Acordar antes do sol raiar, pedalar dezenas de quilômetros por dia, cuidar da
alimentação ? às vezes com nutrólogos ? e ser agraciado apenas com medalhas por
participação. Assim é a vida do ciclista amador, que investe tempo e muito
dinheiro no esporte apenas por amor. E o mercado brasileiro acompanha a paixão
desses atletas com inúmeros eventos voltados exclusivamente para eles. Este ano,
o país vai receber a primeira edição da franquia do Gran Fondo Nova York, em
agosto, em Conservatória, distrito de Valença, no Rio.
Para os ciclistas, o objetivo principal é completar um dos dois percursos de
estrada, divididos por categorias: de 80km e de 160km. Porém, o evento não é
dedicado apenas ao dia da corrida, nem somente aos atletas amadores. No fim de
semana da prova, há uma feira de exposição de produtos ligados ao esporte, food
truck, food bike e atrações musicais.
? O Gran Fondo está na mesma linha do L?Étape ? evento com chancela da Volta
da França, que acontece em São Paulo desde o ano passado. Esses eventos vieram
preencher uma lacuna de quem ama pedalar, que investe e adora treinar para isso.
Não são profissionais, mas levam o esporte muito a sério ? analisa João
Magalhães, coordenador de comunicação da Shimano Latin America, ressaltando que
é um caminho sem volta. ? Não é apenas moda, tem a ver com a nova geração, a
procura de mais qualidade de vida, de estilo de vida mais sustentável. As
cidades estão sendo redescobertas pelas pessoas e o público mais jovem prefere
bike a carro, que não tem mais o glamour de 20 anos atrás. Na última década, vem
acontecendo o fortalecimento da cultura da bike.
Ainda não há dados oficiais sobre o número de atletas amadores e a receita
total gerada pelo ciclismo. Mas é fato o crescimento da venda de bicicletas e
acessórios nas grandes cidades, como Rio e São Paulo.
? Há uma evolução crescente a partir de 2011. Nos últimos dois anos, houve
uma ligeira queda na quantidade total. Porém, se caiu o número de bikes
compradas/produzidas, aumentou o valor agregado. Antes, a maioria procurava
bikes de R$ 400 a R$ 500. Atualmente, a faixa de preços é de R$ 1.500 a R$
2.000. São bicicletas melhores, que duram mais, para uso constante, não
necessariamente para competições ? explica João Magalhães.
Criado há sete anos, o Gran Fondo já tem franquias em mais de dez países,
como Colômbia, Uruguai, Itália, França, além da edição fundadora em Nova York. A
vinda para o Brasil vem sendo negociada há dois anos. A cidade do Rio foi a
primeira tentativa. Porém, por causa da falta de data, em 2015, e o período
olímpico e de eventos teste, ano passado, não houve acordo. Para este ano, as
candidatas foram cidades da Região Serrana, dos Lagos e Conservatória. Por fim,
a cidade da seresta, foi escolhida pela localização e paisagem.
O distrito de Valença comemora a escolha. Acostumada a receber mais de 10 mil
pessoas no período do carnaval tradicional e do carnaval antigo, em outubro,
Conservatória se prepara para abrigar um público bem diferente. A previsão é de
1.500 inscritos. No total, mais de 4 mil pessoas (entre organização,
participantes e visitantes) devem se hospedar na cidade nos três dias de
evento.
Com apenas dois mil leitos, a Associação Comercial, Rural, Industrial e
Turistica de Conservatória (Acritur) está mobilizando os moradores para alugar
quartos nas casas e nas fazendas.
? Esperamos ocupação quase total. Não temos o levantamento da receita que vai
gerar, mas vai movimentar tanto a parte hoteleira quanto a de serviços de bares
e restaurantes, além dos impostos. E é um público que vai permanecer os três
dias aqui e vai ter divulgação internacional ? disse o presidente da Acritur,
Mauro Contrucci.
Quem participa dos eventos sabe que o investimento do esporte é alto. Desde a
inscrição nas provas ? o Gran Fondo custa R$ 770, no momento ? a manutenção do
equipamento. Só para começar, o atleta amador precisa desembolsar, em média, R$
6 mil (bicicleta e equipamentos). Porém, pode chegar a mais de R$ 50 mil.
O valor não importa para quem descobre o ciclismo de alta performance. A
rotina e os custos são semelhantes aos de um atleta profissional. Gastos com
nutrólogos, preparação física à parte, trabalho mental para as provas, treinos
diários… Tudo isso somado a filhos, carreira e cuidados com a casa. Além da
vida social.
As mulheres do grupo feminino L?Eroika, que vai participar com 30 integrantes
no Gran Fondo, não se importam com a jornada tripla. Às seis da manhã, elas batem ponto
na Barra da Tijuca para fazer o percurso até Guaratiba. Ou sobem o Alto da Boa
Vista.
A recompensa está nas provas
concluídas e nas amizades descobertas. Parte do grupo, por exemplo, vai passar
16 dias pedalando pela Europa.
? Em maio, vamos para Itália,
França, Bélgica e Amsterdã. Vamos dar dicas de viagem com bicicleta ? conta a
criada do grupo, Erika Cury, ex-nadadora e triatleta profissional.
Aos 49 anos, a arquiteta
Elisabeth Santucci mudou o estilo de vida há quatro anos. Depois de duas décadas
sem fazer exercícios regulares ? fora cuidar dos três filhos ?, descobriu o
ciclismo de recreação. Logo, quis fazer parte dos pelotões pela cidade:
? Me encantei por conhecer mil
lugares do Rio. Me encontrei no ciclismo por causa do foco e da motivação.
Participo das provas para ter um objetivo para treinar ? afirma a ciclista, que
completou os 160km do Gran Fondo de Nova Yokr do ano passado.