Cotidiano

Brasil não fará concessões unilaterais por acordo entre Mercosul e UE, diz Serra

PARIS – O ministro das Relações Exteriores, José Serra, assegurou que o Brasil não fará concessões unilaterais para destravar o acordo de comércio entre o Mercosul e a União Euopeia (UE), e também desmentiu que o Itamaraty já tenha uma lista de embaixadas para serem fechadas, segundo rumores divulgados na semana passada. Em Paris para participar da reunião do conselho de ministros da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), com início nesta quarta-feira, Serra disse ter preparado um documento sobre as perspectivas para a economia brasileira para distribuir durante o encontro, com um diganóstico “relativamente” bom.

As últimas trocas de propostas comerciais entre os blocos do Mercosul e da UE, deflagrado há duas décadas, ocorreram no último dia 11, mas na opinião do ministro o acordo ainda depende de esforços por parte dos países europeus.

— A UE ainda está pendente de entregar partes de suas conclusões. Em geral no Brasil ou na América Latina, tem gente que diz que o acordo Mercosul-UE não sai por causa do Mercosul. Isso podia ser verdadeiro no governo anterior da Argentina, mas não é mais. De fato, a bola está nos pés agora da UE. E principalmente com a questão agrícola. Eu lembraria que eles têm por ano o equivalente a € 100 bilhões de subsídios agrícolas, entregue em dinheiro aos seus produtores. É subsídio. Terei um encontro com a comissária de Comércio da UE (Cecilia Malmström), e se Deus quiser vamos fazer um bom avanço. E vamos insistir as possibilidades de expansão do comércio com os EUA e Canadá, até como fator para estimular mais a UE a se apressar — disse Serra, em breve encontro com representantes da imprensa brasileira na capital francesa.

O ministro insistiu na necessidade de o Brasil manter uma posição de firmeza em relação a UE, e também em diversificar seus parceiros comerciais:

— O Brasil não vai fazer concessões unilaterais, não faz sentido. Eles (UE) não fazem, por que nós vamos fazer? Um bom player no comércio internacional tem de sempre diversificar, não pode ficar dependente de uma ou duas regiões. Descobri, por exemplo, que importamos US$ 8 bilhões de petróleo da Nigéria, e eles não compram quase nada da gente. Esta é uma situação de desequilíbrio, já designei um pessoal para estudar o assunto Nigéria-Brasil. Sempre haverá desequilíbrios, mas devemos estimular que se reduzam.

Para Serra, há muitas incompreensões sobre a situação do Mercosul. Como exemplo, citou uma reportagem publicada pelo jornal britânico “Financial Times”.

— Hoje saiu no “Financial Times” uma resposta a uma matéria que eles fizeram muito equivocada sobre o Mercosul. Publicaram a carta (de resposta) na íntegra, o que é raro que façam. Eles compararam, por exemplo, o crescimento do Mercosul e da Aliança para o Pacífico no período recente. Você não pode comparar o crescimento relativo de uma criança de um ano para três anos com o de um adulto de 30 anos para 33 anos. Trata-se de um equívoco elementar — justificou.

Sobre as recentes declarações da chanceler argentina, Susana Malcorra, de que alterações no acordo Mercosul-UE devem ser feitas com “prudência”, “pausadamente” e sem “não urgência”, Serra se esquivou:

— Não fiquei sabendo disso — disse, laconicamente.

CURIOSIDADE ESTRANGEIRA PELO BRASIL

O ministro admitiu que há muita “curiosidade” por parte de autoridades estrangeiras em relação à situação do Brasil pós-impeachment da presidente Dilma Rousseff, e a reunião na OCDE servirá também, de uma certa forma, para dar um panorama sobre as possíveis mudanças econômicas.

— Preparamos um documento superconjuntural a respeito das perspectivas econômicas brasileiras para os próximos 12 meses, baseado no que meu mesmo fiz e também em parte do que saiu na imprensa, e as perspectivas são boas, relativamente — resumiu

O ministro negou qualquer fechamento iminente de alguma representação diplomática brasileira no mundo. E acusou o PT rumores veiculados na semana passada de que as embaixadas em Sierra Leone e na Libéria poderiam ser em breve fechadas.

— É mentira de quem deu isso — garantiu. — Isso é uma onda sem pé nem cabeça, apenas mandei fazer uma análise da utilidade de cada embaixada, dos custos etc. Isso é uma providência elementar. Como esse pessoal do PT não tem nada para falar a respeito do atual quadro, ficam então caramiolando a respeito destas coisas — disparou.

Antes de desembarcar em Paris, Serra fez uma escala no Cabo Verde, para tratar da cooperação militar entre os dois países e do encontro Brasil-África que ocorrerá no ano que vem. Serra reiterou sua preferência pelo parlamentarismo como sistema de governo para o Brasil;

— Eles terão eleições logo, só que eles têm um regime semiparlamentarista, que é precisamente o que acredito que seria o melhor para o Brasil. Tem primeiro-ministro que cuida do governo, e presidente que cuida dos assuntos de Estado. Semiparlamentarista porque tem eleição direta para presidente, que não é eleito pelo Congresso como ocorre na Itália ou na Alemanha.

Nesta segunda-feira à tarde, a agenda do ministro incluía reunião preparatória na embaixada brasileira para o encontro na OCDE, onde ele fará um pronunciamento sobre no painel “Uma Agenda Universal para o Desenvolvimento Inclusivo e Sustentável”. Nos próximos dias, estão previstas reuniões bilaterais com o representante para o Comércio do Governo dos Estados Unidos (USTR), Michael Froman; a ministra do Comércio internacional do Canadá, Chrystia Freeland; o secretário-geral da Unasul, Ernesto Samper, o diretor-geral da OMC, Roberto Azevêdo, e o ministro das Relações Exteriores da Noruega, Borge Brende.