Cotidiano

Após massacre no AM, governo retoma multas de R$ 11 mi contra empresas que atuam em presídios

63596485_Riot police walks past the main entrance of Anisio Jobim prison in Manaus Brazil Januar.jpgSÃO PAULO – Uma semana depois do massacre que deixou 56 mortos no Amazonas, o governo estadual resolveu rever uma decisão e ‘reconhecer a validade’ de multas que somam R$ 11,7 milhões e foram aplicadas em outubro de 2015 para penalizar duas empresas contratadas para atuar no sistema penitenciário, a Umanizzare Gestão Prisional e a Auxílio Agenciamento de Recursos Humanos. As punições ocorreram devido a questões como fuga, motins e rebeliões de presos.

Crise carcerária

A decisão aparece em uma portaria publicada no Diário Oficial do Estado do Amazonas da última segunda-feira. Pela publicação, a Secretaria de Administração Penitenciária informa ter ‘prerrogativa de rever seus atos a qualquer tempo’, o que dá margem à interpretação de que as multas chegaram a ser suspensas. Em seguida, o texto reconhece a validade de três portarias que tratam das multas.

Estão no pacote 17 multas, todas devido ao descumprimento de cláusulas previstas em contratos assinados pelas duas empresas com o governo. Segundo os procedimentos administrativos do governo, a Umanizzare e a Auxílio recorreram de cada penalização, mas não apresentaram “qualquer argumento plausível que justificasse a não aplicação da pena imposta”.

As multas contra a Umanizzare somam R$ 9,8 milhões e envolvem quatro contratos diferentes firmados a partir de 2013 com as secretarias de Justiça e Administração Penitenciária. A empresa atua em cinco presídios. No Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj), onde ocorreu o massacre, a empresa é responsável pela administração da unidade.

As 11 punições que a empresa recebeu variam de 2% a 10% dos valores dos contratos. Em um deles, o 002/2014, a empresa chegou a ser multada cinco vezes, duas delas com valores superiores a R$ 2,7 milhões.

Em outros dois casos, a multa é de 2% do valor do contrato, porcentagem prevista para casos em que empresa fosse responsabilizada por fugas, rebelião e motins de presos. Já as multas de 10% são previstas em situações em que for constatada a ‘inexecução parcial da obrigação assumida’.

Nesse contrato de 2014, a prestação de serviços ocorre no Instituto Penal Antonio Trindade (Ipat). Em outro caso, se refere à Unidade Prisional Puraquequara (contrato 20/2013). Em relação ao Compaj, alvo do contrato 18/2014, há pelo menos uma multa aplicada contra a empresa. Na punição de outubro de 2015, a infração contratual envolve controle de empregados, para que não houvesse interrupção da prestação de serviços na unidade.

Esse problema chegou a ser mencionado também em um relatório do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, de janeiro do ano passado. Durante uma vistoria no complexo, peritas constataram falta de funcionários. “É importante destacar que foram obtidos relatos que apontam para um descumprimento contratual: apenas 153 funcionários estavam trabalhando, enquanto 250 estão previstos no contrato firmado para a gestão do Compaj”, diz o documento.

Já no caso da Auxílio, as seis multas contra a empresa se referem a descumprimento em quatro contratos firmados entre 2008 e 2011. Ao todo, as infrações, que variam de 03% a 2% do valor do contrato, somam R$ 984 mil.

Procurado na terça-feira, por e-mail, e nesta quarta-feira, por telefone, para falar sobre o assunto, o governo do Amazonas não se pronunciou.

A Auxílio, que teria deixado de prestar serviços no Amazonas em 2013, não foi localizada. Na semana passada, a assessoria da Umanizzare chegou a ser indicado ao GLOBO para tratar de questões da Auxílio. A assessoria, porém, informou que não responderia pela empresa.

Umanizzare e Auxílio, que doou R$ 300 mil à campanha de 2014 do governador do Amazonas José Melo, pertencem a um mesmo grupo. Elas integram um total de 12 empresas, ligadas à família do presidente da Federação do Comércio do Ceará (Fecomércio-CE), Luiz Gastão Bittencourt, que dominam a gestão de cadeias no estado.

A Umanizzare afirma que as multas ?são fruto da equivocada interpretação entre o papel do Estado e da empresa privada no modelo de cogestão no sistema prisional?. Em nota, a empresa diz que ?foram abertos 11 processos sancionatórios, nos quais a empresa foi multada arbitrariamente, sem qualquer direito de contestação ou defesa?.

A empresa segue afirmando que ?cumpre rigorosamente todas suas atribuições contratuais, dentro dos claros limites legais e buscará todas as vias para provar a legalidade de suas ações?.