O caminho de Juan Nogueira até a disputa de sua primeira Olimpíada esteve longe de seguir a trajetória normal de um atleta. Há oito anos, o pugilista de 28 anos abandonou as luvas porque “não tinha incentivo” e passou a se concentrar em lutar em outros “ringues”. Foi monitor e ator de festa infantil e bartender na noite paulista. Tudo sem largar totalmente o boxe, pois também dava aulas do esporte que foi forçado a deixar de lado por três anos.
Há quatro anos, porém, tudo mudou. Levado pelo técnico Antonio Tony de volta ao esporte que iniciou quando tinha 14 anos, treinou com afinco, voltou para a equipe brasileira de boxe e depois de duas participações em Mundiais e da disputa do Pan-Americano de Toronto, no ano passado, se classificou para as Olimpíadas na categoria pesado (até 91kg) após sua boa participação no Pré-Olímpico das Américas, em Buenos Aires, em março.
Falar do passado não é um problema para o Juan, que costuma demonstrar bom humor. Ele tampouco parece guardar qualquer amargura a respeito do período em que esteve longe do boxe. Divertia-se nos trabalhos freelancers que fazia com crianças, quando aparecia fantasiado de Batman, Homem-Aranha e outros personagens de quadrinhos ou de contos de fadas, ou preparando drinks na noite. Em um período da vida Juan chegou a conciliar quatro empregos.
– Eu era tipo o Julius do ?Todo mundo odeia o Chris? ? compara Juan, citando o personagem da série de TV americana que durou de 2005 a 2009 e se caracterizava por ter dois empregos e ainda fazer hora extra para dar uma qualidade de vida melhor para a família.
– Comecei como monitor de festa infantil, cuidando dos brinquedos e das crianças. Dali, fui para a noite trabalhar como bartender, cuspindo fogo pela garrafa e tudo. Aí uma vez surgiu uma oportunidade numa empresa de personagens em que eles faziam caracterização. E nós éramos como se fôssemos atores e atrizes trabalhando, porque tinha texto, coreografia. Devagarinho fui pegando o jeito e me caracterizei de Batman, Homem-Aranha, Capitão Gancho. Fiz muita coisa ? conta o pugilista. ? Eu tinha quatro empregos, literalmente.
MAQUIAGEM PARA DISFARÇAR OLHO ROXO
Por um perído, antes de abandonar o esporte, Juan conciliou todos estes empregos. O único problema quando ele começou a trabalhar como ator nas festas era quando os treinos de boxe lhe davam um ou outro olho roxo.
– Aí a maquiagem dava aquele jeitinho. Eu fazia a maquiagem em mim mesmo. Já apareci arrebentado em festa, mas eles sabiam que eu lutava boxe e dava aula de boxe também ? conta.
Se nas peças, ele vivia heróis adorados pelas crianças, na noite, sua especialidade eram as caipirinhas.
– Eu fazia muito coquetel e caipirinhas. Fazia eventos fechados, de debutantes e também trabalhava em alguns lugares fixos, como na Rua Augusta, na Zona Norte (de São Paulo). Mas minha especialidade era evento mesmo. A pessoa me contratava e eu ia fazer o evento ? conta.
O desgaste tornava a vida no boxe quase insustentável. Por mais que tivesse disposição, ainda bem jovem acabou optando pela vida que lhe dava algum dinheiro para ajudar a mãe, com quem mora em São Paulo.
Quando desistiu do boxe, Juan tinha de 19 para 20 anos. Na ocasião, cada trabalho nas festas infantis ou na noite, lhe rendia uma média de R$ 100, enquanto o esporte não lhe dava retorno. Apesar de um início de carreira promissor com um título infantil com 14 anos e a conquista de um campeonato adulto em São Paulo quando tinha 15 anos, derrotando um rival com o dobro de sua idade.
DESAFIANDO OS MÉDICOS
Voltar a lutar foi como dar uma segunda chance a sua grande paixão. Mas só largou os eventos quando foi convocado pela Confederação Brasileira de Boxe (CBBoxe) para integrar a equipe brasileira. A partir daí teve um salário fixo. E as coisas só melhoraram quando ele virou terceiro sargento da Marinha, passando também a receber um soldo.
– Conversei com médicos que me disseram que era difícil de acontecer de um cara ficar três anos parado e voltar ao alto rendimento. Eu consegui e agora estou há quatro anos na seleção.
Na Olimpíada do Rio, Juan aponta os rivais de Cuba, Rússia e Azerbaijão como os adversários a serem batidos no caminho da medalha. No Mundial de 2013, em Almaty, no Cazaquistão, o lutador perdeu para o russo Evgeny Tishchenko na terceira rodada. Tishchenko acabaria sendo o vice-campeão mundial ao perder para o italiano Clemente Russo.
Dois anos depois, no Mundial de Doha, no Qatar, Tishchenko foi o campeão derrotando o cubano Erislandy Savón, sobrinho do lendário tricampeão olímpico Felix Savón. Juan foi eliminado nas oitavas de final pelo cazaque Vasiliy Levit.
Savón, Tishchenko e Vasiliy estarão no Rio. Assim como Abdulkadir Abdullayev, do Azerbaijão, atual campeão europeu e medalha de bronze no mundial do ano passado.
– Cuba, Rússia e Azerbaijão. Os três são os mais fortes da categoria. Estes que serão as pedras no sapato ? analisa Juan, mostrando confiança no seu boxe.
– Já fiz boas lutas com eles. Em 2013, lutei contra o russo campeão mundial, mas perdi para ele. Mas minhas expectativas são as melhores, são de brigar por medalha.