Cotidiano

ANÁLISE: Brasil e Argentina são como samba e tango

samba_tango.jpgBRASÍLIA – As relações entre Brasil e Argentina são como o samba e o tango: seus ritmos não combinam, apesar da vontade de dançá-los. Nesta terça-feira, os presidentes Michel Temer e Maurício Macri vão se reunir em Brasília cheios de boas intenções, mas com pouca bagagem para que essa reaproximação traga resultados positivos e imediatos. A previsão oficial é que Temer e Macri façam uma declaração à imprensa, no fim desta manhã, sem responderem a perguntas. Também assinarão uma série de atos, cujo conteúdo só será conhecido hoje. Alguns desses acordos foram negociados até tarde da noite.

Não há, em um horizonte próximo, perspectiva de acordos que permitam a total liberação, a curto prazo, do comércio bilateral, hoje repleto de travas que impedem o funcionamento do Mercosul como uma união aduaneira. Açúcar e etanol estão fora do bloco. Automóveis, principais itens da pauta no intercâmbio entre os dois países, têm o comércio restrito por quantidades limitadas de unidades que podem ser exportadas sem o elevado Imposto de Importação de 35%.

VONTADE POLÍTICA

Vontade política não é suficiente para impulsionar o bloco, levando em conta o histórico das relações bilaterais. São 25 anos de uma convivência difícil, tentativas nem sempre bem sucedidas e crises econômicas que atropelam agendas em andamento.

Desde o fim de 2008, quando explodiu a crise financeira mundial, as autoridades do país vizinho dificultam a liberação de mercadorias brasileiras com medidas burocráticas e barreiras não tarifárias. Para piorar, enquanto as vendas do Brasil são prejudicadas, China, Estados Unidos e outros parceiros internacionais colocam seus produtos com facilidade no mercado argentino. O protecionismo é só para empresas brasileiras, reclamam técnicos do governo e empresários.

O mais recente contencioso entre os dois países se deve à confecção de um regime de incentivos fiscais, pelo governo da Argentina, para as montadoras que derem preferência às autopeças nacionais. A medida causou protesto de governo e fabricantes de autopeças do Brasil, que argumentam que os benefícios estão em desacordo com a Organização Mundial do Comércio (OMC).

Michel Temer e Maurício Macri repetem uma parceria bem sucedida, no campo político, observada entre a gestão petista e a ex-presidente Cristina Kirchner. Por exemplo: junto com o paraguaio Horacio Cartes, Macri foi um dos primeiros líderes latino-americanos a reconhecer o governo pós-impeachment de Dilma Rousseff. Ao contrário de Venezuela, Equador, Bolívia, Nicarágua e Cuba, a Argentina jamais questionou a legitimidade de Temer.

RECESSÃO

Brasil e Argentina são duas economias desgastadas pela recessão. Se uma começa a se recuperar, a outra se beneficia. Os argentinos são os principais compradores de produtos industrializados do Brasil. Noventa e quatro por cento das vendas brasileiras à Argentina foram manufaturados: automóveis, máquinas mecânicas, plásticos, máquinas elétricas, ferro e aço.

Do total vendido pelos argentinos ao mercado brasileiro no ano passado, 75% eram de manufaturados e 22% básicos. Os maiores destaques da pauta foram automóveis, cereais, amidos e máquinas mecânicas.

Empresários dos dois países, decidiram romper essa estagnação e pressionam os respectivos governos a apararem as arestas. Os dois principais sócios do Mercosul, argumentam, precisam promover avanços no bloco, para que possam ser seguidos por Paraguai e Uruguai. O Mercosul, com todas as suas dificuldades, está pequeno e precisa ganhar espaço no mundo, dando passos importantes em direção a acordos de livre comércio com parceiros como a União Europeia, o Canadá, o Japão, a Coreia do Sul e até os Estados Unidos.

No ano passado, a Argentina foi o principal parceiro comercial do Brasil. Houve um superávit favorável ao lado brasileiro de US$ 4,3 bilhões. O estoque de investimentos de empresas brasileiras na Argentina era de quase US$ 4 bilhões em 2015, puxados por Petrobras, Gerdau, Natura, entre outras. Já as firmas argentinas investiram no Brasil cerca de US$ 1,6 bilhão. A despeito das dificuldades, o potencial é imenso.