Cotidiano

?Ana, Mon Amour?, de Calin Peter Netzer, fecha a competição do Festival de Berlim

A corrida ao Urso de Ouro do 67° Festival de Berlim terminou nesta sexta-feira (17) em tom de meta-análise existencial, com a exibição de ?Ana, mon amour?. Pelo menos foi assim que o diretor romeno Calin Peter Netzer rotulou seu novo filme, crônica da sofrida relação entre dois estudantes universitários, que acaba contaminada e até mesmo alimentada pelo distúrbio psicológico da companheira.

Adaptação do livro ?Luminita, mon amour?, de Cezar Paul-Badescu, que também assina o roteiro, o filme acompanha a história de amor disfuncional entre Toma (Mircea Postelnicu) e Ana (Diana Cavallioti). Ela sofre de ataques de ansiedade e de pânico, que a impedem de ter uma vida social plena. Ele, no entanto, a acolhe de braços abertos e até briga com a própria família, que a rejeita, para tê-la por perto.

A trama é narrada fora de ordem cronológica, registrando diferentes momentos da vida em comum de Toma e Ana, desde o namoro no dormitório do campus, até os primeiros anos do primeiro filho do casal. O fio condutor do vai e vem no tempo são as sessões de análise de Toma, que tenta entender a razão de querer permanecer ao lado de Ana durante todos esses anos, apesar do fardo que representa.

? Evitei a narrativa tradicional, direta, de um paciente contando a sua história ao psicanalista, porque seria um clichê ? explicou Netzer, de volta a Berlim desde a conquista do Urso de Ouro de 2013 com ?Instinto materno?. ? Dessa forma, conseguimos manter o conteúdo do livro do Cezar e, ao mesmo tempo, o deixamos de lado. É um filme muito clínico, que usa da meta-análise de uma relação baseada na mútua dependência: Ana depende de Toma, e vice-versa.

Links Festival de Berlim 1402Além do psicanalista, Toma recorre aos livros de filosofia e a um padre. ?Ana, mon amour? marca a estreia de Badescu como roteirista.

? Livro e filme compartilham do mesmo cerne. A diferença é que, no livro, a doença mental funciona com um catalisador do problema que, por sua vez, é um comentário social sobre como o mundo entende os distúrbios neurológicos e psíquicos e como ele fornece condições para solucioná-lo. Essas soluções, em geral, passam pela ideia de ter uma vida bem-sucedida, de salvação para a alma, que são ineficientes, quando não ridículas. Calin estava mais preocupado com o lado pessoal do drama, e com o lado social da história.

A programação do dia teve início com ?Have a nice day?, de Jian Liu, primeira animação chinesa a competir em Berlim. A trama revolve-se em torno de uma bolsa contendo um milhão de yuans, roubada de um mafioso conhecido como Uncle Liu (voz de Yang Siming) por um jovem motorista de táxi, Xiao Zhang (Zhu Changlong). Este pretende usar o produto do roubo e fugir para a Coreia do Sul com a namorada, onde ela fará a cirurgia plástica corretiva que precisa.

Ao mesmo tempo em que Uncle Liu despacha um matador de aluguel (Ma Xiaofeng) para recuperar o valor surrupiado, este acaba também disputado por outros espectadores acidentais, como uma mulher cansada de batalhar pela sobrevivência, e um inventor de um óculos com raios-X. A trama se passa em uma pequena cidade do Sul da China, cujas ruas são abarrotadas de anúncios publicitários e símbolos da cultura pop.

?Have a nice day? é o segundo longa-metragem de Jian Liu, pintor formado em Artes pela Universidade de Nanquim, que trabalha com técnicas artesanais de animação.

? Minha primeira formação é a pintura. Só comecei a pensar em trabalhar com cinema em 2007. Então foi natural que eu optasse pela animação. É como se eu estivesse pintando um filme ? contou Jian. ? Uma vez que comecei a fazer desenhos animados, descobri que tinha prazer com o gênero. A animação, para mim, é um meio de expressão. Nem vale a pena comparar com o que é produzido por grandes estúdios, como a DreamWorks. Nem seria válido, porque fazemos coisas diferentes.