Esportes

Argélia entre o orgulho e a suspeita no Rio-2016

A delegação argelina tinha cometido a maior gafe dos Jogos Paralímpicos devido ao atraso de sua seleção feminina de goalball, que perdeu o avião e duas partidas no Rio. Mas, se houver alguma forma de reparar essa falha e dignificar a memória do país no Rio, parte caberá à façanha de Abdellatif Baka, dos 1.500 classe T13 (para deficientes visuais, sem guia).

Paralimpíada IMPRESSO 12/09

Neste domingo, no Engenhão, Baka conquistou o ouro na distância com um tempero a mais: sua marca de 3min48s29 teria sido suficiente para lhe dar o ouro na prova da Olimpíada, vencida pelo americano Matthew Centrowicz, em 3min50s redondos.

O resultado de Baka não é exatamente um fenômeno. O tempo que Centrowicz fez para conquistar o ouro olímpico não o deixaria sequer no pódio da prova de ontem; o americano teria sido quinto. Logo após o campeão paralímpico chegaram o etíope Tamiru Demisse (3min48s49), do queniano Tamiru Demisse (3min49s59) e do argelino Fouad Baka (3min49s84), que é irmão de Abdellatif.

De fato, a prova olímpica vencida por Centrowicz foi considerada de baixíssimo nível técnico, cerca de 24 segundos abaixo da melhor marca do ano, que pertence ao queniano Asbel Kiprop: 3min29s33, que ficou em sexto lugar na Olimpíada. O recorde mundial é de 3min26s00, feitos pelo marroquino Hicham El Guerrouj, em julho de 1998.

Asbel, inclusive, foi a grande decepção nos 1500 olímpicos do Engenhão. Além de ter chegado com a melhor marca do ano, ele havia vencido todas as etapas da Liga Diamante que disputou na distância, nesta temporada. Escpecula-se que se ele tivesse tido um melhor desempenho, a prova olímpica seria mais rápida.

Treinei muito com meu irmão para vencer essa prova paralímpica. O público foi fantástico. Me incentivou o tempo todo

Nada disso, porém, empana o brilho da conquista de Abdellatif, o melhor corredor de 1.500m da jornada que se chama Rio-2016.

? Eu treinei muito com meu irmão para vencer essa prova paralímpica. Ele me ajudou a montar uma estratégia para vencer os outros adversários – disse Abdellatif, agradecendo ao apoio dos brasileiros. ? O público foi fantástico. Me incentivou o tempo todo.

Apesar de ontem ter competindo entre os paralímpicos, Abdellatif vem alimentando o sonho olímpico.

? Sou jovem (tem 22 anos). Acho que consigo fazer um bom ciclo olímpico para tentar uma vaga nos Jogos de Tóquio, em 2020 ? disse o campeão.

Por ter um campo de visão limitado até 40º, conforme permite a categoria T13, os competidores dos 1500m ainda precisam se preocupar em não esbarrar em seus adversário. Pela deficiência na visão periférica, os tombos são comuns. Ontem, por exemplo, o brasileiro Julio Cesar Agripino caiu na primeira metade da prova enquanto estava liderando após levar um esbarrão. Ele terminou na penúltima colocação com 4min00s61.

Conteúdo de uma matéria só: quadro de medalhas

Nas provas de curta distância, por cada competidor ficar em uma pista exclusiva, esses esbarrões não são comuns. Nas provas acima de 400m, as pistas são compartilhadas. Portanto, foi incrível que ontem tenha acontecido apenas esse incidente com Agripino. Já que, ao fim da prova, Agripino e Yeltsin Oullet ? o outro brasileiro na disputava, que terminou em 11º, uma posição à frente de Agripino, com 3min58s28 ? apoiavam-se um no outro para facilitar a caminhada e mesmo assim estavam esbarrando nas grades que cercavam a zona mista, uma área delimitada para as entrevistas, do estádio.

CHANCE NO GOALBALL

Já a seleção feminina de goalball ganhou uma segunda chance na Paralimpíada após desembarcar no Rio ontem. Derrotada por W.O. nas duas primeiras partidas, a equipe enviou comunicado oficial ao Comitê Paralímpico Internacional (IPC) e ao Comitê Rio 2016 explicando que o motivo do atraso seria a perda de voos e conexões para o Brasil. O grupo fazia um período de treinos em Varsóvia, na Polônia, e não se apresentou para os jogos contra EUA, na estreia, e no sábado, contra Israel, o que quase lhe rendeu a eliminação.

O Comitê Rio-2016 e o Comitê Paralímpico Internacional (IPC) confirmaram ontem que as argelinas e jogarão hoje, às 15h30, diante do Japão. As entidades investigam a explicação dada pelos argelinos, que no primeiro momento não convenceram Craig Spence, diretor de Comunicação do IPC. Suspeita-se que a árabe Argélia atrasou a chegada intencionalmente para não se ver obrigada a enfrentar a seleção israelense na segunda partida. Os países não têm relações diplomáticas. Na Olimpíada, alguns atletas árabes manifestaram desconforto ao enfrentar Israel.

? A delegação alega perdeu voos e se atrasaram. Mas não se demora seis dias para chegar ao Rio. Há uma série de suspeitas, mas não podemos comprovar ainda. Para excluirmos a equipe, teríamos de ter uma prova concreta. Não vimos voos cancelados da Polônia para cá. Há aeroportos grandes em volta, e não houve cancelamentos. Parece estranho, não é? Vamos tentar ir a fundo na questão ? explicou Craig Spence, diretor de comunicação do IPC. O caso pode ser levado à Corte Arbitral do Esporte. Spence ainda fez piada.

? Eles precisam pegar um ônibus da Vila para os jogos. Como demoraram seis dias para chegar ao Rio, nunca se sabe ? brincou o diretor.