Cotidiano

Acordo de Paris não vai salvar mundo de catástrofe climática

RIO — Em dezembro do ano passado, líderes de 195 países se reuniram na França e fecharam um acordo sem precedentes para salvar o planeta, mas os esforços prometidos em Paris não serão suficientes para conter o aumento da temperatura abaixo dos 2 graus Celsius em relação aos níveis pré-industriais, como pretendido. De acordo com estudo que será publicado nesta quinta-feira na revista “Nature”, mesmo que todas as promessas sejam cumpridas, o aumento da temperatura média global no fim do século ficará entre 2,9 e 3,9 graus Celsius.

— De fato, o acordo de Paris é positivo pois leva o mundo a um cenário de emissões menores, mas ainda não é possível alcançar a meta de 2 graus Celsius — explica Roberto Schaeffer, professor de Planejamento Energético da Coppe/UFRJ e um dos autores do estudo. — Os resultados mostram que é urgente a apresentação de propostas mais ambiciosas de corte de emissões de gases estufa. Pelas projeções, alcançar 1,5 grau Celsius de aquecimento talvez não seja mais possível, mas a meta de 2 graus Celsius ainda é.

Além da Coppe/UFRJ, pesquisadores de outras 11 instituições internacionais participaram do estudo. Esta é a primeira análise em profundidade das Contribuições Determinadas Nacionalmente Pretendidas (INDCs, na sigla em inglês), submetidas pelos países-membros das Nações Unidas na reunião sobre mudanças climáticas de Paris, com propostas para a redução na emissão de gases estufa. Foram criados quatro cenários para avaliar o impacto dessas propostas: o primeiro sem qualquer política de redução das emissões, outro com as políticas atuais, o terceiro com os cenários propostos pelas INDCs e o último, com o mínimo requerido para manter o aumento da temperatura abaixo dos 2 graus Celsius.

Na análise das INDCs, os pesquisadores se depararam com grau elevado de incertezas, já que muitas apresentavam condições, como o recebimento de financiamento externo para a implementação. De todas as propostas apresentadas em Paris, 45% possuem componentes condicionais e incondicionais; cerca de um terço é apenas condicional e o restante não especifica condições. E essas incertezas somam emissões aproximadas de 6 bilhões de toneladas de gases estufa por ano, o equivalente ao volume total gerado pelos EUA em 2012.

Contabilizando apenas as propostas incondicionais, o aquecimento da temperatura média global no fim do século deve ficar entre 2,9 e 3,9 graus Celsius em relação aos níveis pré-industriais. Caso as propostas condicionadas sejam cumpridas, o aquecimento deve variar entre 2,7 e 3,7 graus Celsius. Ambos os cenários são melhores que o traçado para as políticas atuais, que gerariam aquecimento entre 3,2 e 4,4 graus Celsius, mas ainda distantes da meta considerada segura.

— Nosso estudo mostra claramente que as atuais INDCs são muito graduais e, por isso, inconsistentes com a ambição de longo prazo do acordo de Paris — avalia Keywan Riahi, diretor do Programa de Energia do Instituto Internacional de Análise de Sistemas Aplicados e coautor do estudo. — Se quisermos manter os 2 graus Celsius no limite de alcance, precisaremos de mudanças mais rápidas e fundamentais. A esperança é que o processo de políticas pós-Paris possam nos entregar isso.