Cotidiano

Allen Berger, economista: 'A esquerda perdeu poder de diálogo com os pobres'

“Vim ao Brasil pela primeira vez no início de 2016. Desde então, mesmo após pouco tempo, sei que muita coisa mudou, a turbulência política e econômica do país é muito grande. Apresentei aqui artigos sobre como os lugares com mais bancos de pequeno porte conseguem fomentar boas oportunidades de negócio.”

Conte algo que não sei.

A economia mundial está em perigo pela falta de crédito para bancos pequenos. Mas há soluções, como diminuir a regulação e a política monetária extrema, e ser mais cuidadoso nas aprovações de fusões de bancos.

Qual a relação entre os bancos pequenos e o crescimento da economia?

Os pequenos negócios não estão mais conseguindo tanto financiamento, e isso não é novidade. Os bancos menores eram os responsáveis pelo financiamento destes negócios. Sem isso, perdermos boas oportunidades, e a economia perde força. Eu uso os dados dos EUA, mas é um aspecto global. O perigo é perder a competitividade no cenário econômico, principalmente no mercado de crédito e financiamento.

Por que falta crédito para bancos pequenos?

Depois da crise financeira de 2008, houve uma reação exagerada. A regulação cresceu muito e sufocou os bancos. Agora está mais difícil realizar empréstimos. Somente entre 2010 e 2014, com a nova legislação Dodd-Frank, as regras de regulação de bancos nos EUA aumentaram 32%. Hoje há mais de 400 regras. Mas não são todas ruins. Há, por exemplo, uma muito boa que é a fiscalização do capital próprio dos bancos. A crise ocorreu porque os bancos de investimento e companhias de seguro não dispunham de capital próprio. Assim, quando quebraram, não tinham mais como pegar empréstimos, e isso afetou toda a economia. O governo precisa obrigar os bancos a terem o próprio dinheiro para investir, e não fazer tantas regras sobre como investir.

Com a chegada de Trump isso pode mudar?

Ele disse que vai rever algumas regras, e deve voltar para um cenário com menos regulação. Mas o futuro dos EUA com Trump é imprevisível, e o perigo é o corte de acordos comerciais, o que afeta os EUA e todo o planeta. O PIB dos EUA é responsável por 25% do PIB do mundo. O crescimento do isolacionismo é um perigo.

A globalização, então, está em perigo?

Certamente. Há o temor nos EUA, mas é uma situação geral. Na Europa temos o Brexit, que deve resultar no fim de acordos comerciais entre Reino Unido e União Europeia. Em outros países europeus, como Itália e França, o ultranacionalismo também está crescendo.

Por que você acha que houve esse crescimento da extrema-direita?

Uma causa nos EUA é a incompatibilidade estrutural, ou seja, os profissionais não conseguem se qualificar o suficiente, e assim não aumentam seus salários. Faltou investir na qualificação da mão de obra. Esse nicho se revoltou e foi absorvido pela extrema-direita. A esquerda cometeu falhas e perdeu poder de diálogo com os trabalhadores mais pobres. A globalização é uma coisa boa, mas não é igualitária. As pessoas menos qualificadas não recebem os ganhos da mesma forma.

No Brasil, muitos acreditam na austeridade para a saída da crise econômica. O que você pensa?

Acho que investir na qualificação da sociedade e da mão de obra seria melhor. É um processo a longo prazo, mas vale a pena. Congelar investimentos em educação e saúde é terrível. São capitais humanos muito fortes. Ao investir na formação de uma pessoa, por exemplo, ela não vai para o crime. Ainda há o ganho social.