Cotidiano

Ao menos cem agentes já receberam ameaçadas de morte

O home Office, o escritório do crime voltou a funcionar, dizem agentes

Catanduvas – O relato é de um agente que pode estar marcado para morrer. Há cerca de duas semanas, na chamada vivência da penitenciária, os agentes em serviço no Presídio de Segurança Máxima de Catanduvas estavam tirando os presos das celas para o banho de sol e um deles, pertencente a uma facção criminosa paulista, não quis adotar os procedimentos. “Ele resistiu e correu para o nosso lado, tivemos que usar as técnicas menos letais como spray de pimenta para contê-lo e quando ele voltou para a cela disse que era do PCC, que o grupo estava em 26 estados e cinco países, que eles sabem onde todos nós moramos e se eles quiserem “a gente mata tudo vocês de novo”. Foi neste momento que acendeu o sinal vermelho novamente”, afirma o servidor ameaçado.

Fatos como este já são considerados comuns na rotina da penitenciária e podem piorar. Nesta semana as visitas íntimas e sociais nos quatro presídios federais– Catanduvas, Mossoró, Porto Velho e Rondônia, retornaram. Elas foram interrompidas por 60 dias após a morte encomendada da psicóloga que atuava em Catanduvas, Melissa Almeida, em maio passado. “Já se detectou que estes crimes estavam sendo encomendados por presos com informações levadas para fora do presídio durante as visitas intimas e sociais e com esta retomada, podemos dizer que o home office do escritório do crime voltou a funcionar”, reforça o presidente do Sindicato dos Agentes Federais de Execuções Penais em Catanduvas,, Carlos Augusto Machado.

Em tom de desabafo, mais de uma centena de agentes realizaram ontem um novo protesto em frente ao presídio. Eles pedem visitas apenas por parlatório, assim elas podem ser monitoradas quebrando a cadeia de comando de facções que estão presos, mas que continuam com seus atos ilícitos fora da cadeia.

Ontem, durante o protesto, todos seguravam nas mãos alvos indicando que cada um deles pode ser o próximo a morrer. Em um entendimento mais recente as forças de segurança já reconhecem que estas facções criminosas se tornaram “grupos terroristas”. “Eles praticam uma guerra assimétrica, primeiro atingem os agentes, desestabilizam todo o sistema e vão enfraquecendo as forças de segurança. O ponto que chegamos é de calamidade que o governo não quer enxergar. Voltar com as vítimas íntimas e sociais pode ser a determinação de novos crimes, novas mortes, o tráfico de drogas, os roubos e cada um de nós pode estar marcado para morrer”, completa o presidente do Sindicato.

Três agentes assassinados em um ano

Somente no último ano, três agentes federais foram mortos em crimes encomendados por líderes de facções criminosas de dentro de presídios de segurança máxima. Dois destes agentes eram de Catanduvas, assassinados em emboscadas. Ambas as mortes teriam sido determinadas simplesmente por serem profissionais da segurança. O primeiro caso foi em setembro do ano passado quando Alex Belarmino foi morto a tiros na Região do Lago, em Cascavel.

A exemplo dele e de Melissa Almeida, morta em maio deste ano em frente de casa em Cascavel, pelo menos outros cem profissionais estariam na lista dos potenciais alvos. “Em torno de 40% dos agentes já receberam ameaças e podem estar marcados para morrer”, afirma outro agente.

“Estas ameaças são comuns e partem de presos que nem deveriam estar aqui, mas como alguns estados querem se livrar deles, os mandam para o sistema federal. Estes são os que ameaçam porque os líderes jamais fariam isso abertamente”, revela outro servidor.

O presídio de Catanduvas é considerado modelo. Nunca registrou rebeliões nem fugas. Cada preso está em cela individual, fica nela 22 horas por dia com duas horas diárias de banho de sol. A penitenciária, que acaba de completar 11 anos, tem capacidade para 208 detentos, mas opera com cerca de 60% de sua capacidade, acomodando agora em torno de 160 presidiários. Muitos são líderes de organizações criminosas no Brasil e de outros países de onde há acordos de extradição e são considerados de alta periculosidade. Praticaram crimes como tráfico internacional de drogas, de armas, crimes contra o patrimônio, assaltos a carro-forte, além de suas consequências diretas como os assassinatos em massa. A penitenciária que já abrigou detentos como Fernandinho Beira-Mar, hoje tem como interno o tão procurado Cabeça Branca, preso no mês retrasado no Mato Grosso, onde se passava por fazendeiro, mas era foragido, tido como um dos traficantes mais procurados da América do Sul.

Sistema refém de células terroristas

O presidente da Federação do Sindicato Nacional dos Agentes em cinco unidades, Helder Jacoby, alerta para algo assustador. “Estamos fazendo este levante para que a sociedade enxergue o que está acontecendo e nos ajude.

O sistema foi criado para isolar os líderes de facções criminosas, mas isso não tem ocorrido. Não tenho dúvida que estamos reféns de células terroristas”, alerta.

Tudo isso, segundo ele, fomentado pela falta de atenção e política de segurança eficaz a ser adotada pelo governo federal. “Esta política está se mostrando defasada e carente, pois só o que há de pior na liderança do crime organizado está sob a nossa custódia.

Gente que cometeu todo tipo de barbárie. Gente da pior espécie.

Estamos gritando para a sociedade e ao judiciário para que nos ouçam (…) o ministro da Defesa me parece ser o mais sensato entre todos os ministros, pois a situação é caótica e para situações caóticas, se toma medidas caóticas, para situações extremas, se toma medidas extremas e o Ministério da Justiça não tem este entendimento”, reforça.

“Os presídios federais foram criados para isolar a liderança da facção criminosa, quebrar a cadeia de comando, mas não é isso que temos visto”, completa.

A ideia, com o protesto realizado ontem em Catanduvas, outros sejam organizados nos demais presídios de segurança máxima nos próximos dias.