Rousseff. Petistas avaliam que Cunha ainda é uma ameaça ao presidente interino Michel Temer, devido à ligação entre os dois, e o acusam de ter agido politicamente no caso do impeachment. O ex-ministro José Eduardo Cardozo, advogado de defesa da presidente afastada na comissão do impeachment, disse nesta quinta-feira que Eduardo Cunha confessou ter agido por vingança contra Dilma quando declarou que foi perseguido por ter aberto o processo de impeachment na Câmara.

Cardozo disse ao GLOBO que vai anexar a entrevista de Cunha, quando leu uma carta de renúncia no início da tarde de hoje, como prova na defesa de Dilma. Para o ex-ministro, o tom de Eduardo Cunha reforça os argumentos da defesa de que ele agiu de forma política, como reação ao fato de o PT não ter feito acordo para impedir a abertura do processo contra ele no Conselho de Ética da Câmara.

? O que se destaca nessa renúncia foi a entrevista de Eduardo Cunha sobre o papel dele no processo de impeachment, o que só confirma nossa tese. Ele mesmo diz que sua maior conquista como presidente da Câmara foi ter aberto o processo contra a presidente. Isso mostra o caráter de vingança dele, porque o PT não fez qualquer tipo de acordo com ele. Vamos juntar isso no processo como prova. É mais uma prova, há evidências de desvio de poder. Agiu com vingança ? disse Cardozo.

Apesar de Cunha ser desafeto da própria Dilma, Cardozo disse que não era motivo de “comemoração”.

? Não acho que é motivo de comemoração. É triste de um presidente da Câmara tenha chegado a esse tipo de degradação ? disse Cardozo.

Para os senadores petistas Jorge Viana (PT-AC) e Lindbergh Farias (PT-RJ), Cunha ainda é uma “ameaça” a Temer. Já o ex-presidente Lula esteve quarta-feira em Brasília para reforçar o corpo-a-corpo no Senado. A avaliação dos petistas é que houve um “acordão” entre Temer e a base aliada para “salvar” o mandato de Cunha e que, se eles não cumprirem isso, ele poderá retaliar.

O vice-presidente do Senado, Jorge Viana, disse que Cunha expõe as “vísceras” da crise gerada pelo impeachment.

? A renúncia expõe as vísceras dessa crise, desse modelo que fracassou. A renúncia expõe a gravidade da crise e traz mais uma crise para o governo do presidente Michel Temer, porque ele foi o grande articulador do processo do impeachment, e até hoje, sem dúvida, é a pessoa mais influente que se tem na Câmara. O deputado Eduardo Cunha seguirá sendo uma ameaça, um gravíssimo problema para o governo de Michel Temer ? disse Jorge Viana, lembrando que Cunha era o vice-presidente da República na linha sucessória, até se afastar do cargo:

? O grande artífice, o grande engenheiro do impeachment hoje renunciou. Expõe definitivamente que essa crise é maior do que todos pensam, e atinge também o PMDB. E é como se estivéssemos tendo a renúncia do vice-presidente da República.

ACORDÃO

Já o senador Lindbergh Farias (PT-RJ) disse que Cunha fez um “acordão” com Temer para não ser cassado. Apesar de ser da comissão de impeachment, ele disse que a renúncia em si não muda muito a situação no colegiado, mas expõe o governo Temer.

? Essa renúncia tem um objetivo claro: um acordão para não cassar o mandato dele, e que passa por Michel Temer. Tem muita gente na Câmara preocupada com a delação do Eduardo Cunha. Se ele for cassado, ele vai ser preso, junto com a mulher e a filha, e vai fazer a delação. Para mim, ele não renunciaria se não tivesse um acordão montado para salvar seu mandato. Não foi nenhum gesto nobre ? disse Lindbergh, avisando:

? A simples renúncia não impacta muito (nos trabalhos da comissão). Temos que ver o dia a dia, e vamos lutar para que ele seja cassado no plenário, e vamos denunciar os partidos que defenderem o mandato dele.

A avaliação nos bastidores do PT é que Cunha fechou um acordo com Temer e o chamado “centrão” para tentar evitar sua cassação. O acordo passaria pela escolha de um integrante desse bloco para comandar a Câmara.

LULA COM OS SENADORES

O ex-presidente Lula esteve na quarta-feira em Brasília e se reuniu com senadores de outros partidos, em encontro na residência do senador Roberto Requião (PMDB-PR). Segundo interlocutores, Lula mantém o empenho para tentar reverter votos no Senado, mas já trabalha com um cenário de impeachment definitivo. Nesse caso, o PT faria oposição ferrenha ao governo Temer.

Esse grupo de senadores tem defendido um plebiscito em outubro sobre a realização de novas eleições, mas Lula e Dilma resistem ainda à tese, porque ela divide os movimentos sociais.

A grande expectativa, segundo petistas, é sobre as novas fases da operação Lava-Jato, e até que ponto elas afetarão Temer ou seus ministros.