Cotidiano

A década sem Bussunda

Há uma década e algumas horas, o humorista Cláudio Besserman Vianna, o Bussunda, sentiu, durante uma pelada na cidade de Vaterstetten, na Baviera (onde a galera da Casseta&Planeta cobria a Copa de 2006), os primeiros sintomas de um infarto que, na manhã seguinte, encerraria precocemente sua feliz passagem entre nós, que aqui ficamos, saudosos e órfãos de um espírito de zoação carioca que frutificou mas jamais se igualou.

Em homenagem catártica, na qual as risadas (como ele certamente gostaria), abafaram as lágrimas, uma pelada (acompanhada de bufê de café da manhã em que predominaram doces sortidos) marcou a data, num campinho no Jardim Botânico que era, e ainda é, usado pela turma & amigos periodicamente.

Peça de humor em si, o texto do convite para o evento abria com os nomes de Ronaldinho Fenômeno, Lula, Diego Maradona, Xuxa, Eurico Miranda e Vera Fischer, dando, por um momento, a impressão de que as celebridades citadas (que mereceram imitações antológicas de Bussunda no programa semanal na TV Globo) seriam os anfitriões.

Porém, entre família e amigos de infância e de faculdade, as grandes celebridades presentes foram dois mitos do Flamengo, time pelo qual torcia com paixão fundamentalista: maiores ídolos de Bussunda, Zico e Adílio atraíram as lentes das câmaras de TV, jornais, sites e o pessoal do Pânico, que zoneou o evento o quanto foi possível, atingindo seus objetivos.

Antes da pelada principal, que distribuiu pelas duas equipes os companheiros de trabalho , amigos e notáveis, todos com a camisa do Tabajara Futebol Clube (time oficial do grupo) houve uma pequena cerimônia no centro do campo, aberta pelo também casseta Hélio de la Peña e na qual a filha de Bussunda com a jornalista Angélica Nascimento, viúva do humorista, ganhou uma camisa do Flamengo com o nome do pai. Emocionado, Zico encerrou a preleção evocando o craque do humor que, decerto, “estava ali, iluminando aquela manhã ensolarada”.

Feliz com o carinho que cercava a família e elevava a memória de Bussunda, Angélica, alvinegra convicta, tirou foto com a filha, Adílio, e Zico, e fez piada numa postagem no Facebook, referindo-se aos craques como “um pessoal do Flamengo”.

Enfim livre do assédio de microfones e lentes, Zico, aparição frequente nos programnas do Casseta&Planeta Urgente, fez, para este repórter, uma análise do futebol de Bussunda, que, entre os companheiros de trabalho, e desde os tempos de Chopelada na UFRJ, era conhecido por ter um toque refinado, contrastando com a proverbial “barriga que desafiava a força da gravidade”:

— Eu dei aula de futebol para esse pessoal, mas eles não aprenderam nada. Com exceção do Bussunda, que aprendeu um pouquinho. Ele fazia gol. Um número nove tem que fazer, é só dar a bola que ele faz. Tinha categoria, um toque de qualidade, não se afobava, dominava bem a bola. Hoje tem cada vez mais gente que a bola queima. Com ele não queinava, não.

Dos mais emocionados, o economista Sérgio Besserman Vianna, trouxe memórias da rebeldia do igualmente ilustre irmão:

— Para afirmar sua diferença e se rebelar , o Bussunda reagia aos meus conselhos sobre bons investimentos indo ao mercado comprar quilos de sardinhas e outros bens primários para estocar. Ele dizia que eram “ativos de subsistência”.

A pelada principal enfim começou, e uma infinidade de gols desfilou pelo gramado, entre lances de categoria e cenas de pastelão. Dizendo-se em forma, o jornalista Sidney Garambone aplicou um chapéu triplo que, disseram alguns, era na verdade uma matada no peito “ressignificada” para além da intenção.

Mas nenhuma firula superou aquele que foi o ponto alto do clássico, quando o pesado Charles Henriquipédia, um dos âncoras de campo do Pânico, vestido de sósia gordo de Helio de la Peña, roubou o espetáculo. Aos 20 minutos de jogo ainda não havia tocado na bola, quando, em fortuita movimentação, fez um improvável gol e, caído no gramado, foi coberto por uma montanha de companheiros, a ponto de quase sufocar. Recuperado após longo esforço, foi em busca da peruca perdida.

Em volta do gramado, uma grande gargalhada ressoou. Era como se Bussunda comandasse o show.