Cotidiano

A geração que estamos formando

João Pedro, um garoto de dez anos, não sabe o que quer ser da vida. Seu pai, porém, não tem a menor dúvida: o garoto sai ser executivo, e de uma grande multinacional, razão que justifica a matrícula nas aulas de mandarin para o próximo ano, curso que, junto com o inglês e o alemão, fazem com que João Pedro saia de casa quase que de arrasto.
E não vale criticar. Não sabemos se está o pai do João agindo de forma errada. Tem essa coisa de globalização, fronteiras cada vez mais curtas, empregos se extinguindo e necessidade cada vez maior de conhecimentos. Os jovens precisam se preparar e pais de vanguarda estão sentindo isso. Não sei se João recebe afeto de sua família, só sei que tem jeito de menino estressado, filho de pais preocupados e focados em deixar ao garoto um bote salva- vidas, ou seja, a educação, maior herança que um pai pode deixar para um filho, segundo alguns, mas que parece não estar sendo suficiente. Ainda tem tênis, natação e futebol, e anda o menino sempre bem vestido, aliás como todo garoto de sua turma, crianças classe média alta da cidade. “Relações com pessoas importantes”, diz seu pai, “começam na roda de ciranda-cirandinha de nossa infância”. Daí João Pedro estar na escola mais cara da cidade, mensalidade que leva quase todo o salário de sua mãe.
Então vem a corrente oposta que diz ser o o pai do João é um doente, um psicopata que não pensa no bem-estar no filho mas no seu próprio, e com uma boa dose de exibicionismo: “que seja meu filho aquilo que não fui”. Se o pai do João não teve na vida o reconhecimento desejado, pelo menos, ao final dela, será pai de um cara importante. A mesma crítica repousa sobre os ombros da mãe. “Onde está que não fica em casa cuidando de seu único filho?” Resposta simples: trabalhando para garantir o futuro dele. Aí a gente tem que pensar mais um pouco. Essa decisão, a de ficar em casa compartilhando momentos com o filho, nem sabe leva a criança a uma vida melhor. Dependendo da mãe, pode passar horas transmitindo ao filho seus medos, vícios e frustrações. Nesse caso, passar a tarde nas aulas de mandarin até que não seria ruim, melhor que servir de psicólogo para uma mulher com quase meio século de vida.
Se paramos para uma análise mais profunda, o Joãzinho está mesmo largado em um mato. E sem cachorro. Ele não tem para onde ir. Fruto da neurose coletiva dos tempos atuais, ninguém sabe onde o João vai parar, se é que vai parar em algum lugar. Talvez lá adiante a gente morda a língua – bem certo estava o pai do João Pedro – ou lamente a geração à la João Pedro que se criou, pessoas mais fria, mais amedrontadas , sem raízes familiares, voltada para o dinheiro, para suas contas e para sua vida. Parece triste, um cenário nebuloso, mas hoje também não tenho muito tempo para pensar nisso porque lá vou eu pegar meu menino e levar para a aula de inglês.

Vivian Weiand