Cotidiano

'A única saída é ser ousado. E se unir', diz Lobão sobre show com Sepultura

RIO ? Se alguém achava que Lobão e Sepultura nunca mais dividiriam o mesmo palco depois que o cantor de “Vida bandida” foi vaiado no Rock in Rio de 1991, o próprio João Luiz Woerdenbag Filho faz questão de dizer que todos se dão bem desde aquela época. E agora, 25 anos depois, eles vão tocar juntos em quatro shows ainda neste ano, em Belém (PA), Goiânia (GO), Recife (PE) e Vitória (ES). Lobão + Sepultura

? A gente estava pensando em uma maneira de mexer com o imaginário do rock no Brasil. Estamos vendo que a cena está muito parada. A única saída é ser criativo, ousado. E se unir. O barulho que essa equação Sepultura + Lobão está fazendo é importante, é um rebuliço tanto para o lado da euforia como do ódio. Mas a qualidade do nosso trabalho reponde pela gente ? diz Lobão, por telefone.

E o barulho ao qual o músico se refere não é medido apenas em decibéis, mas também em reações negativas e comentários no Facebook. Embora a recepção por parte dos fãs de Lobão tenha sido bastante positiva, não se pode dizer a mesma coisa pelo lado do Sepultura. No fechamento desta reportagem, eram 1.728 comentários, a maioria criticando a banda pela parceria na série de shows intitulada “A chamada”. A rejeição não é motivada por divergências musicais, e sim, políticas, já que o carioca radicado em São Paulo foi um árduo defensor do impeachment de Dilma Rousseff.

? As pessoas querem me aniquilar porque eu penso isso ou chouriço. Mas eu sou “insimonizável” ? diz ele, em referência a Wilson Simonal, que sumiu da cena musical depois de defender a ditadura militar. ? Uma série de artistas foram evaporados por não concordarem com o status quo, mas as pessoas têm que entender que isso é antidemocrático. Se um povo atinge esse estado, é um sintoma de que estamos vivendo uma situação totalitária. Nao por parte de um governo, mas da cultura.

Os dentes afiados de Lobão também cravam na indústria fonográfica e na cena do rock, “muito parada”, segundo ele. Para o músico, que lançou seu “O rigor e a misericórdia” neste ano, falta uma união maior no segmento (“rock não é torcida de futebol”, argumenta), além de uma imprensa especializada que ajude a impulsionar o estilo. ‘O rigor e a misericórdia’, de Lobão

? Sempre admirei o Sepultura, curto desde sempre. A gente tocar junto tem tudo a ver neste momento histórico brasileiro, em que o rock está meio dizimado, até mesmo por causa da autodestruição do segmento. Há muitoas brigas, a imprensa não ajuda, os festivais são feitos de forma que não ajuda o rock brasileiro. Mas acredito que está nascendo uma nova cena, com coisas muito legais vindo do Rio Grande do Sul, do Nordeste… ? diz ele, que encara a pujância roqueira de um país como um termômetro de sua cultura. ? O rock é tão segmentado, tem mil tipos diferentes, indo desde o rockabilly até o thrash metal. Temos que batalhar para o Brasil deixar de ser monocultura: a cultura saudável é plural. Eu já falava isso nos anos 1980, quando o rock tomava conta da cena. Mas agora estamos sem espaço.

Sobre o que esperar dos shows, ele prefere não adiantar muito. Conta que já se reuniu com o Sepultura, mas o formato ainda não foi definido. O que é certo é que o roteiro será criado especificamente para a ocasião, incluindo sucessos antigos de todos, mas com uma busca por novas sonoridades:

? A gente tem que arriscar de alguma forma, não pode ficar no marasmo. Queremos fazer um show artisticamente poderoso, sem ficar no flashback.

Sobre as vaias que recebeu em 1991, quando entrou no palco do Rock in Rio depois da apresentação do Sepultura (Megadeth, Judas Priest e Guns n’ Roses ainda tocariam na mesma noite), Lobão diz que elas jamais causaram qualquer sentimento de inimizade entre os músicos. E conta que a banda de “Refuse/resist” passou uma semana em sua casa depois que o festival acabou.

? A gente segue o mesmo preceito de sincretismo musical. Adoro “Roots” ? diz, elogiando o álbum de 1996 em que o Sepultura incluiu elementos tribais e trabalhou em parceria com Carlinhos Brown. ? O problema seria ficar inerte perante um mal entendido histórico. Paralisia e acovardamento não combinam com o rock.

Confira as datas e locais dos shows:

“A CHAMADA” – SEPULTURA + LOBÃO

25/11: Belém/PA – Hangar

09/12: Goiânia/GO – Atlanta Music

10/12: Recife/PE – Baile Perfumado

17/12: Vitória/ES – Arena Mega Troops