Cotidiano

Aposentadoria? Alessandra Ferri volta a dançar Julieta aos 53 anos

59319745_This May 7 2016 photo released by the American Ballet Theatre shows Alessandra Ferri ri.jpgNOVA YORK ? Existem aqueles que, depois de se aposentar de uma carreira de sucesso, suspiram de alívio e mergulham contentes no ritmo de uma vida livre de prazos e pressão.

E existem pessoas como a bailarina Alessandra Ferri, que se aposentou do American Ballet Theatre em 2007 e logo se pegou fazendo a pergunta “quem sou eu?” ao acordar.

Alessandra, uma das bailarinas mais admiradas de sua geração, não teve muita paciência com a aposentadoria. Então, aos 53 anos de idade, ela está retornando ao American Ballet para dançar seu papel mais conhecido: Julieta. Ela vai dançar a coreografia pela primeira vez desde sua despedida da companhia, no mesmo palco da Metropolitan Opera House nove anos atrás, quando recebeu uma chuva de confete dourado e foi ovacionada durante 20 minutos.

E este não será o único evento marcante da semana da bailarina. No dia seguinte, a italiana vai receber a cidadania americana.

? Estou aqui há muito tempo. Nova York tem sido a minha casa por 20 anos ? diz ela, com um sorriso. ? Quero fazer parte da vida americana, votar. Talvez precisemos de mais um voto.

Em uma tarde recente, Alessandra foi ao seu camarim no teatro depois de um ensaio. Enquanto os acordes do “Lago dos cisnes” eram trazidos do palco pelo alto-falante ao pequeno cômodo, a bailarina alongava seu famoso pé arqueado e explicava como Julieta ? papel que ela interpreta desde os 19 anos ? voltou à sua vida.

Tudo começou com uma ligação de Kevin McKenzie, diretor artístico do American Ballet, um ano atrás. Ele a observou deixar a aposentadoria gradualmente, depois de uma pausa de seis anos. Primeiro, ela apresentou uma obra auto-coreografada no Festival Spoleto, depois fez parte do espetáculo de dança-teatro “Cheri”, em Nova York, interpretou Virgina Woolf em “Woolf works”, em Londres e, finalmente, fez o papel da atriz italiana Eleonora Duse em um balé de John Neumeier na Alemanha.

McKenzie sugeriu que ela voltasse e dançasse Julieta. “É o SEU papel. Você o fez a sua vida inteira”, disse a ela.

? Eu respondi “não sei, para mim, tem muitas coisas atreladas à Julieta” ? lembra ela. ? Eu não sabia se queria revisitar a coisa toda. Disse que precisava pensar sobre o assunto.

Alguns meses depois, ela decidiu aceitar o desafio.

? Eu pensei “por que não? É uma bela celebração da minha vida”. E você só vive uma vez. Aproveite! Porque a pressão vem de mim mesma, das minhas memórias… Seria muito legal ter uma abordagem livre e ver o que acontece.

Foi esse mesmo espírito de experimentação que guiou as escolhas criativas de Alessandra desde sua “aposentadoria” ? um período chamado por ela de infeliz.

? O primeiro ano passou muito rápido, como se fossem férias longas ? diz. ? Mas depois de um tempo, comecei a me sentir como se tivesse alguma coisa em mim que tinha desligado. Uma parte importante de quem eu era tinha se fechado. Eu não me sentia viva. Você não pode se aposentar de quem você é.

Em relação à óbvia questão se Julieta, uma adolescente, pode ser interpretada por uma mulher de 50 anos, os fãs de Alessandra diriam que ela sempre foi capaz de imbuir o papel com um espírito de ardor juvenil.

A parte da atuação já está totalmente incorporada. Com relação à dança, ela diz:

? Você precisa garantir que o seu físico é capaz de expressar aquela adolescente, então é lá que está o trabalho duro: fazer com que meu corpo fique atlético a ponto de ter aquela leveza. Mas eu não tenho medo de trabalho ? conta a bailarina, que vem se preparando há três meses.

O parceiro de Alessandra na quinta-feira será Herman Cornejo, um sensível bailarino argentino quase 20 anos mais novo, com quem ela desenvolveu uma forte conexão artística. Eles nunca dançaram juntos no American Ballet, mas formaram um casal eficaz em “Cheri”.

? É muito especial. Nós nos entendemos completamente… Quando dançamos juntos, é incrível, a diferença de idade desaparece. O que significa que, uma vez que você alcança a expressão da própria alma, não existe idade ? diz.