Cotidiano

Ao receber o prêmio Hans Christian Andersen, Murakami crítica xenofobia

TOKIO ? O escritor japonês Haruki Murakami usou seu discurso durante a cerimônia de entrega do prêmio literário Hans Christian Andersen para fazer uma advertência contra a exclusão de estrangeiros e o perigo de se tentar reescrever a história. Murakami falou durante uma conferência no domingo em Odense, na Dinamarca, onde nasceu Andersen, o autor de contos de fadas do século XIX. Em seu discurso, feito em inglês, Murakami citou o sombrio conto ?A sombra?, de Andersen, sobre um erudito que durante uma viagem perde sua sombra.

?Não importa a altura do muro que construímos para impedir a entrada de estranhos, não importa com quanta intransigência excluímos os forasteiros, não importa quanto reescrevemos a história para adequa-la a nossos desejos, no fim prejudicamos apenas a nós mesmos”, disse Murakami, num discurso que a imprensa japonesa interpretou como uma crítica aos países europeus que criam dificuldades para a chegada de refugiados.

?Não são apenas os indivíduos que devem enfrentar suas sombras, mas também as sociedades e nações?, completou o escritor, de acordo com a transcrição do diário japonês ?Asahi?. Assim como na vida de Andersen, continua ele, ?devemos, quando necessário, enfrentar nossas sombras e às vezes até mesmo colaborar com ela. Isso exige uma espécia de sabedoria e valor. Claro que não é uma tarefa fácil. Às vezes surgem perigos. Mas quem os evita nunca vai crescer e amadurecer.? E no pior dos casos, completa, “acabarão como o estudioso no conto, destruídos pela própria sombra”.

Murakami, de 67 anos, não costuma participar de eventos públicos, mas já se pronunciou sobre assuntos como a paz global e energia nuclear. Seu primeiro livro, “Norwegian Wood”, foi também seu primeiro best-seller e o projetou como uma estrela da literatura mundial. Graças a outras obras como “1Q84”, ele é cotado há alguns anos para ganhar o Nobel de literatura.

O Prêmio Literário Hans Christian Andersen foi criado em 2007, quando o escritor brasileiro Paulo Coelho foi premiado. Diante da recepção positiva, os organizadores decidiram tornar a premiação oficial e bianual ? o troféu de Coelho hoje é considerado ?honorário?. Desde então já foram premiados a britânica J.K. Rowling (2010), a chilena Isabel Allende (2012), o iraniano Salman Rushdie (2014) e agora Murakami. O prêmio tem um valor de 500 mil coroas dinamarquesas, ou cerca de US$ 90 mil.